Geraldo Alckmin: “Moralismo, ineficiência e atraso”

Geraldo Alckmin é um candidato conservador nos dois principais significados que o termo permite: no de preservar o status quo dos setores dominantes da sociedade brasileira e no de capitanear uma reação conservadora nas poucas áreas nas quais o Brasi

por LEONARDO AVRITZER*


 


Geraldo Alckmin é um candidato conservador nos dois principais significados que o termo permite: no de preservar o status quo dos setores dominantes da sociedade brasileira e no de capitanear uma reação conservadora nas poucas áreas nas quais o Brasil mudou nos últimos anos: nos campos do pluralismo moral e religioso, das políticas heterodoxas na economia e das políticas de direitos humanos. Permitam-me elaborar de que maneira Alckmin é conservador em cada um deles.


 



Nos governos FHC e Lula, o Brasil avançou significativamente na separação entre religião e Estado e na aceitação do pluralismo religioso. Essa é uma dimensão central do republicanismo e de um importante processo de pluralização moral da sociedade brasileira. Alckmin parece ser, nesse quesito, o mais conservador dos candidatos à Presidência desde a redemocratização. Suas relações com o Opus Dei incluem, segundo a revista “Época”, ter um confessor ligado à ordem e realizar reuniões periódicas com membros da ordem no Palácio dos Bandeirantes. Essas relações revelam uma mistura perigosa entre religião e Estado e entre público e privado.
Além disso, o Opus Dei é conhecido internacionalmente por ligações escusas e secretas com o poder político. Alckmin rejeitou falar sobre suas relações com o Opus Dei na campanha. O Brasil pode se surpreender com essas relações caso escolha Alckmin.


 



No que diz respeito à questão econômica, um consenso tem se formado no Brasil nos últimos anos acerca dos limites das políticas neoliberais. Os quatro anos do segundo mandato FHC foram os anos de menor crescimento econômico na história recente do país. O crescimento nos últimos quatro anos foi um pouco melhor, mas aquém do que o país necessita.


 



Nesse momento, o consenso maior dentro do governo Lula é por uma política mais agressiva de crescimento econômico. Alckmin tende a reverter o debate econômico na direção da retomada das privatizações. Segundo a revista “Exame”, Alckmin estaria muito próximo de economistas liberais ortodoxos como Malan, Armínio Fraga e José Pastore. Suas prioridades para a economia seriam o corte de gastos públicos, uma nova reforma previdenciária e a retomada das privatizações.


 



No caso mais conhecido de privatização hoje em São Paulo, o da linha 4 do Metrô, o Estado investirá 70% dos recursos, e a receita tarifária ficará integralmente com o parceiro privado por 30 anos. Esse é o padrão de privatização que podemos esperar em uma era Alckmin. Ele certamente significará índices muito baixos ou nulos de crescimento econômico motivados pelo fundamentalismo neoliberal.


 



O último ponto é a política de segurança e de direitos humanos. Alckmin tem uma política de segurança que, ao mesmo tempo, desrespeita os direitos humanos e é ineficiente. A sua apologia da violência policial e sua política carcerária parecem ter sido capazes de conjugar o pior dos dois mundos. O resultado todos conhecem: o aumento da população carcerária do Estado somente ampliou a vulnerabilidade do cidadão comum e sua insegurança física.


 



Nesse caso, o conservadorismo tem duas facetas: a incapacidade de pensar uma política de segurança moderna, aliada ao desrespeito secular das elites pelos direitos da população mais pobre. O resultado, mais uma vez, é uma política conservadora tanto nas suas concepções morais quanto no seu resultado administrativo.
Responder se Alckmin é um candidato conservador não significa necessariamente fazer um juízo de valor acerca do conservadorismo. Afinal, existem momentos nos quais conservar elementos da ordem política pode ser considerado uma atitude positiva.


 



Mas não é esse o caso da candidatura Alckmin. Ela é conservadora em dois sentidos muito específicos: no de querer retornar a um status quo que não permitirá o crescimento econômico nos próximos anos e no de querer insistir em valores morais próprios de uma sociedade oligárquica que contrariam uma agenda de ampliação de direitos no país.


 


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*LEONARDO AVRITZER, 47, mestre em ciência política e doutor em sociologia, é professor do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). 


Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S. Paulo, seção Tendências e debates (07/10/06)