Iraque vê proclamação de “Estado Islâmico” e carta de Saddam

Os iraquianos foram surpreendidos neste domingo (15/10) com duas notícias quase simultâneas. O ex-líder Saddam Hussein divulgou uma carta, em que afirma aos iraquianos que “a vitória (sobre a ocupação americana) está próxima”. Minutos depois, uma

Divulgado pela rede de televisão Al Jazeera, o anúncio foi uma resposta à adoção da lei que cria um Estado Federal no Parlamento do país. A coalizão sunita é liderada pelo braço local da rede Al Qaida. No vídeo, de oito minutos de duração, um representante do grupo diz que “o Hilf al Motaiyabin (Aliança dos Embalsamados) anuncia a criação e o estabelecimento do Estado islâmico do Iraque”.


 


Ele também convida os sunitas do país a “prestar juramento ao emir dos crentes, o xeque honorável Abu Omar Al Baghdadi”. Desconhecido até agora, o xeque seria o guia do novo Estado que, segundo o representante da guerrilha, foi proclamado “em Bagdá, Al Anbar, Diyala, Kirkuk, Salaheddin, Ninive e em partes das províncias de Babilônia e Wasset”.


 


Saddam de volta
A comunidade minoritária sunita forma a espinha dorsal da insurgência. É sobretudo e ela que a carta aberta de Saddam faz uma conclamação. O ex-presidente exorta os insurgentes a demonstrar generosidade com seus oponentes, dizendo que ele próprio perdoa os iraquianos que ajudaram os assassinos de seus dois filhos. Em 2003, informantes do país ajudaram tropas dos Estados Unidos a localizar e matar, Uday e Qusay Hussein, numa troca de tiros numa casa em Mosul.


 


A mensagem de Saddam foi ditada a seu advogado principal, Khalid Dulaimi, durante um encontro de quatro horas que os dois tiveram, neste sábado, na prisão onde Saddam está detido. O ex-líder do país disse que os iraquianos devem deixar suas diferenças de lado e fixar uma única meta: expulsar as tropas norte-americanas do Iraque.


 


“A vitória está próxima, mas não esqueçam que sua meta de curto prazo se limita a libertar seu país das forças de ocupação”, disse Saddam na carta, a cujo conteúdo a agência Reuters teve acesso no domingo. “Conclamo a todos a aplicar a justiça na jihad (guerra santa), não se deixarem atrair pela ação insensata, e exercer o perdão, em lugar da dureza com aqueles que se perderam do caminho”, acrescentou.


 


Razões da carta
O ex-líder disse que recorreu a uma carta aberta para poder transmitir sua mensagem sem que ela fosse censurada. Foi a primeira vez em que ele usou esse expediente desde que seu julgamento teve início, em outubro de 2005, por acusações de crimes contra a humanidade.


 


Mas Saddam avisou seus partidários de que a força excessiva contra adversários que não apóiam a insurgência apenas fará a resistência anti-EUA perder o amplo apoio popular de que goza. “Não deve haver acertos de contas… e vocês não devem atacar simplesmente por atacar, quando a oportunidade aparece no momento em que estão portando uma arma.”


 


Os ex-oficiais de Saddam recorreram às armas depois de o exército ter sido desmantelado, fazendo da insurgência uma força devastadora que não se rompeu diante das ofensivas militares. Saddam utilizou linguagem emotiva para expressar sua dor diante do aumento na violência sectária entre xiitas e sunitas que assola o Iraque desde o ataque a um santuário xiita em fevereiro. “Não consigo utilizar a terminologia usada pelos estrangeiros para semear divisões entre nós… Nunca houve uma razão real para divisões no passado”, disse.


 


Um país dividido
Os impasses entre a ocupação e a resistência se acirraram na quarta-feira passada, quando o Parlamento iraquiano aprovou uma lei que cria o Estado federal. A medida foi saudada pelos xiitas e criticada pelos sunitas, que temem ser isolados. Tudo porque suas regiões – localizadas principalmente no oeste do país – são essencialmente desérticas e não têm petróleo, ao contrário das regiões xiitas e curdas.


 


A criação da Aliança dos Embalsamados – em referência ao perfume utilizado para embalsamar os mártires do Islã – une 11 grupos da guerrilha iraquiana lideradas pela Al Qaida no país. Dulaimi disse que a carta foi escrita dias antes de o tribunal onde Saddam está sendo julgado pela morte de 148 xiitas da cidade de Dujail, nos anos 1980, fazer nova audiência, na segunda-feira, para rever os depoimentos das testemunhas.


 


Milhares de iraquianos já foram mortos em crimes de vingança – e mais de 300 mil já abandonaram suas casas. Ecoando os temores de muitos iraquianos sunitas de que o país possa rachar, Saddam conclamou os iraquianos a preservar a unidade nacional. “Vocês estão sacrificando suas vidas por esses princípios grandiosos, e à frente disso está o grande Iraque unido.”