Veja com raiva: a bomba deu chabu

A revista Veja, convertida em panfleto da candidatura Geraldo Alckmin, estampa sua frustração na edição que chegou às bancas neste fim de semana. A internet fervia de boatos sobre as bombas com que ela detonaria a candidatura Lula. Deu chabu. A m

A edição (nº1979, data de acapa 25/10) exige que o leitor faça uma triangulação de matérias não relacionadas para decifrar o seu sentido: a reportagem de capa, O ''Ronaldinho'' de Lula, e outras duas, O fracasso da operação abafa e Alckmin perde o voto de quem o levou ao segundo turno. Articuladas, elas explicam a frustração da porta-voz do neoliberalismo.



Promessas que não se cumprem



''Os dons fenomenais de Fábio Luís, o Lulinha, só apareceram depois que o pai chegou ao Planalto'', insinua Veja. Nas páginas internas, promete ''revelar'' que Fábio Luís atuou como lobista junto ao governo do pai.



As revelações porém são precárias. Uma é a associação da Gamecorp, empresa do filho de Lulka, com a Telemar, já ''revelada'' em dezenas de edições anteriores. Afora ela, a leitura da matéria de Alexandre Oltramari ostenta duas ''ações de lobby'':



1) Encontros com Daniel Goldberg, titular da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (SDE). Em um desses encontros, ocorrido no início de 2005, Lulinha e Kalil, já então sócios da Telemar, sobre uma hipotética compra da  Brasil Telecom pela Telemar, fusão que a lei proíbe, como teria esclarecido Goldberg;



2) Uma exibição do documentário Pelé Eterno para Lula no Palácio do Alvorada, em 2004, a pedido da produtoira do filme, Arlette Siaretta.



''As circunstâncias sugerem''…



Realmente, se Fábio Luís é lobista, não é nenhum Ronaldinho, a julgar por Veja, já que não produziu um só centavo para os interesses que supostamente representou. Toda a matéria é um exercício para driblar essa inconsistência básica, com frases do tipo ''as circunstâncias sugerem que o objetivo mais óbvio [da associação Telemar-Gamecorp] seria comprar o acesso que o filho do presidente tem a altas figuras da República''.



A outra ''revelação'' de Veja é ''que o filho do presidente associou-se ao lobista Alexandre Paes dos Santos, um personagem explosivo, que responde a três inquéritos da Polícia Federal, por suspeitas de corrupção, contrabando e tráfico de influência''. A ''associação'' é outro chabu. Resume-se ao empréstimo de uma sala do escritório de Paes dos Santos para Fábio Luís e seu sócio na Gamecorp, Kalil Bittar, outra vez sem ninguém levar vantagem sobre ninguém.



Não menos desapontadora é a — segundo a revista — ''vasta ficha criminal'' de Paes dos Santos. Limita-se aos três inquéritos citados acima, que ainda nem foram a julgamento, e versam sobre ''estripulias nas sombras de Brasília'' cometidas no governo Fernando Henrique Cardoso. A ''ficha criminal'' da própria Veja por certo é muitas vezes mais ''vasta''.



Desabafo contra o eleitor brasileiro



Já a matéria Salto na reta final – Alckmin perde o voto de quem o levou ao segundo turno, de Otávio Cabral, retrata o quadro mostrado pelas pesquisas do Datafolha, Vox Populi e Ibope nesta semana. E passa uma descompostura no candidato da direita, Geraldo Alckmin.



É um retrato sem retoques. Afinal, desde o Iago de Shakespeare, os bons mentirosos sabem que é importante não mentir sempre…



''A eleição do próximo domingo, ao contrário do que se imaginava, já tem um favorito absoluto. O presidente Lula aparece em todos os levantamentos muito à frente de seu adversário, com uma vantagem que oscila em torno dos 20 pontos porcentuais. Em votos, isso significa que Lula conseguiu reunir um contingente de 24 milhões de eleitores a mais que Alckmin. Em menos de duas semanas de campanha, entre os dias 6 e 17 de outubro, Lula ganhou 9 milhões de votos, o que significa uma captura de quase 1 milhão de votos por dia'', reconhece a revista.



Pior ainda: Lula está crescendo nas camadas médias, tudo que Veja lutou para não ocorrer, recorrendo inclusive ao preconceito de classe e de raça. ''Hoje, de acordo com os levantamentos, Lula só perde para Geraldo Alckmin na Região Sul e entre os eleitores com renda maior que dez salários mínimos. Ainda assim, Lula, comparando-se os resultados do primeiro turno, vem crescendo nesses nichos tucanos'', lamenta a revista.



Por que a recuperação? Para Veja, devido à ''aparente anestesia dos eleitores diante da questão ética''. O eleitor, sentencia o artigo, ''aparentemente está sublimando a ética em nome de questões mais ligadas ao seu dia-a-dia, como emprego e estabilidade econômica''. E a revista convoca seus especialistas para corroborar a tese. ''O eleitor médio não se importa tanto com corrupção. Prefere decidir com o bolso'', fulmina o cientista político Murillo de Aragão, da consultoria Arko Advice, que por certo, não sendo um eleitor médio, não se confunde com o zé-povinho pró-Lula.



Sobrou até para Alckmin



Mas a matéria tem outro alvo além do eleitor: …Geraldo Alckmin (!?!). O órgão dos Civita sente-se traído por seu candidato. Diz que ele ''não soube responder'' à ''tática terrorista [o termo é empregado três vezes no texto] da campanha petista que espalhou algumas invencionices sobre uma eventual vitória tucana, sobretudo em relação à privatização''. Até ridiculariza o tucano: acusa-o de ''se fantasiar de estatais'' (alusão à cena, de fato não muito séria, em que Alckmin posou para a imprensa com boné do Banco do Brasil e blusão estampado com as logomarcas do BB, Petrobras e Correio).



A revista ainda reclama que ''Alckmin parecia acuado'' no debate do SBT. E que '' também pecou pela falta de convicção demonstrada ao não defender as privatizações no governo de Fernando Henrique Cardoso''.



Transparece no artigo um sentimento que está presente também em outras redações da mídia grande: Veja & Cia, do alto do notável papel que acreditam ter tido na desconstrução do governo Lula, culpam a ala política do bloco conservador-midiático, e o candidato em particular, pelo fracasso, até agora, em convencer o eleitorado.



Jornalismo à Carlos Lacerda



Mas Veja não entrega os pontos. Na terceira matéria da tríade, sobre o Caso Dossiê, Marcio Aith defende a tese de que ''Tentar desvincular a compra do dossiê das ações do comitê de reeleição de Lula é o ponto fulcral da estratégia jurídica do governo''. Explica: ''As razões são óbvias. Pela lei eleitoral, se reeleito, Lula pode perder o mandato caso um fato dessa gravidade seja vinculado a sua campanha''. E ameaça: ''Vai ser uma maratona jurídica e política afastar o dossiêgate de Lula''.



Eis a plataforma do órgão dos Civita. Tentará derrubar Lula nas urnas até as 16h49 do 29 de outubro. Se não conseguir, continuará tentando. É a repetição de Carlos Lacerda com Getúlio Vargas, em 1950: ''Getúlio não pode ser candidato. Se for candidato, não pode ganhar. Se ganhar, não pode tomar posse. Se tomar posse, não pode governar. Se governar, tem de ser deposto''.