Messias Pontes: Cláusula de barreira é uma aberração

Uma verdadeira excrescência, uma aberração inominável essa tal cláusula de barreira imposta aos partidos políticos pela Lei 9096/95, com vigência a partir da próxima legislatura.

Além de antidemocrática, ela é inconstitucional porque fere de morte o princípio da isonomia consagrado pela Carta de 1988. De acordo com o artigo 13 dessa malfadada Lei, o partido que não alcançar cinco por cento dos votos válidos para a Câmara Federal em pelo menos um terço dos estados, com um mínimo de dois por cento do total de cada um deles, não terá direito à representação parlamentar, à participação nas comissões técnicas, ao fundo partidário e ao tempo de rádio e televisão.



A alegativa dos defensores da cláusula de barreira (ou de desempenho) é que ela acaba com os “partidos de aluguel”, responsáveis por distorções no processo eleitoral e pelos escândalos que periodicamente se verificam nas casas legislativas. Nada mais falso e hipócrita, pois se condena o partido “que se vende ou se deixa alugar”, mas não se condena quem “o compra ou o aluga”. Na realidade, o que querem os defensores dessa anomalia jurídica (as viúvas da ditadura militar) é extinguir os partidos ideológicos e deixar apenas que uns poucos tenham legitimidade, especialmente os de direita, desrespeitando o direito das minorias assegurado pela Constituição.



O que todo democrata deseja e espera é que o Supremo Tribunal Federal acate as duas Adins (ações diretas de inconstitucionalidade) impetradas por vários partidos políticos. Caso contrário, terá se criado no Brasil a figura do partido e do eleitor de segunda categoria. Ninguém de boa fé pode aceitar a inconstitucionalidade da Lei pela quebra da isonomia entre os parlamentares e muito menos a violação da soberania popular.



Para se ter uma pequena idéia da aberração que é a cláusula de barreira, tomemos como exemplo as eleições no estado do Ceará. Entre os 22 deputados federais eleitos, Chico Lopes, do PCdoB,  foi o quinto mais votado, sendo o primeiro da esquerda. Ele foi sufragado por 162.282 eleitores, portanto na frente de 17 que irão ocupar cadeira na Câmara Federal. Mas de acordo com a Lei 9096/95 Chico Lopes será deputado de segunda categoria – logo ele que tem uma linda história política e de vida, honrando três mandatos de vereador por Fortaleza e dois de deputado estadual –, e seus eleitores serão também de segunda categoria. Pode haver coisa mais esdrúxula, mais antidemocrática? E o Inácio Arruda, também do PCdoB, que foi eleito senador com quase dois milhões de votos?



Outra hipocrisia é a defesa de fusão ou incorporação de partidos que não conseguiram ultrapassar a cláusula de barreira.Sete dos 14 partidos que ficaram abaixo dos cinco por cento dos votos se fundiram em três, sem nenhuma identidade programática e muito menos ideológica. Que democracia é essa? PCdoB, PSOL, PRB e PV querem e têm o direito de manter as suas identidades.



Senhores ministros do STF, sou um cidadão brasileiro no gozo de todos os direitos assegurados pela Constituição, que paga seus impostos rigorosamente em dia e que tem sua vida pessoal e profissional (jornalista) pautada pela ética. Portanto não aceito, por hipótese alguma, ser considerado cidadão e eleitor de segunda categoria. Como eu, são milhões de brasileiros que merecem respeito e exigem que os seus candidatos eleitos exerçam seus mandatos em igualdade de condições, e que os partidos pelos quais foram eleitos igualmente possam ter um funcionamento igual aos demais, dentro do princípio da isonomia.