Chávez bate duro em plano de mídia que viola a lei
Por Blanche Petrich, para o La Jornada*
Na véspera do domingo em que o presidente Hugo Chávez concorre à reeleição, o rumoir de que uma das TVs privadas próximas da oposição levaria ao ar uma pesquisa, o que viola a lei eleitoral, provocaram uma forte
Publicado 03/12/2006 13:04
Chávez se apresentou na noite de sábado (2) em uma entrevista de três horas, para quatro das principais redes de TV do país, duas estatais (Telesur e Venezolana de Televisión) e duas privadas (a poderosa Venevisión e a VenTV), além de La Jornada, do México. A coletiva foi em seu gabinete no Palácio Miraflores.
De surpresa, sobem os decibéis
Atrás das câmaras, dois altos executivos escutam a advertência do presidente e movem a cabeça, como quem toma nota. São eles Carlos Bardasano, presidente execfutivo da Venecisión, a arqui-rival de Chávez durante o golpe de Estado de 2002, e Jorge Camero, da VenTV.
O novo choque entre as concessionárias de TV e o presidente não parece merecer uma tal ameaça. Horas, antes, os executivos da Globovisión, que tinham anunciado a divulgação de pesquisa feita por uma organização próxima de Manuel Rosales, do partido Copei, haviam desistido.
A entrevista fala do socialismo venezuelano, que Chávez vislumbra com sua vertente indo-americana, dos pontos fracos de seu governo, de sua diplomacia sui generis, de suas saudades de um jogo de beisebol e dos seus anos na prisão.
Um eventual conflito pós-eleitoral não parece entrar na agenda. Por isso Chávez surpreende quando, tendo em seu gabinete os microfones que mais o criticam, durante um colóquio longo e distendido, faz subir os decibéis.
“Há leis que é preciso respeitar”
Um dos personagens da telinha venezuelana, Eduardo Rodríguez, modera a entrevista. À sua direita senta-se Carlos Croes, uma instituição do jornalismo nacional, conhecedor e crítico do processo bolivariano, diretor do jornal Quinto Dia. Participa também Jorge Arreaza, da oficial VTV. Atrás das câmaras está o diretor da Telesur, Andrés Izarra.
“Vou estar muito atento às televisoras nestes dias. Se sairem outra vez da legalidade, se tomarem o caminho do golpismo, serão fechadas.”
Podem ser fechadas sumariamente?, pergunta Croes. Que tipo de democracia é esse?
Há leis que é preciso respeitar. Por exemplo, se a Televen, neste domingo, começar a lançar exit polls (pesquisas de fim de campanha) à meia-noite, tenha certeza de que a fecho, cumprindo ordem jurídica. Aquele Hugo Chávez permissivo de 2002 já não existe.
“Arrepende-se de alguma coisa?”
“Arrepende-se de alguma coisa?”
“Arrependo-me, naquele 2 de abril (de 2002), quando do golpe: de não as ter fechado. Fui ingênuo. Convoquei uma cadeia nacional. E as TVs já tinham tudo tecnicamernte preparado. Trouxeram sua marcha até Miraflores, e lá já estavam esperando os seus franco-atiradores. Tinham tudo pronto para mostrar na tela: de um lado eu, dando minha mensagem, e do outro a rua. Arrependo-me, porque houive mortes.”
Adiante, volta a usar um tom de advertência. Dissera ter a aspiração de “que todos acatem o resultado” (da eleição). Agregou: “Porém se a oposição sai com alguma baixaria, acusando-nos de fraude, se dizem que recorrerão aos tribunais internacionais ou irão pela via da “guarimba” (literalmente, brincadeira de esconde-esconde; em política venezuelana, provocação, ou, nas palavras do oposicionista Robert Alonso, “criar um caos anárquico em nível nacional, com ajuda de toda a cidadania”), já tenho pronto o decreto para convocar um referendo para perguntar ao país se quer uma mudança constitucional para passar à reeleição indefinida.”
“Seria um contra-ataque”
Esse projeto lhe permitiria ficar no poder até 2021, pelo menos.
“Vai ficar até esse ano?”
“Vou governar seis anos mais.”
“Nada mais?”
“Isto é o que não posso dizer agora, porque vai depender das circunstâncias. Essa seria a minha resposta a uma tentativa golpista de uma oposição irresponsável. Seria um contra-ataque político.”
Chávez descarta qualquer tipo de aliança com a oposição, mesmo que esta reconheça sua derrota. “Porque se amanhã eu, confundindo o que é uma falsa concórdia, chamo alguns velhos caciques da política ao meu gabinete, é questão de tempo para que comecem a tirar das pessoas os projetos populares, a liberar os preços dos alimentos nos mercados, a entregar tudo ao Fundo Monetário Internacional, a fazer acordos com o diabo. Então voltaria a ser acionada a bomba de uma explosão social.”
Um “socialismo latino-americano”
Chávez nunca evita o tema do seu fracassado levante militar em 1992. Tinha 37 anos. Passou dois anos na prisão. Ao sair, em 1995, o jornalista Carlos Croes perguntou-lhe:
“E agora, para onde vai?”
“Buscar o poder”, respondeu Chávez.
Quatro anos mais tarde, à frente do seu partido, o Movimento V República, ele alcançou seu objetivo. Naquele momento, assegura, não era socialista, acreditava numa terceira via. Agora, durante a campanha, falou de levar a Venezuela a um “socialismo latino-americano, que tome como vertente principal o indigenismo de nossas terras”.
Ele cita Galeano (Eduardo Galeano, escritor uruguaio contemporâneo) : “Nada menos forasteiro nestas terras que o socialismo”. E Mariátegui (Carlos Mariátegui, fundador do Partido Comunista Peruano em 1928), “que dizia que nosso socialismo deve ser indo-americano”.
Íntimo do “eixo do mal” sul-americano
Ele se estende sobre o tema de sua diplomacia sui generis. Assegura que “não há nada como olhar olho no olho, de líder para líder”. Assim, fez turnês por todo o mundo e teceu uma insólita rede de relações.
Chama de “grandes amigos” a governantes desassemelhados, que vão de Alvaro uribe, da Colômbia, ao presidente da China; também aos da Rússia, Líbia, Nigéria e Espanha, José Rodríguez Zapatero. Igualmente, ao rei Fahd, da Arábia Saudita, “que descanse em paz”, e ao da Argélia. É íntimo e conversa com freqüência com o “eixo do mal” sul-americano: Lula, Kirchner, Tabaré, Evo Morales, Zelaya (de Honduras), Michelle Bachelet (Chile), aos quais agora se somará (Rafael) Correa, do Equador. E, claro, há o vínculo fraterno com Fidel Castro.
* Intertítulos do Vermelho