Cidadão Instigado inicia shows no Ceará

O Cidadão Instigado cumpre agenda repleta de shows no Ceará. A temporada começou no último dia 3, em Juazeiro do Norte. Hoje, eles se apresentam no CCBN. À Beira-Mar, Fernando Catatau fala de sua relação com Fortaleza. ''A cultura da galera é sem condição

Fim de tarde dominical. Para onde se vai? Naturalmente desconcertado com a situação da entrevista, Fernando Catatau, líder do Cidadão Instigado, escolhe a Beira-Mar e fala ao O POVO sobre sua perspectiva da cidade. Ali, próximo às jangadas, ele ''ainda'' se sente à vontade em Fortaleza. Mudou-se de vez para São Paulo, há cinco anos, com seu Cidadão Instigado, banda cearense reconhecida pela crítica por conta do segundo CD, o elogiado Método Túfo de Experiências (2005). O Cidadão cumpre agenda repleta de shows no Ceará durante o mês de janeiro. Hoje, eles são destaque da programação do Festival BNB Rock-Cordel, no Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBN).


 


Ele mesmo escolhe o lugar. Já morou atrás do Alfredo, o Rei da Peixada, restaurante tradicional no finalzinho da avenida. É algo do que ainda resta de memória afetiva para Fernando, em uma cidade sem o menor senso de preservação. ''Minha mãe foi casada com ele (o Alfredo). Tem um prédio cinza pequeno, um por andar, lá atrás'', diz, apontando a edificação. A conversa rola após os três primeiros shows da temporada no Ceará: nos últimos dias 3 e 4, no CCBN de Juazeiro do Norte, e 6, no Hey Ho, em Fortaleza.


 


''Cara, eu tô achando tudo massa. Na realidade, a gente veio se bancando. Compramo as passagens, marcamo um monte de show'', explica. Dali onde cresceu: Catatau faz questão de sentar na areia. Envergonhado para dar entrevista, a idéia é conversar mesmo. Na boa. Sem esquema de posar para fotografia. ''O Clayton (Martin, baterista do Cidadão) tá aí'', aponta pro lado das jangadas. O baterista chega depois, acompanhado de Uli, a pequena filha de Catatau. Régis Damasceno (guitarra) e Rian Batista (baixo) complementam a formação da banda.


 


A vergonha tem razão até. Catatau se diz desabituado ao universo espalhafatoso de alguns veículos de mídia. Conta “causos” de TV. ''A gente foi fazer uma programa, eu e o Régis, que foi muito massa, ó: o Videogame. Mas teve um da MTV que foi nojento, cara… Primeiro quiseram inventar um movimento (de bandas do Ceará). Mas só que ninguém da galera é a favor disso. Nem a gente, nem os meninos do Montage, nem a Karine (Alexandrino). Todo mundo acha ridículo. Pra tu ter uma idéia, fizeram um cenário em que colocaram um coco, um saco de farinha. Tu acredita? O cara ainda falou: 'quero que vocês agitem'. E eu: 'cara, sou desanimado demais pra ficar agitando. Quer que eu faça o quê?’ Ele começou a ficar puto. Então, no final, eles pediram pra falar algo mais. E o Rian – porque o Rian é muito doido, né? (risos): 'o Cidadão começou com a revolta do Catatau!' Mermão, não consegui mais parar de rir (risos)'', conta.


 


A vida em São Paulo não deixa de ser uma negação ao que Fortaleza é hoje. Em contraponto ao que já foi. Mais tranqüila, sem tanta violência e absurdos do caos urbano. Sobra, então, uma visão crítica e radical sobre o comportamento na capital cearense. Nenhuma perspectiva boa para as mazelas da cidade. ''E para mudar isso é muito lento. Coisa de educação mesmo. A cultura da galera é sem condição. Braba. Você anda dentro do ônibus e a galera joga lixo no meio da rua. Um tratando o outro como bicho. Precisava começar a mudar por aí. Como político, eu não saberia nem por onde começar. Mas acho que tem de educar. É difícil você conseguir ver isso (perspectiva) numa cidade cheia de coisas absurdas, de violência. E o que se faz? Os policiais são nojento do mermo jeito'', observa.


 


Ano passado houve certa dificuldade em se acertar o show no (Teatro) Boca Rica. Dessa vez vocês chegaram e vão fazer vários. Houve uma demanda maior das casas querendo fazer ou a própria produção da banda correu atrás?



 
Os dois. A gente até recebeu proposta para fazer mais shows ainda. Mas não deu. Não é medo de não dar gente. Eu não tô nem aí (pra público). A gente tá aqui pra fazer show, não fica o tempo inteiro aqui. Então quem tiver afim de ver, vê. E a cada show a gente tá fazendo um lance diferente. Na realidade, eu venho para cá nessas épocas e não sei muito bem o que está acontecendo (com a movimentação da música independente em Fortaleza). Escuto alguma coisa de Internet, alguém falando. Mas não acredito em movimento musical em Fortaleza. Cena sempre existiu. Na década de 90 tinham várias bandas, a gente tocava no London London, na Biruta. Acho que naquela época tinha até mais espaço. A cidade não era tão violenta, então tinha muita coisa na Praia do Futuro. De um momento para outro, o Montage tá aparecendo, a Karine também. Mas tá rolando no Brasil inteiro, é o lance da Internet. Não tenho muita noção (de ser referência), não consigo ver isso. Lá, em São Paulo, tô preocupado com o meu aluguel, trabalhando, preocupado com um monte de coisa (risos). Então não consigo visualizar.


 


É comum para quem mora fora, quando volta a Fortaleza, ter a sensação de que as coisas mudaram rapidamente. Você tem isso?


 


Eu não sei se a palavra é mudança. A galera tem o lance mesmo de sair destruindo tudo. Toda vida que eu venho tem um casarão antigo destruído. Mudou bastante em relação aos gringos estarem vindo direto. Usando como um lugar para se divertir com o lance (da exploração) sexual. A violência também invadiu de uma forma absurda. Tô com 35 anos, lembro daqui há 15, 20 anos, era uma cidade maravilhosa para se viver. Você saía na limpeza. Tinha violência, droga acontecendo, mas de uns 10 anos pra cá veio mais forte. Por isso existe uma certa aversão em estar aqui. Porque se você não se sente à vontade não precisa mais estar aqui, né? Eu ando tenso.


 


SERVIÇO



Temporada de shows do Cidadão Instigado – Hoje, no Festival BNB Rock-Cordel, Centro Cultural Banco do Nordeste (Rua Floriano Peixoto, 941, Centro), em Fortaleza, às 12 e 19h. Quinta, 11, às 19h, novamente no CCBN. Grátis. Info.: 3464.3108


 


Sexta, 12, no anfiteatro do Centro Dragão do Mar (Rua Dragão do Mar, 81, Praia de Iracema), às 21h. Ingressos: R$ 8,00 (inteira) e R$ 4,00 (meia). Info.: 3488.8600


 


Sábado, 13, no Teatro da Boca Rica (Rua Dragão do Mar, 260, Praia de Iracema), com 2Fuzz, a partir das 21h. Ingressos: R$ 10,00. Info.: 3224.7868/ 8758.1374


 


Discografia



Cidadão Instigado – EP (1994)



O Ciclo da De.Cadência (2002)



Método Túfo de Experiências (2005)


 


 


Fonte: O POVO