13º Foro São Paulo discute as alternativas ao neoliberalismo

O segundo dia de trabalho do 13º Encontro do Foro de São Paulo, que se realiza na cidade de San Salvador, teve como marca principal um forte sentimento de luta contra o imperialismo e de busca por alternativas concretas ao modelo neoliberal. Ele foi dedic

Ao final, o grupo de trabalho do Foro São Paulo, que reúne os principais partidos de esquerda e centro-esquerda da América Latina e Caribe, ainda se reuniu para dar os últimos retoques ao documento com a síntese do evento, varando a madrugada.



Um processo contraditório
O primeiro painel abordou as alternativas ao neoliberalismo e a luta pela integração regional. Além de confirmar os avanços na região, com a conquista de vários governos progressistas, o painel evidenciou as dificuldades e desafios das forças de esquerda. Houve consenso de que o neoliberalismo, imposto pelo imperialismo e pelas corporações capitalistas, devastou o nosso continente, com recordes de desemprego, informalidade, miséria e violência. As privatizações, o desmonte dos estados, a regressão dos direitos sociais, a criminalização das lutas populares, entre outros efeitos do receituário neoliberal, estiveram presentes nos relatos de vários países.



Neste contexto de devastação, os novos governos progressistas da região, oriundos das lutas democráticas e populares, ainda esbarram em obstáculos para superar o modelo neoliberal. Como relatou o dirigente da Frente Ampla do Uruguai, o processo de mudanças ainda é lento e contraditório. Mas ele se mostrou otimista. “Em nosso país, estamos reforçando o papel do Estado, que na fase anterior foi abandonado em favor do mercado. Aos poucos, ele volta a manejar as políticas de fomento à economia e à distribuição de renda. Desde março de 2005, quando chegamos ao governo, os índices de miséria baixaram no Uruguai. Há muito debate e polêmica na Frente Ampla, mas ela não pode se dividir e deixar de aplicar seu programa. Se isto ocorre, o processo de mudança será derrotado e a direita voltará ao poder em nosso país”.



Revelando a amplitude e a pluralidade no interior do Foro São Paulo, o dirigente do Partido Comunista do Chile também ressaltou os avanços das esquerdas na América Latina e Caribe, mas foi mais incisivo nas críticas às mudanças efetuadas no Chile. Para ele, apesar da história e dos compromissos assumidos por Michele Bachelet, “o país continua sendo um laboratório das políticas neoliberais, que privatizaram toda a economia, inclusive com a entrega de 65% do nosso cobre às empresas estrangeiras, e flexibilizaram os direitos trabalhistas – as empresas terceirizadas pagam 10% do valor dos salários no país. Bachelet gerou muitas expectativas, mas não se pode esquecer que a Concertacion, que a elegeu, governa há dez anos. No Chile, o sistema eleitoral exclui os partidos de esquerda. O PC do Chile apoiou Bachellet no segundo turno para evitar a vitória da direita, mas ele se mantém na oposição ao atual governo”.



Outra experiência emblemática destes avanços e contradições foi revelada no caso argentino. Enquanto um dirigente de esquerda elogiou as “mudanças efetuadas por Néstor Kirchner, que enfrentou o capital financeiro e o FMI na questão da dívida externa, está punido os algozes do período da ditadura e promove a inclusão social de milhões de excluídos pelo neoliberalismo”, Patrício Echegaray, líder do Partido Comunista da Argentina, fez questão de ressaltar os limites deste governo. “Aparentemente, Kirchner se soma na luta pela integração regional, mas ele não desenvolve uma política avançada, de esquerda, em nosso país. É urgente unir a esquerda argentina para apresentar uma alternativa mais progressista”.



Alternativas ao neoliberalismo
Apesar destas diferenças de fundo, que nuançam as avaliações sobre as mudanças em curso na América Latina e Caribe, todos fizeram questão de enfatizar os avanços da esquerda na região e de tentar extrair lições sobre as alternativas concretas ao neoliberalismo. Houve consenso de que é urgente reforçar o papel dos Estados nacionais, paralisando e revertendo os processos de privatização; enfrentar o capital financeiro e as corporações capitalistas, abortando o processo de saque das riquezas nacionais; investir em políticas sociais que universalizem os direitos e dêem resposta aos problemas emergenciais; e ampliar a democracia, com maior participação popular, como forma de enfrentar as elites burguesas e de superar os entraves neoliberais.
 


Neste ponto, foram ressaltadas as experiências desenvolvidas pela Venezuela e a Bolívia, que avançam no sentido de mudanças estruturais e de maior protagonismo popular. Como ressaltou Salvador Arias, deputado federal e dirigente da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), “estas experiências indicam que é preciso construir um novo estado, um novo poder popular, que não basta falar apenas em democracia formal. Confirmam que é preciso promover mudanças estruturais e universalizar os direitos e não apenas adotar medidas emergenciais. Os governos de esquerda não podem ter como objetivo desenvolver e melhorar o capitalismo”.



Enquanto vários destacaram que não há alternativa ao neoliberalismo sem ter no horizonte a perspectiva socialista, outros priorizaram um programa antineoliberal. O dirigente do PRD do México, partido que só não conquistou o governo em decorrência da recente fraude eleitoral, foi um dos que criticou “as proclamações fáceis sobre socialismo. Para que a esquerda avance, é preciso que os nossos governos sejam eficientes e que o Estado não seja burocratizado, como no passado. Temos que jogar com as regras do jogo, com as próprias regras do mercado, mas sendo eficientes para gerar riquezas, garantir o desenvolvimento e permitir o bem-estar social”.



Integração regional
Outro ponto de consenso neste painel foi sobre a urgência da integração latino-americana e caribenha, como única forma de se contrapor ao poder imperialista dos EUA. A própria idéia do “desenvolvimento com justiça social” foi encarada como viável caso os povos do continente avancem na sua integração política, econômica e social. Neste sentido, foram elogiados os recentes avanços na reformatação do Mercosul, na construção da Comunidade Sul-Americana e na proposta da Alternativa Bolivariana das Américas (Alba), que acaba que conseguir a adesão da Nicarágua – já contava com a participação da Venezuela, Bolívia e Cuba.



Neste ponto, o painel contou com as contribuições de delegações de outros continentes. Um deputado do PC da Espanha, que falou em nome da bancada de quatro membros do Grupo Parlamentar da Esquerda Européia, enfatizou que a integração deve servir aos povos e não às corporações empresariais. Ela relatou que o povo derrotou em referendo a proposta de nova Constituição européia porque “ela pretendia transformar a Europa numa Europa S.A., com liberdade total para o capital financeiro, a redução do papel social do Estado, a criminalização das migrações e o aumento de informalidade e da precarização do trabalho”.



Já o representante do PC do Vietnã destacou que “novos ventos estão soprando na América Latina e o Caribe, com as vitórias consecutivas de muitos partidos de esquerda, como no caso de Lula no Brasil, Chávez na Venezuela, Evo na Bolívia e Ortega na Nicarágua. Muitas dificuldades serão enfrentadas por estes governos, mas é fundamental a unificação de todas as forças de esquerda para superá-las e para avançar na integração deste rico continente”. 



• Os outros três painéis – que trataram da ingerência imperialista no continente, da luta contra a militarização e o colonialismo e da relação dos partidos de esquerda, governos progressistas e movimentos sociais – serão abordados nos próximos artigos.


Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB e editor da revista Debate Sindical.