Para Amorim, Mercosul começa a ter perfil mais político

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, admite que a América do Sul vive um momento de ebulição na esfera política. Ele considera, porém, que a nacionalização promovida pelo presidente da Bolívia, Evo Morales, e o socialismo do século 21 anuncia

Em entrevista ao jornal O Globo, Amorim afirma que os líderes regionais podem até ter visões diferentes sobre como integrarem seus países, mas considera haver um sentimento comum independente de diferenças ideológicas que vê na integração uma via mais fácil para resolver os problemas da parte sul do continente americano.



Como avaliar uma cúpula de presidentes sul-americanos em um momento em que a situação política é tão especial?
Esta é a maior cúpula de presidentes já realizada e isso em si já é um grande sucesso. A América do Sul passa por ebulição, mas todos os líderes estão interessados na integração, do Uribe (Colômbia) ao Chávez (Venezuela), do Evo (Bolívia) ao Alan Garcia (Peru). Eles podem ter visões diferentes de como chegar lá, mas há um sentimento comum de que com a integração é mais fácil resolver os problemas. Essa consciência da integração independe de ideologias.



O Mercosul começou como um acordo de um grupo comercial. O bloco agora adquire um perfil mais político?
O Mercosul tem de se adaptar aos tempos. Os tempos vão evoluindo. O comércio no Mercosul foi o instrumento principal usado. Só que há confluência das duas coisas. Acho que o comércio foi e é um instrumento indispensável na integração, e assim é na História.



Mas agora a política pode atrapalhar o comércio?
Não concordo. O comércio tem aumentado muito. Nossas exportações para a Venezuela multiplicaram por seis nos últimos quatro anos. E não é só para a Venezuela. Para a Colômbia pode não ter aumentado por seis, mas por três. No caso do Brasil, nossas exportações estão batendo recordes para todo mundo. E não se pode dissociar o comércio do político e nem o político do comercial. Ao se aprofundar a integração na América do Sul você ganha melhores condições de barganha no mundo. Os presidentes que estão aqui vêem a complexidade, mas vêem também a oportunidade.



Chávez é o principal ponto de fricção entre os EUA e o Mercosul. Como isso afeta o bloco?
Conhecendo um pouco o pensamento americano, acho que eles preferem que nós tenhamos uma relação positiva com Chávez. Eles perceberam que cometeram um grande erro ao apoiar o golpe na Venezuela ou, pelo menos, permitir que se achasse que eles apoiaram o golpe. Para os EUA, é muito melhor uma política de engajamento. Quanto mais integrados estivermos, maior a possibilidade de permanecer uma linha reformista e democrática, que é a que o Brasil tem seguido. Não é que o Brasil queira exportar o seu modelo. Mas acho que há mais chance através do diálogo.



Mas e se Chávez eventualmente radicalizar, isso não prejudicará o Brasil?
Ao contrário. Até desperta mais o interesse pelo Brasil como moderador dentro da região.



Que mensagem o Brasil quer passar nessa cúpula?
A mensagem que o presidente Lula dará é a ênfase à democracia e à cláusula democrática do Mercosul, o respeito à pluralidade, que não significa exportar modelos de um país para outro.