Estado indeniza segundo feto como vítima da ditadura militar

Mais um feto foi reconhecido como vítima de tortura durante a ditadura militar, desta vez no Rio. A comissão de Reparação do Estado entendeu que Lucas Pamplona Amorim, 31, foi violentado, em 1975, enquanto ainda estava na barriga de sua mãe, Vitória Pa

É o segundo caso em que um feto é reconhecido como vítima de tortura. A Comissão de Ex-Presos Políticos de São Paulo indenizou João Grabois por ter sido torturado junto com sua mãe, Criméia Grabois, também em 1975. A família de Lucas usou, entre outros documentos, a decisão do órgão paulista para comprovar os efeitos da tortura no feto. Ele será indenizado em R$ 20 mil.


 


Em 7 de setembro de 1975, Vitória Pamplona foi levada para o DOI-Codi, na Tijuca. Lá, foi obrigada a ouvir os gritos de seu então marido, o músico Geraldo Azevedo, enquanto ele era torturado. Vitória anexou ao processo a ficha médica do filho produzida por seu pediatra. Nela, o médico relata a infância de Lucas, com crises alérgicas e asmáticas. Dizia que nasceu com baixo peso: 2,3 kg.


 


Parecer do perito médico legal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Rio, Talvane de Moraes, é enfático: “É imperioso admitir que o senhor Lucas Pamplona Amorim (…) sofreu conseqüências neuropsíquicas do tipo estresse, que a ele se ele transmitiu diretamente pela circulação materno-fetal”.


 


“Além disso, ele não foi amamentado direito. Tive uma brutal depressão pós-parto”, contou Vitória. A afirmação vem embasada por parecer do médico Marcus Renato de Carvalho.


 


No primeiro julgamento, em agosto de 2006, o pedido de indenização foi negado. A procuradora do Estado Leonor Nunes de Paiva baseou a negativa em três argumentos, como o de que não haveria lei que amparasse os direitos de um feto em relação à tortura e o de que o caso de Grabois, em SP, seria diferente, pois nascera na prisão.


 


Vitória recorreu apontando o que seriam equívocos de Paiva, como o fato de Grabois ter nascido em Brasília -a indenização dada em SP, portanto, seria referente à tortura sofrida quando ele era um feto. Em 14 de dezembro –na mesma sessão em que o processo da ministra Dilma Rousseff foi deferido– Lucas venceu por 5 a 2 votos. Hoje, ele é músico e mora em Londres.


 


A União e os Estados reconhecem sua responsabilidade pela tortura, morte e desaparecimento de opositores no regime militar. Na época, militantes da esquerda armada cometeram crimes de assalto, seqüestro e morte.


 


Precedente


 



o processo de Lucas Amorim abrirá um precedente na mesma comissão de Reparação no Rio. Adriana Bezerra Cardoso, 36, deve ter seu processo revisto.


 


Em 1970, sua mãe Maria Irony Bezerra Cardoso, morta em 2000, foi torturada no Rio, durante a gravidez. Adriana é filha de José Domingos Cardoso, o Ferreirinha, morto em 2001, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores e amigo de Lula. Maria Irony e Ferreirinha eram dirigentes da Juventude Operária Católica.


 


Seu processo foi indeferido em outubro pela comissão, após o de Lucas Amorim. O relator do caso foi o representante da secretaria de Assistência Social, Rodrigo Ferreira. Ele baseou a negativa no indeferimento da procuradora do Estado Leonor Paiva no processo de Lucas.


 


Durante a sessão de 14 de dezembro, quando Lucas foi reconhecido como feto vítima de tortura durante a ditadura, Ferreira, presente à sessão, lembrou o caso de Adriana.


 


“Foi uma atitude muito boa dele. Mesmo tendo votado contra nos dois processos, lembrou e pediu para o processo ser revisto”, contou Vitória Pamplona, mãe de Lucas.


 


Para que o processo seja revisto, a comissão precisa ser restabelecida. A lei 3.744 de dezembro de 2001 determinou que o órgão seria extinto em dezembro de 2006. O subsecretário de Direitos Humanos do Rio, Lourival Casula, disse que pretende recriar a comissão.


 


Há ainda 173 processos a serem analisados. Das 755 pessoas reconhecidas como vítimas de tortura, apenas 140 receberam os R$ 20 mil até hoje.


 


Fonte: Folha de S. Paulo