China está longe da desaceleração, dizem especialistas

Professores explicam que a crise desta semana é passageira.  Mas alertam: turbulência mostra que a China pode criar uma quebradeira mundial.

Se alguém ainda duvidava, agora é oficial: se a locomotiva da China desacelerar, a economia do mundo inteiro pode sair dos trilhos. Bastaram rumores de uma intervenção governamental na Bolsa de Xangai para que um ''efeito dominó'' se espalhasse pelo mundo, gerando perdas para investidores e empresas.


 


Entretanto, ainda não é desta vez que a economia mundial viverá uma ''síndrome da China''. A turbulência desta semana, garantem especialistas ouvidos pelo G1, é passageira, mas serve de alerta para o poder chinês.


 


A terceira maior economia do planeta resolveu restringir a entrada de investidores locais no mercado financeiro. Isso porque, nos últimos 18 meses, o mercado do país se valorizou 160%, motivando muita gente a pedir empréstimo em bancos para aplicar nas bolsas chinesas, que não aceitam investidores externos. Esse movimento, que freou o volume de dinheiro aplicado em ações de empresas chinesas, deu combustível aos boatos de que o governo chinês reduziria o crescimento da economia do país, afetando empresários de todo o mundo que vendem para a China.


 


Segundo o professor de finanças internacionais do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais de São Paulo (Ibmec-SP), Roberto Dumas Damas, a verdade é que os mercados financeiros de todo o mundo, inchados por um longo período de ganhos, aproveitaram uma ação específica da China para embolsar lucros. Este tipo de efeito é comum nas bolsas, segundo Damas: se um investidor faz forte venda de ações, outros seguirão o mesmo caminho, independente da real situação do mercado.


 



Forte crescimento


 


Entretanto, de acordo com o professor do Ibmec, o governo chinês não deve reduzir o crescimento da economia dos próximos anos. E isso por um só motivo: o partido comunista não tem condições de convencer a população de que um crescimento inferior a 8% ou 9% é benéfico ao país – no ano passado, a China cresceu 10,7%. “Acho muito difícil que a China venha a crescer menos de 9,5%”, afirma.


 


Segundo o professor, o governo central chinês comanda a população com mão de ferro – e falta de liberdade só se compra com dinheiro e emprego. “Os protestos da Praça da Paz Celestial, em 1989, coincidiram com o período de crescimento econômico fraco no país, de 4%”, lembra Damas. “É como ocorreu no Brasil, nos anos 70. Enquanto o país crescia 10%, a ditadura fez o que quis. Quando a fase de crescimento acabou, o regime se enfraqueceu”, compara.


 


O coordenador do Núcleo de Estudos Asiáticos da Universidade de Brasília (UNB), Lytton Guimarães, concorda. A sociedade chinesa está dividida entre as classes emergentes e a população pobre do interior, que também quer ser incluída na ''nova economia'' do país. Por isso, por mais que a China queira atender a pressões internacionais por desvalorização da moeda e respeito às leis de comércio internacional, existem demandas internas que atrasam este processo.


 


“Se a economia se desacelera, o desemprego pode aumentar, o que vai atrasar o processo de inclusão social”, diz Guimarães, lembrando que, historicamente, a China se dedicou muito mais aos próprios problemas do que às exigências internacionais. Nesta balança, portanto, tende a pesar a manutenção do crescimento econômico como fator de paz interna. “É um bola de neve de crescimento, não tem como parar”, explica o pesquisador da UNB.


 


Brasil


 


Apesar ser um importante parceiro comercial brasileiro – segundo a Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China (CCIBC), até 2010 o país será o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas dos EUA -, o efeito de uma desacelaração da economia nacional seria indireto. Segundo Damas, professor do Ibmec, o principal problema de uma eventual queda das compras chinesas seria a redução do preço internacional de produtos como a soja e o minério de ferro.


 


Atualmente, a China representa cerca de 10% do comércio internacional brasileiro, e compra basicamente produtos primários. Segundo Damas, o Brasil e a China têm uma relação comercial equilibrada – ou seja, o país vende para o Brasil mais ou menos a mesma quantidade que compra. Por isso, caso o país passe a exportar menos para a China, a relação seria compensada pela redução das importações de produtos feitos no país.


 


Entretanto, com a China comprando menos produtos por causa de uma redução em sua atividade econômica, a demanda mundial por produtos básicos – que representam boa parte das exportações brasileiras – seria reduzida. E isso prejudicaria a economia do Brasil. Com o atual dólar baixo, é o alto preço das commodities que segura a balança comercial brasileira. Com a China comprando menos, a procura diminuiria e os preços seguiriam o mesmo caminho, causando uma redução no saldo comercial do Brasil.


 


Fonte: G1