Lula Morais – Homens e mulheres são parceiros na construção do mundo

“Os que pensam que as vitórias se geram do acaso ou que são operadas na zona franca das facilidades, estão fadados a grandes decepções. As vitórias são filhas das grandes lutas e estas só se fazem com determinação e ousadia. Na luta da mulher por seus dir

Senhor Presidente:


Senhoras deputadas


Senhores deputados


Convidados desta sessão especial:


 


Em dezembro de 2004, as delegadas da Marcha Mundial das Mulheres, reunidas em Kigali (Ruanda), no 5o. Encontro Internacional, aprovaram a CARTA INTERNACIONAL DAS MULHERES PARA A HUMANIDADE, em que propunham construir um mundo sem exploração, opressão, intolerância e exclusões; um mundo onde fossem respeitadas a integridade, a diversidade, os direitos e as liberdades de todos; um mundo baseado na igualdade, liberdade, solidariedade e paz.


 


Na parte específica de suas reivindicações, a Carta exigia que os países implementassem políticas, planos de ação, programas eficientes, com recursos financeiros e medidas adequadas para combater a violência contra a mulher e a arrogância dos preceitos patriarcais, construindo plataformas para a democratização da estrutura familiar e social.


 


Esse movimento haveria de obter funda repercussão no mundo inteiro e, no Brasil, provocaria a intensificação da discussão que resultaria na LEI MARIA DA PENHA.


 


Mas, relatemos outros antecedentes.


 


Em 1999, uma mini-série da Rede Globo contou a história de Chiquinha Gonzaga, musicista, compositora e pianista de grande gabarito, que viveu nos finais do século 19 e início do século 20, no Rio de Janeiro. A história desta valorosa mulher, que enfrentou toda sorte de preconceitos e desafios, atraiu a admiração dos brasileiros. Chiquinha Gonzaga deixou seu nome assinalado como uma descobridora do talento negro, valorizando a música, a poesia e a dança de origem africana num tempo em que essas manifestações culturais eram consideradas marginais e perseguidas pelo poder público. E o levantamento de sua memória, praticado por um meio tão abrangente de comunicação, “abriu alas” para um importante debate na transição para o terceiro milênio.


 


Os que pensam que as vitórias se geram do acaso ou  que são operadas na zona franca das facilidades, estão fadados  a grandes decepções. As vitórias são filhas das grandes lutas e estas só se fazem com determinação e ousadia. Na luta da mulher por seus direitos não há concessões: há conquistas.


 


Nessa estrada de luta pela conquista da dignidade humana, muitas mulheres tombaram, massacradas pela opressão patriarcal e pela truculência dos dominadores. Cruzes e cicatrizes marcam este duro caminho. E a lembrança que deu origem a esta data é a daquele massacre, ocorrido há 151 anos, quando 129 operárias textéis foram queimadas vivas na fábrica Cotton, em Nova York, por protestarem contra as condições desumanas de trabalho e os baixos salários.


 


Aquele dia, 08 de Março de 1857, mostrou a face terrível do capitalismo nascente, substrato cultural injusto e erigido na ignorância, mas acendeu uma fogueira no coração de algumas mulheres destemidas que, a partir dali, desenvolveram uma cruzada internacional para  também acender a consciência feminina. A Segunda Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, realizada em 1910 em Copenhague, Dinamarca, dedicou essa data à luta das mulheres.


 


Há mais de 150 anos, lançadas as bases do movimento feminista, tentam as mulheres convencer ouvidos e olhos civicamente distraídos para questões que sempre foram urgentes, mas nunca foram tratadas com o zelo que requerem, proteladas criminosamente ou cinicamente tangenciadas para o território nebuloso do menosprezo e  o descanso sombrio das gavetas.


 


Hoje, a sociedade não pode se negar discutir, por exemplo, os direitos trabalhistas da mulher, o problema da isonomia, a questão da equiparação salarial entre homens e mulheres para funções idênticas, a ascensão profissional, o combate às discriminações, as denúncias de assédio sexual, a prática do racismo, do boicote às portadoras de deficiência, às grávidas, às mães solteiras, às feias, às pobres, às que participam da política, às religiosas ou às livres pensadoras.


 


Apesar dos avanços da legislação, permanece um ranço machista que  mal disfarçadamente, através da mídia, reproduz antigos preconceitos sobre a capacidade da mulher. Chegaram ao cúmulo de veicular recentemente uma mal explicada teoria biológica, formulada por cientista até então desconhecido, segundo a qual a mulher teria menos neurônios que o homem, portanto, menos inteligência. Esta é mais uma daquelas teorias diariamente desmentidas pela prática.


 


A história está cheia de exemplos de estadistas do porte de Indira Ghandi, Coraçon Aquino, Michelle Bachelet, para citar apenas algumas contemporâneas. Agora mesmo a complicada política internacional dos Estados Unidos é dirigida por uma mulher, negra, que, dessa forma, derruba dois fortes preconceitos históricos, Condolessa Rice, lamentavelmente porta-voz da beligerante e perversa política deste cowboy que é o presidente George Bush.


 


Na história do Brasil, as mulheres têm sido exemplo de força e garra, sempre  presentes nas jornadas democráticas e libertárias, lutando lado a lado com os homens pela construção de um país melhor. Muitas dessas mulheres alçaram à condição de heroínas, perseguindo sonhos e ideais de liberdade, tais como Anita Garibaldi e Maria Quitéria; Nísia Floresta, nas jornadas pelo direito à educação; na luta emancipadora, Chiquinha Gonzaga e Pagu rebelaram-se contra os costumes tradicionais de sua época. Berta Lutz  liderou o movimento sufragista no Brasil, conquistando o direito ao voto em 1932.  Olga Benário, Elza Monerat, na luta contra a opressão e pelo socialismo; Helenira Resende, Maria Lúcia Petit, na Guerrilha do Araguaia.


 


O Ceará, em alguns momentos brilhantes de sua história, teve a participação corajosa de suas mulheres.


 


Nas revoluções liberais do século 19, sobretudo, na Revolução de 1817, emergiu do Cariri dona Bárbara de Alencar, mãe de Tristão Gonçalves, alma afoita e destemerosa daquele movimento que sonhava com uma república, sofrendo tortura e prisão em nome de seus ideais.


 


Na Campanha pela Abolição dos Escravos, de que fomos os libertadores pioneiros, foi de importância capital a participação da Sociedade das Mulheres Libertadoras, em que se destacaram nomes como:


 


Maria Tomásia; Carolina Cordeiro; Luduvina Borges; Elvira Pinho; Jacinta Souto; Eugênia Amaral; Jovina Jataí; Emília Freitas e Maria Augusta Ferreira.


 


Anos antes, já se destacara por sua coragem, uma adolescente de Tauá (conterrânea, portanto, de nosso presidente Domingos Filho), que, querendo por todos os meios combater na Guerra do Paraguai, se alistou num batalhão do Piauí e seguiu para o Rio de Janeiro, onde solicitou ao próprio Imperador Pedro II a licença para acompanhar o Exército Brasileiro na ferocidade dos combates. Dom Pedro não permitiu, mas o gesto heróico de JOVITA FEITOSA tornou-a um símbolo da valentia e do patriotismo da mulher cearense.


 



Mulheres cearenses, muitas, de ontem e de hoje, se destacam por sua inteligência criadora, como o fez Rachel de Queiroz, e por sua intrepidez política, como fez Jana Barroso, que morreu combatendo pela liberdade, na guerrilha do Araguaia. Exemplos de lutadoras pela anistia são Vanda Sidou, Ruth Cavalcante e Maria Luíza Fontenelle.


 


Das mulheres rendeiras do Aracati às parteiras dos Inhamuns, por seu talento e dons especiais, por sua formosura tropical e sua audácia, iracemas valentes e amorosas, veementes em sua franqueza sertaneja e nas noites ternurais das brisas do preamar, na peneira das farinhadas e nos palanques frenéticos dos momentos mais vibrantes de nossa história.


 


Senhoras Deputadas , Senhores Deputados:


 


No dia 07 de Agosto de 2006 passou a vigorar a Lei 11.340, aprovada no Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente Luís Inácio Lula da Silva.


 


A LEI MARIA DA PENHA, como ficou denominado o novo ordenamento jurídico, cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, segundo doutrina a Convenção Internacional para Prevenir, Punir e Erradicar a violência contra a mulher.


 



Não parava aí o providencial instrumento de defesa da humanidade, pois dispunha também sobre a Criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, alterando o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal.


 


Nossa homenageada de hoje a biofarmacêutica MARIA DA PENHA MAIA, é um exemplo vivo de martírio e resistência heróica, cuja experiência pessoal como alvo da arrogância bestial e da truculência absurda e covarde, sacudiu a opinião pública nacional e internacional.


 


Vítima indefesa da ação criminosa de seu ex-companheiro, que por duas vezes tentou assassiná-la (numa delas durante o sono), levantou-se da morte para lutar pela vida, a dela e a de milhares de outras golpeadas pela brutalidade de homens de alma torpe.


 


Seu exemplo de consciência e valentia enobrece a história do nosso estado e esplende por todos os recantos, fazendo com que o Ceará novamente assuma o seu conceito de TERRA DA LUZ, com a missão de espargir pelo Brasil afora a libertadora claridade da razão, o fogo vigoroso da lucidez e a dignidade social que nos justifica como verdadeiros seres humanos.


 


Lei de Maria da Penha. Lei da força obstinada contra a impunidade e a injustiça. Lei da mulher cearense para a mulher brasileira. Lei da Terra da Luz.


 


Atualmente, o outrora denominado “sexo frágil” vai, literalmente, à luta, dando origem a novos perfis de mulher: guerreira, profissional competente, independente, chefe de família, provedora do lar. Entretanto, continuam submetidas à sobrecarga da dupla jornada de trabalho, sendo o segmento populacional mais exposto à violência doméstica.


 


Nas relações trabalhistas as mulheres também sofrem discriminação, são mais sujeitas ao assédio moral e sexual, ao desemprego, aos baixos salários e a precarização do trabalho, sobretudo quando se trata da mulher pobre, de baixa escolaridade, nordestina e negra.


 


O Dia Internacional da Mulher com certeza não foi instituído somente para confraternizações. É uma data sagrada para a inteligência humana. Homens e mulheres são parceiros na construção do mundo e se devem respeitar como sócios lúcidos desse destino.


 


Está provado que a submissão, a negação de valores e o exercício da opressão são fórmulas que não deram certo.


 


O exemplo de Maria da Penha é uma mão cheia de sementes na vasta seara. Vamos plantar lucidez na terra generosa.


 


Os líderes, as comunidades organizadas, os formadores de opinião, as organizações sociais e os partidos políticos têm compromissos irrecusáveis com a conscientização e a disseminação de idéias que ajudem à fraternidade, ao respeito e à solidariedade entre todos. Esta não é uma tarefa: é um compromisso de dignidade diante da vida.


 


Senhor presidente, senhoras e senhores deputados, termino convidando a todos, homens e mulheres, a participar da Plenária  Estadual da primeira Conferência Nacional sobre a Questão da Mulher, promovida pelo Partido Comunista do Brasil, neste Sábado, no auditório da Reitoria da UFC, à partir das 9:00 horas.


 


É o que tenho a dizer, senhor presidente, muito obrigado