Ciro Gomes: é preciso romper com a burrice da ideologia dominante

Reunidos na manhã desta sexta-feira, 20, os deputados federais Aldo Rebelo (PCdoB-SP), Ciro Gomes (PSB-CE), Paulinho (PDT-SP) e o economista Márcio Pochmann debateram o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e seus impactos para a construção de

O deputado Ciro Gomes começou sua fala afirmando que “o PAC é uma iniciativa muito importante em si, e também pelo que ele vai produzir de impactos se conseguir superar os desafios de sua implantação. O PAC traz para os 4 anos do governo Lula metas de crescimento econômico, de 4,5% para este ano e de 5% para os três anos seqüenciais. Se essas medidas forem implementadas elas terão um efeito extraordinário”.


 


 


Gomes pontuou alguns desses impactos, que serão “imponderavelmente positivos”. Ele citou a construção da BR 164 que ligaria Cuiabá a Santarém, que é um projeto brilhante de intervenção de infra-estrutura em plena Amazônia, com ordenamento territorial vindo antes, com a prevenção das degradações potenciais ao meio ambiente, que vai impactar positivamente a competitividade da produção agrícola do centro-oeste. As conseqüências disso são imponderáveis de prever”.


 


 


Outro mérito do PAC, disse o deputado do Ceará, “é tirar a Petrobras dessa inércia neoliberal, obrigando-a se coordenar com o projeto estratégico de desenvolvimento embrionário no país, ainda não sistematizado, quando determinado, por exemplo, que ela realize um conjunto de providências em gasodutos”.


 


 


Outro aspecto que Ciro Gomes ressaltou do PAC, e talvez mais importante, é o fato dele “romper com uma burrice, uma estupidez criminosa que a ideologia dominante no Brasil impôs ao longo dos últimos 20 anos”, referindo-se à perversão neoliberal, que fortaleceu a cultura do consumo e a idéia de que o livre mercado é o ente que regula melhor a economia nacional.


 


 


Ciro discorreu sobre a cultura do consumo, que determinou como valor de felicidade o quanto é possível consumir com os recursos que se dispõe. Para ele, é essa cultura que gera a violência, “porque não é a miséria que gera a violência, mas sim a justaposição entre a miséria e a expectativa de consumir de acordo com os padrões determinados”.


 


 


Com respeito ao mercado como regulador, Ciro lembrou que a crítica a ele não pode ser feita de forma superficial, mas que é preciso analisar profundamente as amarras de financiamento da economia, a defasagem tecnológica do Brasil que está pelo menos 3 décadas atrasada e resgatou a importância do papel do Estado “as assimetrias globais são complexas demais para que o Estado brasileiro se reduza a uma dimensão mínima, de baixo custo”.


 


 


Ciro concluiu que a precariedade em que se encontra o Estado brasileiro é um entrave estrutural para a adoção de um projeto de desenvolvimento e pode ser um adversário para a aplicação das diretrizes e operações previstas no PAC.



 


 


Democracia e Desenvolvimento


 


 


Não há como perseguir uma sociedade mais democrática sem que haja um projeto de desenvolvimento econômico que permita a “construção de uma nação unida e forte”, o que, num país das dimensões territoriais do Brasil, “não se faz cavando um foco de desigualdade ou jogando abaixo da esperança e do progresso regiões, classes sociais ou setores econômicos, como infelizmente acontece no Brasil hoje”. Esse foi um dos focos da apresentação do deputado Aldo Rebelo, que abriu o debate.


 


 


Rebelo afirmou que o país vive um processo de transição, onde não é mais crime se falar em desenvolvimento e crescimento, iniciada em 2002 com a eleição de Lula, que significou uma ruptura política marcada pela “ascensão ao primeiro plano da vida política do país, de forças sociais emergentes novas, lideradas por um operário, líder sindical, nordestino”.


 


 


Consistência do PAC


 


 


Para o deputado paulista, “o PAC é um programa que tem consistência naquilo que ele se propõe, que é reunir investimentos públicos e políticas públicas de financiamento e exoneração fiscal”.


 


 


O PAC reúne 29 medidas das quais 21 são novas e as outras já estavam em curso no Congresso Nacional. Nele estão previstos mais de 500 bilhões em investimentos, 69 bilhões provenientes do orçamento e a outra parte de origens diversas, particularmente do BNDES e da Petrobrás. O PAC é composto por medidas de incentivo ao crédito e financiamento, fiscais, de melhoria dos investimentos, tributárias e fiscais, de médio e longo prazo.


 


 


Rebelo pontuou, ainda, o problema do juro e afirmou que “não podemos cair na cantilena de que juro baixo é sinônimo de crescimento. O Japão passou muito tempo com juro zero e crescimento zero. Mas, por outro lado, também é verdade que juro alto impede o crescimento”. Outro aspecto econômico que Rebelo salientou foi o da “supervalorização do câmbio que, em um país com as características do Brasil também é um entrave para o crescimento, pois reduz a capacidade de nossa economia enfrentar a concorrência no mundo de hoje”.


 


 


Para Rebelo, uma nova fronteira econômica que se abre para o Brasil é a do Biodiesel, tema que tem incitado grande polêmica. “Não vejo que a condenação a priori da produção de álcool e de diesel a partir da biomassa seja uma bandeira inteligente. Cada um produz o que pode. Nós temos condições de produzir cana e precisamos produzir dendê, mamona e fazer disso um projeto social para não reproduzir o Ciclo da Borracha que, com mão-de-obra escrava, produziu um amplo ciclo de exploração da Amazônia. O que ficou disso foi apenas o Teatro Amazonas. Temos que fazer com que esse projeto atenda os trabalhadores, a agricultura familiar. E não podemos aceitar a internacionalização desse setor, que tem um acumulo nacional importante. Precisamos fortalecer a base nacional dessa indústria e encontrar uma saída para o pequeno proprietário e para a agricultura familiar, e o PAC aborda essas questões”.


 


 


Porém, Aldo ressalta que “ao mesmo tempo em que o PAC é um programa muito importante e consiste, ele não é tudo. Há questões que não estão postas nem em discussão nem como alternativas no PAC e que merecem continuar sendo examinadas por aqueles que têm compromisso com o desenvolvimento econômico e social. Não há democracia consistente sem projeto de país, se o país não tiver lugar para a esperança dos pobres, trabalhadores e que vivem numa situação desfavorável”.


 


 


Desenvolvimento: debate político e econômico


 


 


O economista Márcio Pochmann iniciou afirmando que “o debate do desenvolvimento no país se transformou num tema mais político de que econômico”. Ele argumenta que o Brasil vive um momento singular em sua história que, por vários fatores, permite construir um caminho diferente, porque pela primeira vez na história o Brasil está em condições de participar de uma revolução tecnológica como protagonista.


 


 


 


Pochmann considera que o PAC é, inegavelmente, um elemento importante, novo, na construção desse caminho, porém levanta alguns desafios para que ele seja executado em sua concretude.


 


 


Ele aponta a profunda estruturação capitalista que está em curso, que altera o padrão de desenvolvimento urbano e industrial que marcou o século 20, “para uma sociedade pós-industrial que se organiza a partir de bases materiais completamente distintos daqueles que foram originados no final do século 21. Isso é uma questão importante a ser considerada porque o padrão de desenvolvimento urbano e industrial não foi universalizado. Nós todos defendemos o desenvolvimento, mas o padrão do desenvolvimento defendido ao longo do século 20 pelo capitalismo, sustentado na produção e consumo de massa, é insustentável ambientalmente. Esse padrão tem como principais instrumentos a produção de bens de consumo incapazes de serem universalizados, como por exemplo o padrão norte-americano, que é assentado na produção de automóveis, a cada 4 pessoas 3 têm automóveis. Mas esse desenvolvimento é incapaz de ser universalizado, a não ser na forma do subdesenvolvimento, que é a possibilidade de você oferecer esse padrão de consumo apenas e tão somente para uma pequena parcela da sociedade.


 


 


No entanto, Pochmann chama a atenção para o fato de que esse padrão de produção está em crise. “Portanto nós temos a oportunidade de sermos protagonistas de um outro padrão de desenvolvimento que não seja esse. Qual é o padrão de desenvolvimento que interessa ao povo, é um automóvel pra cada um? Ou é um transporte coletivo de qualidade para todos? Nós temos a oportunidade de participar dessa decisão”.


 


 


Ainda nessa reestruturação capitalista, outro aspecto tem que ser considerado, se o Brasil vai se transformar num país produtor de bens e serviços de baixo valor agregado e pouco conteúdo tecnológico, que pressupõe mão-de-obra barata, contrato de trabalho com salários baixos, jornadas elevadas, e alta rotatividade, ou se vai desenvolver um trabalho de concepção, vinculado às novas tecnologias. E num cenário internacional de grandes e poucos oligopólios internacionais, que nos próximos 20 anos deve ter 500 empresas dominando o mundo, quais e quantas empresas o Brasil vai querer construir para ter capacidade competitiva.


 


 


Para o economista da Unicamp, “os desafios do PAC na consecução de um projeto nacional de desenvolvimento requer uma maioria que seja capaz de tolerar as divergências. Senão formos capazes de construir uma maioria política, não adianta cada um de nós termos o nosso projeto de desenvolvimento, porque esse não será o projeto de desenvolvimento do Brasil, será o projeto das 20 mil famílias que direcionam as aplicações financeiras. E essa é uma questão importantíssima, pois temos a oportunidade de construirmos uma nova maioria capaz de fazer enfrentamento à maioria que esteve à frente do país nas duas últimas décadas, uma maioria anticrescimento, uma maioria que nos impôs o silêncio do cemitério, comprometida com a financeirização da riqueza, descomprometida com o desenvolvimento do Brasil”.


 


 


Defesa dos direitos trabalhistas


 


 


O deputado federal Paulinho (PDT-SP) ressaltou em sua as questões que envolvem os direitos trabalhistas e a renda do trabalhador, na qual ele destacou a valorização do salário.


 


 


O ataque aos direitos trabalhistas consignados da Emenda 3, vetada pelo presidente Lula, foi um exemplo da tentativa que os setores que impediram o desenvolvimento do Brasil nos últimos anos fazem para precarizar ainda mais a situação do trabalho no país. “A Emenda 3 tem 4 linhas apenas mas ela acaba completamente com todos os direitos dos trabalhadores, a partir do momento que permite que desde o faxineiro até o diretor da empresa pode ser pessoa jurídica, e o pior, não pode ser fiscalizado”.


 


 


Paulinho falou também sobre a proposta de aumento do funcionalismo público que está em debate, de 1,5% que irá engessar a possibilidade de expansão do setor público, sem o qual não será possível estruturar o Estado para implementar o PAC.


 


 


Estiveram presentes no debate O PAC e o Projeto Nacional de Desenvolvimento, organizado pelo Instituto Maurício Grabois – IMG, o presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, o deputado federal e líder do Bloco de Esquerda na Câmara dos Deputados, Márcio França (PSB-SP) e o presidente do Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo, Murilo Celso de Campos Pinheiro, que sediou o evento. A mediação do debate foi feita pelo presidente em exercício do Comitê Estadual do PCdoB de São Paulo, Nivaldo Santana.



 


 


De São Paulo,
Renata Mielli