Gustavo Petta: o que esperar do 50º Conune

Chegando perto dos 70 anos, a União Nacional dos Estudantes se prepara para seu 50º congresso nacional (o Conune), marcado para 4 a 8 de julho, em Brasília (DF). O encontro marca o fim da gestão do paulista Gustavo Petta, de 25 anos – primeiro estudante a

Em depoimento a Rafael Minoro, do portal EstudanteNet, Gustavo falou a trajetória da UNE e o atual amadurecimento do movimento estudantil. A seu ver, nesses 70 anos, o movimento se aproximou das principais bandeiras de lutas das mulheres, contra a homofobia, pelo direito à livre orientação sexual, da luta anti-racista e pela popularização e democratização da universidade brasileira.


 


Confira a entrevista.


 


Você tem dito, recentemente, que o movimento estudantil e a UNE vivem um momento de reformulação e renovação. O que a entidade tem feito nestes últimos anos?
Nos últimos anos, o movimento estudantil foi além de sua conhecida atuação política e educacional. Ampliamos bastante o trabalho cultural junto aos universitários, através do projeto do Cuca (Circuito Universitário de Cultura e Arte), e, de um tempo pra cá, começamos a participar mais ativamente da agenda de lutas dos movimentos sociais.


 


Nos aproximamos das bandeiras feministas, com a realização de dois encontros de mulheres. Entramos com muita força na luta contra a homofobia e pelo direito à livre orientação sexual com a criação da diretoria de GLBTT da UNE. Organizamos em abril o primeiro encontro de estudantes negros e cotistas, o que reforça a nossa participação na luta anti-racista e pela popularização e democratização da universidade brasileira.


 


Criamos a diretoria de inclusão digital e defendemos a liberdade do conhecimento com o uso do software livre e das licenças Creative Commons. Fomos também os protagonistas pela reativação do Projeto Rondon. Dessa forma passamos a atuar em outras frentes, mais amplas…


 


Hoje, a rede do movimento estudantil está mais articulada. O portal EstudanteNet, por exemplo, nossa principal ferramenta de comunicação, triplicou os acessos nesse último período. Isso e uma prova de que a UNE tem se comunicado melhor com o conjunto dos estudantes.


 


Mesmo em um país como o nosso, de dimensões continentais, com realidades muito distintas, conseguimos ter uma unidade muito grande em torno da defesa da universidade pública, gratuita e de qualidade; da disputa de um projeto nacional de desenvolvimento para o Brasil. Estamos mais próximos, conseguimos ouvir mais as reivindicações.


 


Criamos a Ouvidoria do Estudante, que presta assistência jurídica para questões ligadas a mensalidade e meia-entrada, por exemplo. Dessa forma, mesmo que ainda tenhamos que evoluir bastante, conseguimos manter ligação direta com esses milhares de CA's, DA's, DCE's, UEE's…


 


Faltando poucos meses para o fim da sua gestão, quais são as expectativas para o 50º Congresso da UNE?
As expectativas são as melhores porque este congresso vai comemorar os 70 anos da UNE e também vem consolidar um processo que se iniciou há algum tempo, de mudanças na estrutura dos fóruns de discussão do movimento estudantil, garantido maior participação dos universitários nas decisões sobre os rumos da entidade.


 


Realizamos, em abril de 2006, o 11º Coneb (Conselho Nacional de Entidades de Base) e, em março deste ano, o 55º Coneg (Conselho Nacional de Entidades Gerais), dois encontros que procuraram ser os mais democráticos possíveis na forma de participação dos estudantes.


 


Que mudanças foram essas e o que elas trazem de novidade para o movimento estudantil?
O Coneb aprovou, e o Coneg reafirmou, uma mudança significativa dentro da estrutura da UNE. Os estudantes que vão representar a sua instituição de ensino no Congresso -os delegados com direito a voto – serão escolhidos agora por universidade, por meio de votação direta em urnas, organizada pelos DCE's ou comissões de alunos. Isso altera o antigo processo, de escolha do delegado por curso.


 


Dessa forma, existe mais transparência e representatividade, com uma participação direta do estudante no processo de eleição da diretoria da UNE. Essa mudança também é importante porque muitas universidades acabam fundando os seus DCEs, realizando, com o mesmo processo de votação para o Congresso, a eleição de sua diretoria. Isso organiza e estrutura a rede do movimento estudantil.


 


Como está o andamento do processo eleitoral dos delegados?
Os períodos de inscrição de chapa, da campanha e data da eleição são previamente anunciados no site oficial da UNE, para que todos possam acompanhar e participar. Mais de 300 DCE's e comissões de alunos já realizaram eleições.


 


Se em determinada instituição não existe uma entidade estudantil, os estudantes interessados em participar devem entrar em contato com a Comissão de Credenciamento do Congresso por e-mail. Agora, é importante lembrar que, somente depois de regularizada a formação da comissão, os alunos poderão escolher os delegados.


 


O 50º Congresso vem carregado de simbolismo, por causa das comemorações dos 70 anos da UNE. Como estão os preparativos?
O Congresso vem coroar e dar continuidade às comemorações dos nossos 70 anos, que será encerrada com uma grande festa em 11 de agosto, dia da fundação da UNE. Na gestão passada, demos início ao Projeto Memória do Movimento Estudantil, que está recuperando e recolhendo documentos que estão espalhados pelos país, nas mãos de ex-militantes ou de seus familiares, porque a ditadura queimou, destruiu tudo.


 


Em agosto, vamos lançar o documentário que está sendo produzido pelo cineasta Silvio Tendler. É um filme que conta a história da UNE, com cenas inéditas de congressos e depoimentos de lideranças. Ele já vem pesquisando há algum tempo, registrando os últimos congressos, bienais…


 


O núcleo de cinema do Cuca-Rio também prepara um material inédito. O pessoal fará um vídeo sobre a história do Honestino Guimarães, ex-presidente da UNE em 1971 e que foi vítima da ditadura. O seu corpo está até hoje desaparecido. O Honestino era estudante da Universidade de Brasília, onde vai ser realizado parte dos debates do Congresso.


 


Vamos fazer uma grande homenagem a esse que é um herói nacional e, talvez, seja o principal herói da UNE, um símbolo, uma referência para qualquer militante do movimento estudantil brasileiro.


 


Construímos ainda a Bienal dos 70 anos, realizada no começo do ano no Rio de Janeiro. A UNE nasceu no Rio, é a cidade onde a entidade construiu boa parte de suas principais lutas, resistiu à ditadura, criou o CPC e manteve uma sede referencia para os estudantes, na Praia do Flamengo, 132. Também dentro do calendário das comemorações, retomamos este terreno histórico, a mais ousada das ações do movimento estudantil nos últimos tempos.


 


Recentemente, a UNE esteve à frente de dois grandes protestos. Um contra o aumento da passagem de ônibus e em defesa do passe livre. Outro contra a visita do Bush ao Brasil. Como você avalia essas duas grandes manifestações?
Com certeza foram lutas que marcaram essa gestão. As manifestações contra o Bush repercutiram não só no Brasil mas no mundo inteiro. Recebemos emails de diversos países nos parabenizando pela “calorosa” recepção que o Bush mereceu no Brasil.


 


Foram protestos marcados por indignação e revolta, para mostrar ao presidente americano que ele e sua política assassina não são bem vindos por aqui. Já as manifestações contra o aumento nas passagens e pelo passe livre também tomaram as ruas de todo o país. De certa forma, a UNE acaba tornando-se porta voz da sociedade indignada com a proposta de reajuste das tarifas.


 


Acho que esse é o DNA da UNE. É para isso que a UNE existe. Para fazer mobilização, para organizar protestos, para exigir, para reivindicar, para conquistar – e não só resistir. Conquistar mais direitos para os estudantes, para a juventude, para a população brasileira.