De vítima a ré: a violência sexual contra a criança

Quando o autor da violência sexual  é o agente de poder local, seja econômico, político ou religioso, a vítima é facilmente transformada em ré, pois será culpada da revelação da  violência e por ter ousado querer transformar seu lugar, na mai

Esse é um dos dados apontados no dossiê ''Quando a vítima é Criança ou Adolescente – Combater a Impunidade é garantir a Proteção'' entregue, nesta quarta-feira (16), à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ellen Gracie.



O documento revela que muitos dos pedidos de indiciamento não saíram do papel até hoje, passados quase três anos do fim dos trabalhos da CPMI que investigou casos de exploração sexual juvenil.



Outro dado do dossiê é de que os envolvidos foram indiciados, processados, mas inocentados ou condenados e soltos após habeas corpus. Somente dois dos condenados estão presos. Dos 14 processos abertos a partir das denuncias da CPMI, nenhum foi julgado antes de um ano.



O estudo monitorou 80 casos emblemáticos investigados pela CPMI da Exploração Sexual, que funcionou de 2003 a 2004, e pediu o indiciamento de 250 pessoas em todo o Brasil.



Realidade machista



Os resultados apresentados no dossiê dão conta de uma realidade em que as vítimas são, em sua maioria, do sexo feminino. A  violência sexual é produzida  por  uma  sociedade  machista  e sexista, que reproduz padrões desiguais de poder entre  homens  e  mulheres.  Somente em um caso relatado a vítima é menino.


 


Com relação aos acusados, não há nenhum caso em que mulheres atuem como usuárias de meninos ou meninas. Os  usuários  são  na  sua  totalidade  do  sexo  masculino.  As mulheres  envolvidas  no  crime  atuam  como  agenciadoras, aliciadoras, traficantes  e administradoras de casas de prostituição,  mas a regra é que não figuram como usuárias ou abusadoras.



O documento também faz referência ao poder político dos  acusados. Esse aspecto tem forte influência nos resultados dos processos. Pela  análise  dos  casos,  se  vê  a  diferença  de  resposta  a  partir  do  lugar  de  poder  do autor da violência. Se a violência sexual  é expressão de desigualdade de poder, a resposta da sociedade e do Estado reforça esta desigualdade.



Sem assistência



Sete  anos  após  a  construção  do  Plano  Nacional de Enfrentamento  a  Violência  Sexual   contra  Crianças  e  Adolescentes,  que  determina  a especialização  dos  serviços com  a  criação  de  varas especializadas, em apenas  seis  capitais  estas  foram  criadas. Dos 14  processos,  somente  quatro  tramitam  em  varas especializadas.



O dossiê também aponta para  a  letargia  dos procedimentos  de  Segurança  e  Justiça.  A  análise  demonstra  que  o  Estado  não  tem  dado,  na  maioria  dos  casos,  serviço  de  atendimento e  apoio às  vítimas    durante  o processo  judicial.  11  das  18  vítimas  não  receberam  aplicação  de  medida protetiva e 12 destas não contaram com acompanhamento psicossocial.



Comemorações



O documento, que foi encaminhado pela Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, comemora o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, no dia 18 de maio.



Nesta quinta-feira (17), representantes da frente parlamentar e de entidades de defesa da infância entregam o dossiê aos ministros da Justiça, Tarso Genro, e do Turismo, Marta Suplicy.



No mesmo dia, ainda como parte das atividades da semana do 18 de maio, cerca de 600 crianças e adolescentes participaram de atividades em frente ao Congresso Nacional e aos ministérios. Também estão previstos shows com grupos musicais formados por adolescentes, e do cantor de forró e integrante da frente parlamentar, deputado Frank Aguiar (PTB-SP).



De Brasília
Márcia Xavier