As mulheres eleitas na história da Assembléia Legislativa do RS

A edição deste domingo do jornal Correio do Povo publicou interessante matéria sobre a participação das mulheres na política, com enfase para a presença feminina na Assembleia Legislativa ao longo dos 172 anos da casa.

A reportagem assinada pela jornalista Priscilla Casagrande levantou que, em quase dois séculos de existência do parlamento gaúcho, apenas 21 mulheres conquistaram mandato. A ex-deputada comunista, Jussara Cony, mereceu destaque por ter sido a única mulher a exercer quatro mandatos na casa, ou seja, 16 anos como parlamentar.


Veja a íntegra da matéria:


 



Só 21 foram eleitas em 172 anos


Por Priscilla Casagrande


 


Dos 1.260 parlamentares eleitos em 172 anos à Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, somente 21 mulheres conquistaram mandato. A participação limitada expõe os contrastes de um Estado que se mostra politizado e, ao mesmo tempo, representa o mais conservador do Brasil. A comparação foi feita, neste sábado, pela professora da Ufrgs e cientista política Céli Pinto.


 


Na avaliação de Céli, além de conservadora, a política estadual é historicamente machista. A posição da mulher na vida pública e político-partidária, segundo ela, começou a apresentar mudanças com o surgimento de movimentos feministas e o conseqüente ingresso das mulheres no mercado de trabalho. As transformações na esfera política, porém, ocorreram lentamente.


 


A primeira presença feminina no parlamento gaúcho ocorreu em 1950, quando Suely de Oliveira se elegeu deputada estadual pelo PTB. Anos depois, em 1994, a jornalista Maria do Carmo, do então PPB, atingiu expressiva votação, conquistando 209.833 votos.


 


Mesmo com pequena representação na Assembléia Legislativa, atualmente, o número de mulheres dobrou se comparado à eleição de 2002, quando apenas duas candidatas foram eleitas: Jussara Cony , do PC do B, e Floriza dos Santos, do PDT. Em 2006, o número passou para cinco. As deputadas que compõem o parlamento são Stela Farias e Marisa Formolo, do PT, Silvana Covatti, do PP, Kelly Moraes, do PTB, e Zilá Breitenbach, do PSDB.


 


No cenário nacional, a quantidade de mulheres que conquistaram espaço na Câmara dos Deputados não se ampliou de forma expressiva em relação às eleições de 2002. O índice da presença feminina aumentou de 8,19% para 8,97%, passando de 42 para 45 os mandatos exercidos pelas mulheres. Conforme o Tribunal Superior Eleitoral, das 2.498 candidatas que disputaram em todo o país, em 2006, foram eleitas apenas 176, sendo três governadoras, quatro senadoras, 45 deputadas federais e 123 estaduais. O TSE identificou ainda que a região Norte se destaca na escolha feminina pelos eleitores, com 20% de mulheres como legisladoras estaduais, seguida da Centro-Oeste, com 9,76%; Sudeste, com 8,94%; Nordeste, 5,96%; e a região Sul, com 5,19%.


 


O sistema de cotas no país para candidaturas destina 30% da nominata partidária às mulheres. Na Câmara, deputados articulam a reforma política, que poderá ampliar a participação feminina por meio de resoluções.



 


Na Assembléia



1950 – Suely de Oliveira
1964 – Iris Pothoff
1966 – Therezinha Irigaray e Zaira Folly
1974 – Dalila Alves
1975 – Dercy Furtado
1983 – Éclea Fernandes
1986 – Hilda de Souza
1990 – Jussara Cony e Regina Rossignolo
1994 – Maria do Carmo, Maria Augusta Feldmann e Jussara Cony
1998 – Cecília Hipólito, Luciana Genro, Maria do Rosário, Maria do Carmo e Jussara Cony 
2002 – Floriza dos Santos e Jussara Cony 
2006 – Kelly Moraes, Marisa Formolo, Stela Farias, Silvana Covatti e Zilá Breitenbach.


 



Década de 20 abriu espaço às mulheres


 


A participação feminina na política do país iniciou nas primeiras décadas do século XX. Em 1929, o Brasil elegeu a primeira mulher: Alzira Soriano, à Prefeitura de Lages, no Rio Grande do Norte. O estado também foi pioneiro ao conceder à mulher o direito ao voto, em 1927, antecipando-se ao decreto do ex-presidente Getúlio Vargas, em 1932. No legislativo nacional, a primeira deputada federal foi Carlota Pereira de Queiróz, em 1934. No Senado, Marluce Pinto, do PMDB de Roraima, abriu a vaga às mulheres, em 1990. A gaúcha Emília Fernandes, em 1994, elegeu-se pelo PTB como a primeira senadora do Estado.


 


 


Deputada Jussara Cony obteve 4 mandatos


 


 



Jussara Cony, do PC do B, foi a mulher que teve mais mandatos na Assembléia Legislativa. No total, sua passagem pelo parlamento gaúcho durou 16 anos. Eleita pela primeira vez em 1990, Jussara afirmou que a oportunidade de exercer quatro legislaturas reflete a confiança do eleitorado. 'Depositar o voto numa mulher comunista e feminista é o significado de que muitas barreiras foram vencidas', salientou.
Segundo Jussara, a presença feminina na política resultou de um processo de emancipação da mulher. Destacou ainda que a reforma política será decisiva para a participação democrática e efetiva. Aos 64 anos, Jussara tem cinco filhos e 18 netos. 'Minha família representa meu elo mais forte com a política', ressaltou a parlamentar.


 


 



Estudo apura ranking mundial


 


 


O Brasil ficou abaixo da média mundial na composição da Câmara dos Deputados por mulheres, ocupando o 107º lugar em um ranking divulgado pela Inter-Parliamentary Union (IPU). A organização internacional incentiva à cooperação entre Câmaras nacionais de mais de 187 países.


 


Ruanda aparece em primeiro lugar, com 48,8% de participação feminina na Câmara dos Deputados. Na seqüência, estão os países do Norte da Europa: Suécia, Noruega, Finlância, Dinamarca e Holanda. Na América do Sul, o Brasil é o pior colocado da lista, em 107º lugar, atrás da Argentina (9º), Guiana (17º), Suriname (26º), Peru (55º), Venezuela (59º), Bolívia (63º), Equador (66º), Chile (70º), Colômbia (86º), Uruguai (92º) e Paraguai (99º). A Inter-Parliamentary Union avaliou que a melhora no desempenho de alguns países sul-americanos deve ser atribuída à introdução de políticas de cotas para candidaturas femininas.


 


O Brasil assim como os Estados Unidos ficaram abaixo da média mundial de 16,6% de mulheres na composição da Câmara, respectivamente com 8,6% de brasileiras e 15,2% de norte-americanas. O índice do Brasil é pouco maior que o dos países árabes, que têm média de 6,8% de mulheres no parlamento. A IPU destacou que as mulheres ocupam mais de 30% das cadeiras em 20 Câmaras de Deputados no mundo, porém o relatório reconheceu que falta muito para atingir o patamar de, no mínimo, 30% de legisladoras em todos os parlamentos nacionais.


 



Países
1º Ruanda – 48,8%
2º Suécia – 47,3%
3º Finlândia – 42%
4º Costa Rica – 38,6%
5º Noruega – 37,9%
6° Dinamarca – 36,9%
7º Holanda – 36,7%
8º Cuba e Espanha – 36%
9º Argentina – 35%
10º Moçambique – 34,8%
11º Bélgica – 34,7%
12º Islândia – 33,%
13º África do Sul – 32,8%
14º Áustria e Nova Zelândia – 32%
16º Alemanha – 31,6%
 


 


 


Formação política é pequena, afirma Céli


 



A cientista política Céli Pinto afirmou que as mulheres nunca receberam formação para debater o poder público. 'Elas sempre foram responsáveis pela vida familiar', disse. Para a cientista, o poder político é o último reduto masculino, seja de esquerda, seja de direita. Avaliou que mesmo a política de cotas não garante a expressão em números das mulheres, porque alguns partidos colocam-nas apenas para preencherem vagas. 'Não discuto quem é bom ou ruim, se são os homens ou as mulheres. Todos defendem suas causas, mas a relação ainda é preconceituosa, paternalista e hierárquica', destacou Céli.


 


 


Irigaray recebeu 51 mil votos


 


 



Therezinha Irigaray foi eleita deputada estadual em 1966, com 51.462 votos pelo então MDB, assumindo o cargo em 1967 na Assembléia Legislativa gaúcha. Na época, casada com o ex-prefeito de Porto Alegre Sereno Chaise, a ex-deputada avaliou que sua expressiva eleição representou uma forma de revanche à ditadura. Em 1964, o regime militar cassou o mandato de Sereno. 'Os votos categoricamente foram resposta ao sistema imposto, mostraram o desagrado com a política vigente', relembrou Therezinha.


 



Para a ex-deputada, a mulher naquela época participava inexpressivamente da política. 'Joguei apenas o primeiro tempo da partida, fiz alguns projetos, consegui contatos, mas acabei cassada em 1969, com o Ato Institucional nO 5', salientou. A ex-parlamentar lembrou ainda que, nesses 40 anos, desde que assumiu como deputada, a presença feminina não aumentou de forma substancial. 'Há quatro décadas eram duas deputadas, hoje não passam de cinco, o que considero muito pouco. Nossa evolução é extremamente lenta', destacou.


 


Para Therezinha, a presença feminina não era bem-vinda nos partidos. Segundo ela, as mulheres, apesar de um número ainda pequeno na política, têm opinião formada, trabalham, estudam e participam das inúmeras questões fundamentais ao país. 'Ganhamos espaço e respeito nesse setor, derrubando aos poucos os entraves que afastam as mulheres da política', salientou.


 


Da redação RS