China, crescimento e (des)harmonia vistos pela ´Folha`

Por Bernardo Joffily


O jornal Folha de S.Paulo deixou-se intrigar pelo enigma chinês e despachou para Pequim a sua editora de Mundo, Claudia Antunes. A primeira reportagem promete uma série controversa: Novo-rico chinês é

Veja o infograma ao lado. Não mudamos a ordem dos gráficos, pois a passagem dos números mais expressivos para o pé da informação não é o bastante para quebrar o seu impacto.



PIB e renda per capita: recordes mundiais



Claudia Antunes nos revela que o país de Deng Xiaoping em 27 anos multiplicou 12,18 vezes o seu Produto Interno Bruto (PIB). Uma matéria investigativa poderia pesquisar se algum país, em algum momento de sua história, realizou tamanha proeza. Pesquisei a Inglaterra da Revolução Industrial do século 19, os Estados Unidos e a Alemanha dos ''anos dourados'' (décadas de 50 e 60''), o Japão e a Coréia do Sul dos ''milagres'' de seus respectivos pós-guerra: nenhum deles chegou perto de ter 27 anos assim.



O último dado, sobre a renda per capita, é ainda mais impactante. As longas fases de prosperidade geralmente vêm acompanhadas por booms no crescimento populacional, o que atenua o crescimento per capita. No caso da China, uma política demográfica que estimula famílias com um só filho (a jornalista toca no tema, de passagem, sem relacioná-lo com a renda). O resultado foi a inédita decuplicação da renda per capita chinesa em apenas 27 anos.


 


Outro número assombroso mostra o crescimento do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) da população chinesa, de 0,560 em 1980 para 0,768 em 2007. A China de 27 anos atrás tinha um IDH um pouco mais baixo que o de Botswana e um pouco acima do Paquistão atuais. Já a China atual fica abaixo da Ucrânia e do Líbano e acima do Peru e do Equador. Em 27 anos, o país passou do 132º lugar para o 81º, outra proeza sem precedentes, apesar do muito que ainda falta por avançar.



O preocupante índice de Gini



O centro da reportagem de Claudia Antiunes é o índice de Gini, que mede a desigualdade na distribuição de renda, e em 27 anos passou de tranqüilizadores 0,30 para preocupantes 0,47 (1,00 é igual à desigualdade absoluta; 0,0 à igualdade absoluta).  O Gini chinês é hoje igual ao dos Estados Unidos, que por sua vez são uma das sociedades mais desiguais do capitalismo, se não levarmos em conta aberrações como o Brasil (0,567) ou o México (0,546). Este é o nó da campanha em busca de ''uma sociedade harmoniosa'', que a China, como reconhecem os chineses, está longe de ser.



O dado sobre população rural também é interessante. Aponta que a imensa massa camponesa da China, 741 milhões, segundo o infograma da Folha, há não é a maior do mundo em números absolutos. Foi suplantada pela da Índia, com 770 milhões no campo, apesar de ambos os países virem de fortes processos de urbanização. Em 1980 a realidade era outra: os 800 milhões de chineses residindo no campo suplantavam a totalidade da população indiana, de 684 milhões.



A sociedade harmoniosa segundo um ministro chinês



Em outra matéria, no pé da página seguinte, Claudia transcreve o que ouviu do  ministro Cai Wu, do Escritório de Informações do Conselho de Estado, falando a jornalistas latino-americanos. Sob o intertítulo Neoliberalismo, Cai Wu dá uma definição de ''sociedade harmoniosa'' aos olhos da atual campanha chinesa:




''Uma sociedade harmoniosa, segundo nossos critérios, é justa, democrática, dinâmica, vive sob o império da lei e em harmonia com a natureza. Ainda não somos uma sociedade harmoniosa, é um objetivo. Nosso objetivo é que todos os chineses possam gozar de uma vida mais próspera. Essa é a diferença entre a China e o neoliberalismo praticado pelos países latino-americanos, que alcançaram algum progresso econômico e abriram suas economias, mas sofreram polarização social, má distribuição da renda e sacrifício da soberania econômica.''



Fonte: Folha de S.Paulo