Controle inteligente de tráfego da capital é reprovado

Sistema comprado em 2000 por R$ 32 milhões e administrado pela BHTrans, para acabar com engarrafamentos na capital, está desatualizado e não é ligado nos horários de pico.

    Defasado, subaproveitado e, nas horas mais caóticas, inoperante. As críticas de funcionários da BHTrans, motoristas e especialistas pesam sobre o Sistema de Controle Inteligente do Tráfego (CIT). Pouco mais de um ano depois de sua implantação nas principais vias das regiões mais movimentadas de Belo Horizonte, a tecnologia, anunciada como uma medida eficiente contra congestionamentos, é condenada até mesmo por técnicos da empresa que gerencia o trânsito na capital e virou alvo de um verdadeiro bombardeio da população.


 


    O sistema foi adquirido por meio de um contrato firmado no fim de 2000, entre o Banco Internacional para Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD), Prefeitura de BH e Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU). Só o banco e a União investiram R$ 32 milhões, em valores atuais, fora o montante empregado pelo governo municipal em obras viárias, operação e manutenção do CIT.


 


    Mas a realidade das ruas e avenidas, principalmente nas horas de maior movimento, deixa clara a desigual relação custo-benefício. O auditor Gustavo Pasa, de 41 anos, atravessa diariamente o cruzamento da Rua Pernambuco com a Avenida Carandaí, na região hospitalar, e lembra das promessas do projeto, propagandeado como ideal para desafogar o tráfego na cidade.


 


     “Não passou de ilusão. O trânsito aqui é horrível. Até eu chegar à Avenida dos Andradas, um sinal abre e o seguinte fecha. E o sincronismo?”, pergunta. Segundo um funcionário da BHTrans que teve acesso a informações estratégicas e prefere não se identificar, é alto o estresse da equipe incumbida de municiar o software com informações. “O CIT está ultrapassado, se comparado ao que pode oferecer. Não investimos em alternativas complementares, modernizações do programa ou capacitação dos técnicos. Acreditávamos que a máquina resolveria tudo”, afirma.


 


    Desde que foi comprado, o sistema não passou por modernização tecnológica e, nos horários de pico, não é ligado para coletar dados em tempo real, como o técnico diz que deveria ser. Entre os pontos críticos, principalmente das 17h às 19h, estão a Savassi, as vias de acesso à região hospitalar e as que desembocam no Palácio das Artes, na área da Praça ABC e na Avenida Francisco Sales, bem como na Avenida Bias Fortes, perto do Palácio da Liberdade.


 


    Um problema também destacado é a dificuldade imposta à equipe responsável por acompanhar o andamento do tráfego na central da BHTrans, pelas câmeras do circuito de TV. “Muitas vezes, as televisões estão funcionando, mas os equipamentos travam. Em outras ocasiões, detectamos o engarrafamento pelas imagens e tentamos fazer alguma mudança no ciclo dos sinais, mas se o CIT é inteligente, por que ele mesmo não dá uma resposta?”, questiona.


 


    Uma das causas apontadas pelo técnico é o fato de o sistema ter vindo da Espanha e não ter sido corretamente adaptado às particularidades de BH. No fim do dia, quando uma das faixas de uma via quase se transforma em ponto de ônibus, o CIT entende que o fluxo de carros é menor naquele momento e dá menos tempo de sinal verde para o cruzamento daquele local. Assim, ele cria um congestionamento, se não estiver muito bem regulado, e cabe à equipe identificar a falha e fazer a correção o mais rápido possível. Caso contrário, o caos se instala.


 


    Para funcionários, se não for feita uma atualização o quanto antes, o trabalho de ajuste dos dados, feito pelo homem e mais suscetível a erros, não terá fim. Há, ainda, o risco de o sistema se tornar totalmente obsoleto. Diferentemente do Rio de Janeiro, onde o controle funciona bem quando há anomalia no trânsito, como acidente grave ou passeata, o CIT também apresenta dificuldades para se adaptar aos imprevistos.


 


    O professor da UFMG e especialista em transporte Ronaldo Gouvêa credita a ineficiência do CIT à raiz dos problemas de trânsito na capital. “A BHTrans não investe em medidas de planejamento viário para esgotar as possibilidades do sistema”, diz. Para ele, mais importante que duplicar a Avenida Antônio Carlos seria completar o Anel Rodoviário. “E se os congestionamentos continuam e o sistema precisa ser melhorado, ele não está adequado às necessidades reais da cidade”, acrescenta.


 


    De acordo com o especialista na área e professor da PUC Minas João Ernani Costa, programas como o CIT conseguem solucionar, no máximo, entre 20% e 30% dos problemas de circulação de veículos. Nos anos 1990, a economia quase não cresceu e o aumento populacional foi de 2,2% ao ano. “Em contrapartida, a frota subiu 4,7% ao ano e o número de deslocamentos aumentou assustadoramente. O sistema não faz milagre. Temos que investir no metrô urgentemente. Se isso não ocorrer, o gasto com combustível, a poluição, os acidentes e o tempo das viagens só vão crescer”, afirma.


 


Fonte; Jornal Estado de Minas