Orlando Silva: PAN é uma oportunidade para o Brasil

Em entrevista exclusiva ao Vermelho, o ministro do Esporte Orlando Silva Jr. avalia as boas perspectivas e o importante legado que ficará para o Rio de Janeiro e para o Brasil da experiência de ser sede dos jogos Pan-americanos, que se re

Para o ministro do Esporte Orlando Silva, os Jogos Pan-americanos são “uma bela oportunidade de investimento para o desenvolvimento econômico, social e esportivo, e a afirmação de uma política internacional que tem como foco importante a aproximação do nosso hemisfério”. No entanto, existe uma campanha na mídia para desqualificá-lo: “Há uma certa confusão quando se fala dos números. Atribui-se a gastos do PAN uma série de investimentos que são feitos para a qualificação da cidade do Rio de Janeiro e para um aperfeiçoamento do serviço público”.


 


O ministro chega a questionar o papel que alguns segmentos da imprensa brasileira estão cumprindo: “Te digo de antemão que há uma série de exageros na abordagem e na crítica que é feita por parte da imprensa, sobretudo da escrita. Eu observo uma visão um pouco parcial e unilateral, que desconsidera os legados gerados com a adequação dos jogos Pan-americanos”.


 


Leia a seguir a entrevista:


 


Vermelho – Ministro, qual é o maior legado dos Jogos Pan-americanos para o país?


 


Orlando Silva – O PAN é o segundo maior evento multiesportivo do mundo. São 42 países no Brasil, 5.500 atletas, 44 modalidades, 28 olímpicas e seis não olímpicas. O PAN é a oportunidade do Brasil mostrar sua capacidade para sediar um evento dessa magnitude. O PAN colocou o esporte na agenda nacional. E seguramente vai motivar a população a ter atividades físicas, melhorar a qualidade de vida, as potencialidades do esporte como fator de produção de saúde, interesse social, vão aparecer com mais força.


 


O PAN gerou possibilidades de emprego e renda para milhares de trabalhadores que intervieram nas obras de estrutura. O PAN permitirá uma mudança importante na face do Rio, sobretudo em temas sensíveis como segurança pública. O PAN é a oportunidade para o Brasil de ser promovido internacionalmente, de aproximarmos nosso continente. O presidente Lula tem interesses grandes na integração do Brasil com as Américas, principalmente na América Latina. O PAN é uma bela oportunidade de investimento para o desenvolvimento econômico, social e esportivo, e a afirmação de uma política internacional que tem como foco importante a aproximação do nosso hemisfério.


 


Vermelho – O orçamento do PAN é confuso. A previsão inicial dos gastos dos cofres governamentais era de R$ 532 milhões e agora parece chegar na casa dos R$ 3 bilhões, sendo paraticamente metade gasto do Governo Federal. Existem muitas críticas e muitos dados divulgados na imprensa que não convergem. Como o senhor avalia esse processo de organização do PAN no país?


 


Orlando Silva – Há uma certa confusão quando se fala dos números dos jogos Pan-americanos. Atribui-se a gastos com o PAN uma série de investimentos que são feitos para a qualificação da cidade do Rio de Janeiro para um aperfeiçoamento do serviço público. Exemplo: considerando a reforma do aeroporto Santos Dumont, que tá listado como investimentos feitos no Rio para qualificação da cidade para o PAN, ser um gasto do PAN é um certo exagero. Considerar que 500 milhões de reais, você investir em segurança pública no Rio de Janeiro é gasto com o PAN é exagero, porque todas viaturas, os armamentos, o sistema de rádio comunicação e de qualificação da inteligência das forças de segurança no Rio de Janeiro. Tudo acumulado fica para o Rio. E não só para os moradores, mas também para que a cidade e seus visitantes. O Rio é um portal de entrada do Brasil para todos os visitantes estrangeiros.


 


A Vila do PAN recebeu financiamento de 189 milhões da Caixa, o que quer dizer que os recursos vão voltar aos cofres da Caixa na medida em que o financiamento seja pago. Então, quando se fala em 1,8 milhão de Reais gastos pelo Governo Federal com o PAN fala-se de temas que incluem assuntos que ou são recursos que retornarão aos Tesouro ou investimentos que qualificarão a cidade do Rio de Janeiro para além dos Jogos Pan-americanos.


 


Além disso, se inclui patrocínios de empresas estatais, como a Caixa, Petrobras, cujo recurso é majoritariamente para compara de mídia que vão dar visibilidade das marcas das empresas que são patrocinadoras dos Jogos Pan-americanos. Se ativa o patrocínio comparando mídia.


 


Depois do PAN devemos fazer uma avaliação bem pormenorizada de todos os investimentos que foram feitos, todos resultados que foram alcançados e teremos a oportunidade de fazer um detalhamento maior dos números do PAN. Mas eu te digo, de antemão, que há uma série de exageros na abordagem e na crítica que é feita por parte da imprensa, sobretudo da escrita. Eu observo uma visão um pouco parcial e unilateral, que desconsidera os legados gerados com a adequação dos jogos PAN.


 


Outro assunto que tem motivado muita preocupação não só da imprensa, mas nossa, do TCU, que tem acompanhado em tempo real todos os procedimentos para o PAN, diz respeito ao cronograma da execução de obras e serviços. Porque no PAN, tão importante quanto você ter os ginásios, as piscinas, as pistas, a Vila Pan-americana, é importante você ter serviços qualificados de restaurantes, de hotelaria, de telecomunicações, tecnologia…


 


Vermelho – Existe grande preocupação com relação aos parazos das obras. Houve muito atraso na realização das licitações e ainda existem vários locais de provas sendo terminados.


 


Orlando Silva – Nós temos que ter um trabalho de infra-estrutura e de serviços muito competente. Seguramente, o fato de o PAN ser uma obra de muitas mãos, que envolve a Prefeitura municipal, o Governo do estado, Federal e o Comitê Olímpico Brasileiro, isso tem um impacto no ritmo. Porque há uma série de convênios, de contratos, a legislação brasileira de licitações é bastante rigorosa, que define o ritmo de contratações dessas obras de infra-estrutura. Então, são uma série de fatores que vão desde a complexidade do arranjo institucional que organiza uma competição até as normas que o Brasil possui, que são muito rigorosas, que acabaram impactando no cronograma da entrega das instalações esportivas.


 


O que eu percebo é que aproximadamente um mês antes da realização dos jogos, portanto em semanas, estarão prontas instalações de excelente qualidade, com padrão olímpico. O que vai garantir não só o sucesso do PAN, mas também vai permitir a atração de eventos internacionais para o Brasil.


 


Na última sexta-feira, aprovamos que o Brasil será a sede dos Jogos Mundiais Militares em 2011. Qual foi o nosso argumento que bateu a Turquia? Que nós já tínhamos instalações disponíveis pela realização dos jogos.


 


O sexto PAN não vai só repercutir na valorização do esporte nacional, na motivação da população para a atividade física, no esporte como um motivador de uma outra atitude da nossa juventude, mas, sobretudo, vai ficar mais claro que o esporte pode ser um fator de incremento do desenvolvimento econômico. Porque cada grande evento internacional, como o mundial de judô que nós traremos para o Rio de Janeiro este ano, expõe o Brasil no mundo, atrai visitantes, gera emprego na produção, na organização e na realização destes eventos. Então eu vejo o PAN como uma grande oportunidade.


 


Vermelho – A realização dos jogos acontecerá simultaneamente em vários locais diferentes e opostos da cidade. Alguns, inclusive, com transporte público bastante limitado no dia a dia. Sem a realização de um evento deste porte, o Rio já sofre com grandes congestionamentos. Como viabilizar a circulação dos cariocas e visitantes neste período?


 


Orlando Silva – Eu tenho dificuldades para falar sobre o transporte porque são atribuição primeiro da prefeitura, que é quem responde sobre esse serviço. Mas eu percebo que a cidade tem problemas na área de transporte e de infra-estrutura viária que não são peculiaridades do Rio. Mas como é uma cidade muito grande, muito complexa, merece mais atenção.


 


Do ponto de vista da organização dos jogos, não haverá qualquer tipo de problema. Até porque haverá  uma via expressa exclusiva para transportar as delegações dos locais de alojamento para o local de competição.


 


O que precisa ser feito, e isso é o que a prefeitura vai ter que enfrentar, é o plano de tráfego que dê conforto à população do Rio e aos visitantes que vão assistir as competições. Eu acredito que a prefeitura, que tem tido empenho grande na organização dos jogos, deve estar muito atenta a esta matéria porque isso está relacionado ao conforto daqueles que vão assistir aos jogos. E tem impacto no clima mesmo da realização da competição.


 


Eu espero que o transporte de massa, coletivo, o metrô e o trem seja estimulado. E acredito que a população seja até orientada a valorizar o transporte coletivo. Menos tráfego na rua ajuda a facilitar. Agora vai haver uma pressão menor por causa das férias escolares. Isso vai diminuir um pouco a pressão. E aposto que essas e outras medidas devem ser tomadas pela prefeitura e pelo estado para desobstruir as vias de acesso no Rio de Janeiro.


 


Vermelho – Outra questão que não está relacionada diretamente ao Ministério mas que tem sido bastante especulada pela imprensa é uma grande preocupação com a segurança. A situação no Rio é complicada e tem grande repercussão na mídia. O senhor acha que as medidas que estão sendo tomadas são suficientes?


 


Orlando Silva – Existe no Ministério da Justiça uma Secretaria Nacional de Segurança Pública. É o Ministério da Justiça que está coordenando toda a preparação do plano de segurança. Pode-se dizer que é um trabalho excelente, uma cooperação absoluta entre a União, Estado e municípios do Rio de Janeiro. Desde a guarda municipal à Polícia Federal.


 


Nós temos um trabalho de inteligência muito forte que nos permite certo conforto no que diz respeito ao que está sendo projetado para a segurança do Pan-americano. Evidentemente que o Rio é uma cidade que, como outras no Brasil, tem muitas contradições. O Rio ainda tem uma situação peculiar. Essa noção de centro e de periferia no Rio é relativizada. Você tem uma zona sul que é uma zona de nível social e econômico mais desenvolvido e encravado na zona sul uma série de áreas de conflitos social muito intenso.


 


O que tem sido feito é um trabalho de anos coordenado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), que envolve modernização de armamento, modernização de meios de transporte e de comunicação e envolve um trabalho de planejamento de inteligência muito forte e um trabalho de sensibilização da comunidade local muito forte, e a partir daí nós apostamos que teremos um trabalho de segurança mais consistente.


 


Não dá para imaginar fazer no Rio o que foi feito no Eco Rio em 92, por exemplo, onde você tinha uma reunião de cúpula de chefes de Estado que acontecia no Aterro do Flamengo, os chefes de Estados quase todos eles hospedados na zona sul – Copacabana, Leblon, Ipanema – e que você criava uma via de acesso, concentrava e as comitivas se deslocavam. Estamos falando de 5.500 atletas, perto de 10.000 militantes participantes diretos do PAN. Estou falando de jovens e não de comitivas, que vão andar em comboios durante todo tempo. Seguramente há que se ter um trabalho de segurança espalhado na cidade do Rio de Janeiro, de modo que nós possamos passar pelo PAN sem qualquer tipo de incidente.


 


Vermelho – Outra questão que preocupa os movimentos sociais no Rio diz respeito às remoções de comunidades de áreas que estão no entorno de locais onde haverão provas. Como o senhor vê essa intervenção?


 


Orlando Silva – O Rio, como outras cidades do Brasil, tem um problema grave que é um déficit habitacional. As pessoas nem sempre moram no lugar que queriam. Mora nos lugares às vezes em ocupação irregular. Mora nos lugares que estão colocados diante delas. Então esse é um problema que não é do carioca, é um problema do Brasil.


 


No caso do Pan-americano existe um ponto que é próximo à Vila Pan-americana, que tem um córrego chamado Córrego Anil, que tem uma série de famílias que estão ocupando irregularmente aquela determinada área. É uma área inóspita, uma área terrível para se viver. Aquele córrego é desaguadouro de todo o sistema de esgoto da Cidade de Deus e não é um tratamento de afluentes, então é uma área muito ruim e que não é digna para se viver uma pessoa.


 


Na verdade, a construção da Vila Pan-americana ali próxima criou uma oportunidade de se remover 200 famílias que ocupam aquela região. Essa missão é da Prefeitura, que assinou um contrato com a Caixa Federal um financiamento e assinou o compromisso de remover aquela comunidade. A Prefeitura nos argumentou que não tinha orçamento para isso, mas o Ministério dos Esportes disponibilizou recursos para a remoção daquela comunidade no espelho colocado pela a Prefeitura.


 


Ocorre que mesmo nós do Ministério dos Esportes não estamos de acordo com o procedimento de indenizar e retirar dali aquelas famílias. Nós sabemos como é que acontece no Brasil. Você fazer uma mera indenização para uma família que tem inúmeras necessidades e não assentar aquelas famílias numa outra área vai projetar um problema que existe ali, para outra região da cidade. Às vezes até agravando aquele problema habitacional.


 


Então o que nós temos feito junto à Prefeitura são recomendações para que eles se inspirem na política habitacional do Governo Federal. Aí sim o Ministério das Cidades e Caixa Econômica Federal, que desenvolvem as iniciativas de habitação popular, poderiam ser um  suporte.


 


Nossa convicção é que deve haver um reassentamento das pessoas, não uma mera remoção. Apesar de reconhecer que aquele lugar é um lugar onde não se deveria viver gente porque pelas condições existentes, são condições subumanas.


 


Vermelho – Você já é o segundo comunista à frente do Ministério dos Esportes. Muitos projetos foram iniciados dando origem a uma nova política pública para o setor. Como avalia o trabalho realizado até o momento?


 


Orlando Silva – O nosso trabalho é de primeiro momento um trabalho de continuidade. A avaliação que nós temos da liderança do Agnelo Queiroz no Ministério dos Esportes é muito positiva. Não é uma avaliação minha pessoal, é uma avaliação do Partido Comunista do Brasil, é uma avaliação do presidente da República, que em vários momentos, manifestou para mim e para direção do Partido, mesmo publicamente, o apreço ao trabalho que foi desenvolvido. Isso significa que foi uma trajetória constituída pelo Ministério que afirmou o esporte como política nacional, desenvolvendo programas sociais esportivos como o Segundo Tempo e o Esporte das Cidades.


 


A visão que nós desenvolvemos aqui desde 2003, de não contradizer esporte competitivo e esporte criativo, tem que ser preservada. Por isso que é importante manter programas sociais, como é importante manter apoio ao esporte competitivo, como é importante manter investimentos em infra-estrutura esportiva, investimentos para atrair grandes eventos esportivos internacionais para o Brasil.


 


Em um primeiro plano, nós temos a missão de dar seqüência ao trabalho, procurando qualifica-lo porque diferentemente de antes, quando praticamente inauguramos políticas públicas de esportes no Brasil, agora nós temos como olhar para trás e avaliar criteriosamente a eficácia, a eficiência e efetividade dessas políticas. E além da visão crítica do que foi feito até aqui, podemos qualificar mais as iniciativas do Ministério dos Esportes. Isso é uma oportunidade que nós temos hoje e não tínhamos antes quando partimos do zero.


 


Eu acredito que o esporte brasileiro tem alguns desafios chaves a enfrentar: Um primeiro diz respeito a estruturar o Sistema Nacional do Esporte. Hoje no Brasil não tem claro quem faz o que. O estado, o município, a União, o papel que tem o setor privado, Universidades, os conselhos profissionais. A lei do esporte hoje não aborda a responsabilidade desses setores. Então, o primeiro desafio nosso é modernizar a legislação esportiva brasileira instituindo um Sistema Nacional do Esporte de modo que possamos operar políticas através desse sistema com vistas a alcançar o nosso objetivo, que é democratizar o acesso ao esporte e ao lazer. Esse é um desafio importante. Nós temos feito um diálogo muito positivo no Congresso Nacional e a expectativa é que haja resultado em curto parazo.


 


A segunda questão chave diz respeito a investimentos em infra-estrutura. O Brasil tem uma carência, um déficit muito forte em infra-estrutura esportiva. Então nós temos que ter as cidades de médio porte, as cidades pequenas, as cidades grandes, com instalações adequadas para a prática esportiva.


 


Uma terceira questão diz respeito à capacitação de recursos humanos. O esporte como objeto de política publica é um tema novo e mesmo a atividade regulamentada do profissional de educação física é um tema novo. O desafio nosso é estruturar o sistema de capacitação de recursos humanos de modo que tenhamos profissionais capazes de orientar bem a atividade física.


 


Eu diria que tudo isso vai se viabilizar com maior eficácia se nós tivermos capacidade maior ou menor de ampliar o financiamento. Hoje, no Brasil, você tem em nível de Governo que é a principal financiadora do esporte. Nosso objetivo é atrair o sistema privado. Para isso há a lei de incentivos ao esporte aprovada no final do ano passado, um grande instrumento. E a nossa expectativa é diversificar e ampliar essa fonte de financiamento para o esporte brasileiro. Esse seria um quarto desafio chave.


 


Por fim, eu acredito que é preciso mudar a matriz de desenvolvimento de esporte brasileiro. Hoje é o sistema de clube, o sistema clubístico. É ali que se forma atleta, é ali que é a recreação. Então, nossa perspectiva é fazer da escola o lugar do primeiro contato no sentido lúdico, do jogo da brincadeira para criança aprender a jogar, aprender a brincar, aprender através do esporte numa primeira fase e permitir que através da escola possamos iniciar crianças e jovens em modalidades para aqueles que queiram se desenvolver no esporte, se aperfeiçoando em cada uma das modalidades.


 


Eu aposto que vincular esporte e escola é bom porque nós criamos o hábito desde cedo e é um modelo também para a identificação e desenvolvimento de talentos, que é o que acontece nos países que são potências esportivas. A escola é a base do sistema esportivo. É importante porque a escola pública é acessível a todos praticamente. É um equipamento público acessível a todos. Ali é uma boa porta de entrada para que a gente construa um novo futuro a partir do esporte.


 


* Colaborou Álvaro Portugal.