Liduíno Pitombeira pela Osesp

Uma peça inédita do compositor cearense Liduíno Pitombeira será executada em julho pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp)

Mariinha, peça de aproximadamente 12 minutos escrita para orquestra e coro, foi composta por Liduíno a partir de poemas de Alan Mendonça, jovem dramaturgo, poeta e compositor popular de Fortaleza. A peça será apresentada nos dias 5 e 6 de julho, na Sala São Paulo, espaço oficial da Osesp na capital paulista, e em 7 de julho na programação do Festival de Música de Campos do Jordão. É a celebração de um trabalho iniciado no ano passado, quando Liduíno, de volta a Fortaleza após oito anos vivendo nos Estados Unidos, recebeu uma encomenda da orquestra internacionalmente reconhecida.


 


´Como toda orquestra sinfônica, uma das atividades da Osesp é divulgar música nova, feita especialmente pra ela. Porque a gente não tem aqui uma orquestra, a gente não tá acostumado a isso. Mas uma orquestra todo mês faz obras novas, encomendadas. Com uma orquestra importante como a Osesp, não é diferente´, contextualiza Liduíno, compositor premiado em diversos festivais, ressaltando que a regência ficará por conta de John Neschling, diretor da Osesp e em grande parte responsável pela ´nova fase´ de desenvolvimento e força – política e econômica – da orquestra.


 


´Esse convite é mais do que ganhar um prêmio de composição´, avalia Liduíno. ´Todos os compositores do mundo lutam para que orquestras toquem suas peças, porque é um custo muito alto, os ensaios são caros, o processo é muito disputado. Acaba tendo uma seleção muito difícil… Acho que com a Osesp, nessa área de músico de concerto, é a primeira vez que um compositor cearense tem essa chance´.


 


O músico conta que o trabalho inicialmente escrito para essa encomenda teve de ser refeito, atendendo a uma proposta da orquestra. ´O Alan já tinha feito um poema, sobre os sons, e eles ligaram passando um direcionamento, pedindo que a peça fosse ligada à temática da mulher. Ele acabou fazendo outro poema´. Assim nasceu ´Mariinha´, primeiro dos frutos que a parceria vem rendendo. ´Temos feito diversos outros projetos. Pra mim, que já tive duas peças sem poder publicar, por conta de direitos do Manuel Bandeira, é muito bom trabalhar com um poeta do mesmo nível, mas que está aqui, disponível para trabalhar junto´.


 


O tempo do tamarineiro


 


A parceria entre Liduíno Pitombeira e Alan Mendonça teve início quando o compositor erudito foi homenageado em Russas, cidade-natal de ambos. ´O Alan veio falar comigo, me deu os dois livros dele, eu gostei. E, quando recebi essa encomenda da Osesp, achei que podia trabalhar com ele nessa peça´, conta Liduíno. ´Eu já conhecia o Liduíno de nome há muito tempo, já tinha desejo de conhecê-lo pessoalmente. Acabou que aconteceu nessa volta dele ao Ceará. Criamos uma amizade e a coincidência de alguns parceiros musicais em comum, como Tarcísio José de Lima e Ronaldo Lopes, contribuiu para que surgisse a parceria´, revela Alan Mendonça, citando que o convite para trabalhar na peça que viria a ser ´Mariinha´ se deu em novembro do ano passado. ´A gente sentou e discutiu o que era. O tema parte de um sertão e de uma mulher nesse sertão. Tínhamos decidido que seria uma coisa de sertão, porque ele faz uma música contemporânea, mas sempre usa elementos de raiz. Depois que veio a proposta da orquestra, de uma temática feminina, eu, que tinha feito um poema sobre os sons do sertão, acabei fazendo outro, já com esse elemento feminino´, detalha.


 


´A gente pôs o nome de Mariinha, em homenagem à minha avó. Porque a letra, o espaço dela se passa na fazenda em que mamãe nasceu´, acrescenta o poeta, citando que a imagem do tamarineiro na fazenda serviu de referencial a partir do qual a personagem feminina constrói, com a passagem do tempo, diferentes olhares para si e para o mundo. ´Tanto que o poema inicial se chamou ´Tempo tamarineiro´, para depois ser ´Mariinha´. De todo modo, é a história dela que é contada, em cinco momentos, desde menina no pé de tamarino, até quando ela brinca, se casa, vive a imagem da tarde e, finalmente, na velhice, vê pelo tamarineiro as veredas dos que se foram´, resume Alan, contando que Liduíno trabalhou a música a partir dos versos.


 


´É uma diferença na minha forma habitual de trabalhar letra de música. Esse trabalho foi muito dialogado entre nós dois, não só a música pra orquestra, mas o poema que ele queria, um poema sem métrica, sem rima, uma coisa diferente do que eu faço de ouvido, naturalmente. Foi um desafio trabalhar a partir do que ele queria de poema. Mas o resultado ficou maravilhoso´, avalia o artista, que este sábado, às 18h, mostra sua obra e lança seu CD ´Enquanto a cidade dorme´, em evento lítero-dramatúrgico-musical no auditório do Centro Cultural Banco do Nordeste (R. Floriano Peixoto, 941, Centro, entrada franca).


 


Outros projetos


 


Segundo Liduíno Pitombeira, antes mesmo da estréia de ´Mariinha´ a dupla já vem trabalhando em outros projetos. De uma nova peça para seu ´Ciclo de Serestas´, a ´Seresta No. 16´, até uma ópera, passando por uma peça para o violoncelista brasileiro Antônio Menezes, radicado na Suíça e pela idéia de um espetáculo de dança a partir de obras eletroacústicas do compositor.


 


´Temos diversos projetos, o texto dele dá muito certo com o tipo de música que eu faço. Você ter acesso ao poeta e poder mexer, alterar, é importante. O maior problema, quando se trabalho com um poeta, é a questão do direito autoral, como nesse caso do Manuel Bandeira, que o editor não faz acordo. Então decidi não mais trabalhar com esses caras, e o Alan foi um grande achado nisso´, enfatiza Liduíno, frisando que, apesar de estar tendo condições para seguir compondo com freqüência, se ressente de alguns aspectos em seu retorno ao Ceará. ´Tem quase um ano que eu voltei, e vejo que a estrutura da cidade ainda é muito precária, o trânsito é um problema, a burocracia… Vim com uma idéia de ajudar as coisas, mas a burocracia é tão grande que você desanima um pouco. Pra compor dá, mas, se você sai do estúdio, a vida é um turbilhão´. 


 


De Fortaleza, Dalwton Moura