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Quilombolas convocam movimento contra TV Globo

Por Renato Rovai *
Não tinha lido essa carta  antes de escrever a nota que publiquei ainda pela manhã “Cansei, OAB, quero um movimento cívico para rever a concessão da Globo” (leia abaixo), mas ela reafirma completamente o eixo central do meu tex

CARTA CONVOCATÓRIA


 


A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ, entidade representativa das comunidades quilombolas de todos os estados da Federação, convoca todas as entidades e movimentos sociais para construir o Dia Nacional de Repúdio à Emissora Rede Globo de Televisão.


 


A nossa proposta é que o próximo dia 05 de outubro de 2007 fique marcado pela manifestação “GLOBO, A GENTE NÃO SE VÊ POR AQUI!”, que irá expressar a indignação dos movimentos sociais criminalizados, direto ou indiretamente, por essa emissora.


 


Nós, quilombolas, estamos vivenciando, como outros movimentos, de uma investida da Rede Globo com matérias que negam a nossa identidade étnica e contra o decreto 4887/03, que regulamenta o processo de titulação dos territórios de quilombos.


 


Questionamos:


 


o O jornalismo da Rede Globo, pois possui uma postura tendenciosa a serviço das oligarquias, cujos interesses sempre entram em conflito com os interesses das classes populares;


 


o A formação da opinião pública dessa mídia, já que essas matérias acabam contribuindo para um maior desconhecimento da luta dos quilombolas e de outras lutas, desarticulando os diversos movimentos;


 


o O ineficiente controle que todos os poderes públicos e sociedade possuem em relação a esta emissora, já que não se sabe quando se renova as suas concessões, não há fiscalização se os Direitos de Respostas são cumpridos, não há punições em relação às distorções cometidas, entre outras.


 


Sugerimos que neste dia (05 de outubro) sejam realizadas atividades, nas quais se discutam sobre o papel da Rede Globo na sociedade brasileira, analisando como essa emissora desrespeita a diversidade dos movimentos sociais e de entidades.


 


A nossa postura política representa um ato de repúdio ao abuso de um grupo de mídia privado que se utiliza da concessão pública para descredibilizar aqueles e aquelas, que há mais de 500 anos, constroem a história desse país.


 


Contamos com a sua adesão.


 


 



Cansei, OAB, quero um movimento
cívico para rever a concessão da Globo


 


Nunca vejo, por motivos óbvios, a série Malhação. Ontem, quinta-feira, por conta de uma longa viagem que me fez perder a noite de sono. E fui à cama somente às 13h30, acordei na hora deste programa. E ao ligar a TV no quarto do hotel fui “pego” pelo diálogo de uma personagem que representava uma típica dondoca urbana da nossa elite, seu filho e um sujeito meia-idade, que me pareceu um advogado.


 


O “doutor”, com cara de homem-bom dizia que seu filho deveria ter de fazer vídeos com pessoas que haviam sido vítimas de violência etc. etc. O filho, ao lado, ficava franzindo a cara e dizendo que aquilo era um absurdo etc. etc. A dondoca achou ótimo, afinal, o garoto mesmo tendo arrebentado a cara de alguém não teria de passar alguns dias numa cela cheia de bandidos pobres e fedidos. Só teria de fazer um vídeo. Fechado o acordo, saíram ambos, mãe e filho. E aí começa outra história…


 


Dois negros jovens conversavam sobre a questão racial. Um o “revoltado” e outro o “equilibrado”, exatamente no meio desse papo, são abordados pela madame que lhe oferece dois reais e pede para que manobrem o carro para ela: “mas vocês sabem dirigir carro automático, né?”, pergunta.


 


O que é racismo para a Globo


 


– Mãe, mãe, eles não são guardadores de carro, são colegas meus da escola, diz o boca-murcha do garoto.


 


– Ai, também… desculpa, desculpa, diz a madame.


 


Depois disso os dois garotos negros retomam o diálogo. Trata-se de uma reprodução livre porque não tenho a fita, mas garanto que honesta. E se não for, a Globo que a conteste. Percebam os detalhes:


 


O revoltado – Entendeu, é isso, é assim que as pessoas nos vêem, desse jeito, como gente de baixo. Essa mulher e esse filhinho dela são uns idiotas, riquinhos racistas etc.


 


O equilibrado – Não concordo, você também está sendo preconceituoso. É preconceito você dizer riquinho desse jeito, como também é preconceito quando as pessoas dizem que loura bonita é burra. Não acho que existe perseguição com a gente por sermos negros. 
Entenderam? É a mesmíssima coisa falar loura burra ou preto sujo. Ali Kamel, que faz o papel de porta-voz da família Marinho, lançou um livro recentemente (claro que não li) onde ele trata da nossa igualdade racial. Ou seja, ele ataca os idiotas, como eu, que consideram que o Brasil é um país onde a cor da pele faz diferença sim. E que é preciso fazer com que os negros (ou pretos, como preferirem, não vejo racismo na diferença entre esses termos) precisam de compensações para disputarem com brancos em pé de igualdade. É disso que se trata.


 


A Globo comprou a disputa contra as cotas e está fazendo novela e malhação com elas. É por isso que precisamos começar a discutir qual é o limite de uma empresa privada de comunicação quando opera ondas públicas de rádio e TV. A sociedade tem o direito de debater a questão das cotas. Tem o direito de ser contra ou a favor. E os meios de comunicação têm o dever de colocar esse debate para ser realizado em pé de igualdade. Eu, por exemplo, branco por fora e negro no resto, quero debater o tema. E não aceito que a dona Globo e os seus papagaios de plantão usem meu espaço de comunicação para fazer o que quiserem. A concessão que eles têm também é minha. É de todo cidadão brasileiro.


 


E vem coisa pior por aí


 


A Globo está testando campanhas. É bom ficar de olhos abertos. Agora eles estão numa para descaracterizar a luta histórica do povo negro por igualdade. Por chances iguais. Ontem estavam, via programa do Jô, por exemplo, gritando contra a censura, por conta da classificação indicativa. Agora, acabo de ler, que a OAB-SP vai lançar uma campanha cujo slogan será…tan-tan-tan:. “cansei”. E vai veicular filmes e publicidades em jornais, revistas e TVs. Entendi.


 


Os veículos de comunicação vão, via OAB-SP, que liderara o movimento, fazer uma campanha contra o governo, será isso? Quero saber se a OAB vai pagar essa campanha e quanto ela custará? Estou solicitando essa informação pela revista Fórum para a assessoria de imprensa da Ordem. Ele chamam de movimento cívico, não de campanha, ok, entendi, então quanto vai custar a divulgação nos meios de comunicação desse movimento cívico? Se a veiculação dela for gratuita, é bom começar a discutir como rever as concessões públicas de rádio e TV o mais rápido possível.


 


É bom começar a fazer algo. A concessão da Globo vence em outubro. Talvez seja o caso de organizar um movimento cívico para discuti-la.


 


 


* Renato Rovai é editor da Revista Fórum


 


Fonte: Blog do Rovai