Maior federação de SC defende Central Classista
Em entrevista, o presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Santa Catarina (Fetaesc), Hilário Gottseling, fala de sua participação no movimento pela central classista. “Estou empenhado na discussão para concretizar esta central
Publicado 15/08/2007 21:33
A Fetaesc congrega, atualmente, 234 sindicatos de trabalhadores rurais e 44 extensões de base. São entidades que atuam em 275 municípios catarinenses, organizados, respectivamente, em 17 associações de sindicatos de trabalhadores rurais.
Fundada em 02 de julho de 1968, é uma entidade sindical de segundo grau, com sede no município de São José. Os trabalhadores e trabalhadoras rurais que congregam a Fetaesc são responsáveis por 71,3% da produção de alimentos em Santa Catarina, segundo levantamento do Icepa (Instituto de Planejamento em Economia Agrícola de Santa de Catarina).
Em entrevista exclusiva ao Vermelho, o dirigente sindical fala de sua avaliação do movimento sindical e destaca as principais lutas e dilemas do movimento diante do governo Lula.
“Os movimentos sociais ficaram asfixiados, sem reação para os problemas econômicos e sociais – e ainda são muitos – no governo Lula. Este fato se deve a responsabilidade dos movimentos e a dependência de parte do sindicalismo de suas decisões pelo Planalto”, declarou.
Hilário demonstrou entusiasmo com o movimento por uma central classista e democrática dos trabalhadores durante a entrevista e acredita que o movimento é uma opção que falta as entidades sindicais no país.
Vermelho: Qual foi a sua trajetória no movimento sindical?
Hilário: Iniciei e continuo associado no Sindicato de Trabalhadores Rurais de Pinheiro Preto, no estado de Santa Catarina. Fui diretor do sindicato, da Fetaesc e da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura) e hoje sou presidente da Fetaesc.
V: Qual a relação da entidade com as centrais que existem hoje?
Hilário: Não temos filiação a nenhuma central sindical devido à falta de correspondência das centrais que existem aos interesses dos trabalhadores rurais. A Contag é filiada a CUT, mas como a CUT defende a pluralidade sindical e reconhece a Fetraf (Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da região Sul) como organização paralela a Contag, não aceitamos nossa filiação a CUT. Para nós, a ação da Central Única está fragilizando a nossa luta, disputando e ''inorganizando'' nossos sindicatos e, com isto, enfraquecendo o movimento sindical rural.
V: Quais são as principais reivindicações da Fetaesc?
Hilário: Defendemos um novo projeto de agricultura focado na agricultura familiar. Para tanto, é preciso mudar alguns aspectos conceituais. Entre eles as políticas públicas que devem considerar as pessoas que vivem da terra, ou seja, é preciso pensar a propriedade como um todo e não só as culturas produtivas. O crédito, por exemplo, não pode ser para financiar cada cultura individual e sim a propriedade como um todo. Outra questão é levar em conta as capacidades produtivas, ambientais e econômicas da propriedade. Beneficiar os produtos da propriedade coletivamente com outros agricultores que se identificam e com isto criar marca regional também é importante, assim como, capacitar os agricultores para que eles possam perceber as mudanças necessárias. Defendemos que seja feita, inclusive, uma pesquisa adequada e aplicada com os interesses dos agricultores familiares, entre outras questões.
Também é preciso crédito fundiário para assentamento de agricultores sem terra. Defendemos o crédito fundiário porque o estado é formado por pequenas propriedades. Se elas forem vendidas devem ser repassadas para outro pequeno agricultor. Acordos e convenções de trabalho para os assalariados rurais do estado, nas mais diversas atividades agrícolas – entre elas fruticultura, reflorestamento, hortigrangeiros, carne – são aspectos importantes de nossas reivindicações.
A garantia dos direitos previdenciários a todos os trabalhadores e trabalhadoras rurais do estado, assim como programa de habitação rural, sejam eles assalariados ou agricultores familiares, está na nossa pauta. Veja, estamos fazendo mais de três mil casas novas ou reformadas por ano.
Queremos também a mudança dos currículos escolares, adequando a realidade da agricultura – pois com a nucleação estamos perdendo nossa história e cultura do meio rural. Além disso, desejamos melhorar a legislação ambiental, já que o código florestal inviabiliza 32. 800 propriedades de agricultores familiares do estado. Por fim, reivindicamos as negociações de preço de diversos produtos agrícolas, entre eles: fumo, leite, suínos e aves.
V: Nestes quase cinco anos de governo Lula quais foram as principais mudanças?
Hilário: A consolidação da democratização do país é um marco importante que e devemos garantir sua continuidade. O governante de centro esquerda precisa garantir a continuidade. No meio rural vale destacar a ampliação de recursos do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), apesar da reforma agrária não avançar. Devemos lutar para garantir a continuidade dos trabalhadores rurais no regime geral da previdência social e também em programas sociais, como a Bolsa Família e a Bolsa Escola.
Por outro lado, os movimentos sociais ficaram asfixiados, sem reação para os problemas econômicos e sociais, e ainda são muitos. Este fato se deve a responsabilidade dos movimentos e a dependência, ou controle, de decisões pelo Planalto.
V: Como você vê o movimento sindical no Brasil? Quais são as dificuldades
e desafios atuais?
Hilário: É um movimento forte, mas que vem sofrendo crise de identidade pelos seguintes motivos: não tem conseguido modernizar sua representação, nem seus projetos de sociedade, vivendo uma busca repetida de procedimentos e estratégias já superadas. Os trabalhadores em geral, a partir do momento em que a inflação brasileira caiu significativamente, perderam a capacidade de mobilização por não terem outras pautas a não ser a de recuperar a inflação do ano anterior. Os interesses de grupos ou tendências, pior ainda, os interesses pessoais, se sobrepuseram aos interesses das classes. A sobreposição das centrais existentes ao papel de estruturas como as confederações, federações e sindicatos geraram problemas.
A eleição de Lula, apesar de trazer muitos avanços, também trouxe dependência de parcelas do movimento ao governo, principalmente para tomada de decisões e mobilizações por parte das centrais e confederações.
V: A CSC está fazendo um movimento por uma outra central, com feição
classista. O que você acha desta iniciativa?
Hilário: Estou empenhado na discussão para concretizar esta central sindical com o principio classista e democrática. Para tanto, é preciso que se construa essa central sem o domínio das tendências políticas – sejam elas suprapartidárias – para garantir um maior papel das confederações, federações e sindicatos. Esse fator é muito importante para garantir a unicidade sindical nas estruturas verticais.
V: Como isso pode repercutir no sindicalismo?
Hilário: Entendo que a opção pelo princípio democrático e classista se diferencia dos princípios das demais centrais. Uma central com essas características poderá crescer muito no movimento. No nosso caso, pertencemos ao sistema Contag, que também é uma opção para os sindicatos de trabalhadores rurais. Mas o que a gente vê na Contag, que é filiada a CUT, é a falta de espaço para proporcionar um debate maior sobre os problemas da organização e dos trabalhadores, como deveria acontecer. Em certos momentos, a gente sente um ‘castramento’ desta possibilidade, o que vem provocando grande descontentamento no conjunto da nossa organização, seja nos filiados ou não a CUT.
V: Qual a concepção de movimento sindical que você defende para uma central?
Hilário: Concepção classista e democrática respeitando as diferenças e os problemas das diversas categorias. Que a central que fundaremos venha a garantir a representação e a defesa dos interesses gerais das diversas categorias. Que ela tenha representação internacional. Que garanta a solidariedade às diversas categorias e a participação de todas nos debates e na consolidação de um projeto de sociedade. Penso que uma central classista deve representar todos os trabalhadores brasileiros, sejam eles na atividade ou não.