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Ex-mulher de Zé Dirceu dispara contra autor de 'Duas Caras'

Clara Becker, ex-mulher de José Dirceu, tornou pública a carta que pretende enviar a Aguinaldo Silva – autor da atual “novela das oito” da TV Globo, Duas Caras. No texto, Clara, de 66 anos, rebate o novelista e diz que Dirceu, ex-ministro do pres

O estopim da carta foi uma entrevista maledicente de Aguinaldo à Folha de S.Paulo. Ele declarou que a história de Dirceu e Clara inspirou a criação do protagonista da novela – que se casa por interesse, foge com o dinheiro da mulher e faz plástica para mudar de vida. “Tenho horror (de Dirceu)“, afirmou o autor de Duas Caras.


 


Como era militante político sob perseguição da ditadura militar, Dirceu fez plástica em Cuba para mudar de rosto e, de volta ao Brasil, casou-se usando falsa identidade para fugir do regime. Com a anistia, revelou-se à mulher – com quem teve um filho – e se separou.


 


“Uma pessoa que faz isso é capaz de qualquer coisa. Tenho medo dele. Confesso que, quando ele era chefe da Casa Civil, sempre pensava nisso. Tenho horror”, disse Aguinaldo Silva, descontextualizando por completo as razões de Dirceu.


 


Segundo reportagem de Mônica Bergamo à Folha desta sexta-feira (5), Clara afirma na carta que é “fã” de Aguinaldo, mas teve uma “enorme decepção”. De acordo com ela, a comparação é “caluniosa”.


 


“Se o senhor não gosta do político José Dirceu, se tem uma impressão negativa dele, esse é um direito sagrado que respeito integralmente”, diz ela a ao noveleiro. “Agora, por favor, não extravase sua raiva ou preconceito contra ele, falando de coisas que não são de seu conhecimento, como a relação que tivemos. Pois isso não atinge apenas a ele: atinge a mim e sobretudo a verdade.”


 


“Nos anos em que vivi com José Dirceu”, continua Clara, “era tudo anotado em um caderno e cada um pagava as suas contas”. O texto traz explicações da ex-mulher: “Dirceu pagava a empregada e o aluguel, e eu pagava as despesas de casa e a comida. Ele nunca me roubou e nunca dependeu do meu dinheiro, pois tinha a sua loja e eu tinha a minha.”


 


Cada vez mais polêmico e conservador, Aguinaldo Silva já havia se insinuado “direitista” em outra entrevista, publicada em 18 de setembro no portal Terra. O autor citou como seu símbolo ideológico a personagem Branca (Susana Vieira).


 


Chamada de fascista e “de direita” por reprimir com ação policial uma ocupação de estudantes em sua faculdade, Branca enche a boca e solta: “Se respeitar a ordem e a legalidade é ser de direita, então todas as pessoas deveriam ser de direita”. É por aí que vai a Globo – e suas novelas…


 


Leia abaixo a íntegra da carta Clara Becker


 



Senhor Aguinaldo Silva,


 


Quem lhe escreve, antes de tudo, é uma fã. Não sou militante política e nunca fui. Como milhões de brasileiros, sou uma telespectadora assídua de novelas e foi assim que aprendi a admirá-lo, como grande autor que é.


 


Permita-me, no entanto, transmitir uma enorme decepção que senti provocada por algumas declarações suas que envolvem fatos que conheço de perto. Que o senhor queira criar um ambiente de ficção em suas novelas, não é apenas direito seu, assim como merece todo aplauso. Mas que o senhor queira criar um universo paralelo à realidade em algo que pertence à minha vida, a algo que vivi, a algo que nada tem a ver com a ficção, pois faz parte de meu passado, sinceramente, acho que o senhor deveria ter mais cuidado.


 


Não me sinto preparada para tecer considerações sobre seus relacionamentos pessoais. Não me sinto preparada para julgar uma relação amorosa sua ocorrida há décadas. Isso pertence à sua intimidade e tenho algo muito claro para mim: como poderia eu, que não vivi os seus relacionamentos, sair por aí avaliando esse ou aquele aspecto da sua vida? Se fizesse isso, certamente o senhor teria toda a razão de me chamar de leviana.


 


Infelizmente, foi isso que ocorreu comigo, a partir de suas declarações sobre o relacionamento afetivo que mantive com José Dirceu. Se o senhor não gosta do político José Dirceu, se tem uma impressão negativa dele, esse é um direito sagrado que respeito integralmente. Agora, por favor, não extravase sua raiva ou preconceito contra ele, falando de coisas que não são de seu conhecimento, como a relação que tivemos. Pois isso não atinge apenas a ele: atinge a mim e sobretudo a verdade.


 


Realmente, acredito que existe um José Dirceu de duas caras. A cara verdadeira, de quem o conhece, com suas falhas e virtudes, com seus acertos e erros, com suas qualidades e imperfeições. Há, porém, uma outra cara: uma cara inventada pelos seus adversários e por aqueles que, cegos pelo preconceito ou pela discordância, acabam produzindo uma imagem estapafúrdia. Permita-me dizer que, para minha imensa e infeliz surpresa, suas declarações acabaram colocando-o nesse triste rol.


 


Pela primeira e última vez, quero falar sobre detalhes de minha vida com José Dirceu, expondo minha intimidade em público, à minha revelia. É que não suporto mais ver repetidas as mentiras, as distorções, as agressões sobre algo que somente eu e ele podemos dizer, com clareza, o que aconteceu.


 


Sendo assim, quero deixar claro de uma vez por todas alguns pontos que considero cruciais em toda essa história. Que a imprensa, se voltar a esse assunto novamente, não queira se fazer de desinformada sobre o tema, repetindo mentiras e suposições, pois aqui eu apresento os fatos tal como os vivi:


 


1) O autor da novela “Duas Caras”, Aguinaldo Silva, desconhece a verdade em relação à vida de José Dirceu em Cruzeiro do Oeste, cidade que ele escolheu para morar e trabalhar diante da perseguição movida pela ditadura militar, sendo obrigado a usar outra identidade e modificar sua aparência.


 


2) É caluniosa a comparação, feita pelo autor da novela, entre José Dirceu e um personagem que se casa por interesse e foge com o dinheiro da esposa. Nos anos em que vivi com José Dirceu nós dividíamos todas as contas. Era tudo anotado em um caderno e cada um pagava as suas contas. José Dirceu pagava a empregada e o aluguel e eu pagava as despesas de casa e a comida. Ele nunca me roubou e nunca dependeu do meu dinheiro, pois tinha a sua loja e eu a tinha a minha. Tanto que quando José Dirceu voltou para São Paulo, sua loja ainda tinha dinheiro para receber aqui em Cruzeiro do Oeste e ele me pediu que recebesse e ficasse com o dinheiro.


 


3) Quanto à omissão da sua identidade na época, todos, agora, sabem que era uma necessidade, pois a vida de José Dirceu estava em perigo. Certa vez fui chamada pelo então prefeito para uma conversa na Prefeitura. O prefeito e outras pessoas desconfiavam daquele homem recém-chegado à cidade e que tinha um estilo diferente. Em casa, conversei com José Dirceu e perguntei se ele escondia alguma coisa, se era casado ou se era bandido. A resposta foi imediata: não era casado e nem era bandido, mas havia algo, sim, que não podia revelado naquele momento. Senti sinceridade. Ele era bom, vivíamos bem e continuamos juntos, mesmo sem saber todos os detalhes da vida dele. Foi uma opção minha.


 


4) Afirmo que nunca conheci um homem tão íntegro e honesto como José Dirceu e considero que a omissão de sua real identidade foi uma necessidade naquelas circunstâncias.


 


5) É preciso esclarecer ainda que, ao contrário do que insinua a reportagem, não fui abandonada por José Dirceu. Com a anistia, ele pediu que eu e meu filho fossemos com ele para São Paulo. Chegamos a viver algum tempo juntos na capital paulista, mas eu tinha aqui em Cruzeiro do Oeste uma família que dependia de mim (pai, mãe, duas irmãs e meu filho) e a vida em São Paulo era muito dura. Eu tomei a iniciativa de voltar para Cruzeiro do Oeste.


 


6) Por fim, reafirmo que o José Dirceu foi um companheiro ideal. Mesmo depois de nossa separação mantém contato, preocupa-se com meu bem-estar e vem a Cruzeiro do Oeste, cidade hoje administrada por nosso filho.


 


Por fim, a todos aqueles que gostam ou não gostam de José Dirceu; a todos aqueles que concordam ou não com as idéias dele; a todos, enfim, que acreditam ou não acreditam na política, a todos eu peço apenas um favor: não usem os fatos de minha vida, não usem o meu passado, como matéria-prima para suas divergências. Respeitem a minha vida, como gostariam de ter as suas respeitadas. Sou apenas uma brasileira, totalmente fora da vida pública e acho que mereço que esse direito meu seja preservado.


 


Cruzeiro do Oeste, 1º de outubro de 2007


 


Clara Becker