Igualdade racial no Brasil exige lei, diz Milhomem
Durante quatro horas, autoridades governamentais, parlamentares e representantes dos movimentos sociais discutiram, em reunião na Comissão Geral da Câmara dos Deputados, nesta segunda-feira (26), o Estatuto da Igualdade Racial. Assuntos polêmicos, como
Publicado 26/11/2007 15:43
O deputado Evandro Milhomem (PCdoB-AM) acredita que essas soluções devem figurar em lei, defendendo a aprovação do Estatuto. Segundo ele, “as políticas afirmativas que estão sendo implementadas nesse governo podem não ter continuidade em outros governos, por isso tem que estar escrito na lei, não pode ficar a mercê da boa vontade dos governantes”.
Milhomem lembrou que “nos governos anteriores não conseguimos encaminhar nenhuma política de inclusão”, para enfatizar a necessidade de aproveitar o governo Lula – um governo democrático – e garantir os direitos dos negros. E enfatizou: “o que estamos pedindo é igualdade, porque existe desigualdade, queremos equilibrar as forças dessa sociedade”.
A comissão geral ainda faz parte das atividades pelo Dia da Consciência Negra, comemorado em 20 de novembro.
Projeto antigo
O presidente da Casa, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), que presidiu a comissão geral, anunciou que, nesta terça-feira (27), durante reunião do Colégio de Líderes, vai apresentar como proposta da Presidência, a instalação da comissão especial para apreciar a matéria.
A proposta do Estatuto da Igualdade Racial, que chegou à Câmara dos Deputados em novembro de 2005, até hoje não foi votada. Em dezembro do mesmo ano, foi criado uma comissão especial, mas nunca foi instalada. Chinaglia explicou que “a comissão especial é criada para projetos que tramitam em mais de três comissões, o que dá um trâmite que pode se chamar de urgência”.
Para ele, “esta comissão geral é uma preparação para que os parlamentares tenham mais elementos de análise”, disse.
Compromisso com as cotas
A ministra da Secretaria Especial de Políticas da Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Matilde Ribeiro, defendeu a criação de cotas nas universidades públicas. E disse que o governo está comprometido com a aprovação dessa proposta. O estatuto prevê, além das cotas, outras medidas compensatórias para afrodescententes. “Consideramos fundamental a aprovação do projeto”, disse.
Ela afirmou que as políticas compensatórias para afrodescendentes têm o objetivo de reverter distorções que vêm desde a escravatura. “Não podemos cruzar os braços diante de injustiças históricas acumuladas ao longo de 500 anos”, afirmou.
Cotas agregam
O reitor da Universidade de Brasília (UnB), Timothy Mulholland, fez a defesa da política de cotas. “O sistema de cotas agrega os jovens nas instituições, nãos os segregam. O que segrega é a exclusão”, garante o reitor. Segundo ele, é fácil identificar, no Brasil, onde se encontram e quais são os grupos vulneráveis. E sugere que “identificadas essas vulnerabilidades, esses processos de exclusão, atuar de forma pontual, de forma agressiva para reverter essa situação”.
Mulholland lembrou que “é por intermédio da educação que o povo brasileiro se resgata e se resgatará das dificuldades, das mazelas da sua história. É na educação, portanto, que os maiores esforços devem ser concentrados, porque ela é o caminho mais curto para uma sociedade igualitária”, acrescentando que “todas as brasileiras e todos os brasileiros devem ter oportunidades educacionais iguais em todos os níveis da educação”.
O reitor da UnB destacou ainda que mais de 30 instituições já possuem políticas de cotas, entre elas a UnB. E explica que “os jovens negros que hoje estão nas universidades públicas ou privadas estão se mostrando bons alunos com rendimento comparável a seus colegas. Nenhuma, repito, nenhuma das previsões nefastas alardeadas na mídia quando as cotas foram alcançadas, em 2002, realizou-se ou ameaças se realizaram”.
Ódio racial
O coordenador nacional do Movimento Negro Socialista, José Carlos Miranda, alertou que os exemplos internacionais de cotas raciais criaram ódio racial e aumentou a distância entre ricos e pobres, sejam eles negros ou não. Para ele, “a partir do momento que se coloca a raça como uma linha definidora de direitos e deveres, torna-se questionável a igualdade jurídica dos cidadãos: se a República não conseguiu cumprir esse papel – de garantir a igualdade entre as pessoas -, é porque as políticas universalistas nunca foram aplicadas profundamente”.
O advogado Hédio Silva Júnior, por sua vez, acusou as pessoas que criticam as cotas raciais de “má-fé ou ignorância”. Ele considera que o estatuto “chega atrasado à realidade”, pois algumas instituições de ensino superior já adotam cotas para alunos negros. “Se as cotas estivessem baixando o nível dos alunos, a mídia já estaria divulgando há muito tempo. O silêncio (da mídia) é o sinal claro que a medida deu certo”, concluiu.
120 anos de espera
O Estatuto da Igualdade Racial, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), tem o objetivo de estabelecer mecanismos de combate ao racismo e de inserir a dimensão racial nas políticas públicas do Brasil.
O presidente da Frente Parlamentar da Igualdade Racial, deputado Carlos Santana (PT-RJ), elogiou a iniciativa da Câmara de aprofundar o debate. Ele acredita na aprovação definitiva da matéria até 2008, quando se completam 120 anos da abolição da escravatura no Brasil. “Espero que a Casa faça justiça aos afrodescendentes e aprove o mais rapidamente possível essa proposta”, afirmou Santana.
Santana rebate os argumentos dos que alegam que as cotas, ao invés de reduzir, vão aprofundar a desigualdade racial. “Estamos pedindo reparação para um povo que sofreu, que hoje está na pobreza, na miséria, sem acesso ao emprego”, disse ele. “O estatuto não aprofunda a desigualdade; é o contrário. Nós queremos a reparação e a elite brasileira deve isso a nós, afrodescendentes”, completou.
De Brasília
Márcia Xavier