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Depoimentos de arquitetos estrangeiros homenageiam Niemeyer

Grandes nomes da arquitetura contemporânea falaram sobre Oscar Niemeyer por ocasião do aniversário de cem anos do brasileiro neste sábado. O português Álvaro Siza, o britânico Richard Rogers, o americano Richard Meier, o italiano Renzo Piano, a anglo-iraq

Confira abaixo os depoimentos.


 


Álvaro Siza (Portugal)


 


Siza lamenta que tenham sido pouco aproveitadas as oportunidades para que Niemeyer fizesse projetos em Portugal, e também o fato de terem ficado sem ser realizados projetos como o da Casa do Brasil em Lisboa. Sua única obra em território luso é a de um hotel na Ilha da Madeira.


 


Mas o mestre brasileiro “participou decisivamente, pela qualidade e a comunicabilidade de sua obra e por afinidades culturais, da construção de um novo e por muito tempo buscado espírito para a arquitetura portuguesa”, afirma Siza.


 


Para ele, Niemeyer era sabedor das dificuldades políticas que afetam a evolução da arquitetura e foi capaz de superá-las “com a coragem de um sonho nunca interrompido”.


 


Siza lembra as visitas de Niemeyer a Portugal, e suas reuniões com professores e alunos de arquitetura nas quais explicou projetos como o do aeroporto de Brasília.


 


“A partir de uma sólida compreensão do funcionamento surgiu, como forma íntegra e total, o que poderia ser (e geralmente é) uma adição de grandes espaços, sem o encorajamento de 'ser um todo' orgânico e eficaz.”


 


A referência a Niemeyer ajudou no processo de “reconquista da liberdade criativa, de conjunção entre tradição e modernidade”, declara Siza, que lembrou ainda o fascínio que produziam em sua geração os projetos do brasileiro: “Pilares como pontos, paredes como finas linhas onduladas, a forma quase dissolvida, com tudo tão nítido e tão novo e tão evolutivo”.


 


Richard Rogers (Reino Unido)


 


“Oscar Niemeyer é um grande arquiteto, um dos professores que deram forma ao modernismo, e compartilha com Le Corbusier o amor ao concreto com sua liberdade em relação à dominação do ângulo reto.


 


Seus edifícios belos, plásticos, com boas proporções e dinâmicos combinam a escultura, a funcionalidade e a ciência com a arte. Profundamente comprometido no âmbito político durante toda sua vida, Niemeyer acredita que o desenho não pode se desvincular da responsabilidade social.


 


Em 2003, Niemeyer construiu seu primeiro edifício em Londres, o pavilhão da Galeria Serpentine, no Hyde Park. Era simples e belo, em contraste com muitas das complexas e distorcidas estruturas que são construídas hoje em dia.


 


É como se ele passasse cem anos depurando sua obra e alcançasse uma singeleza mágica, que todos são capazes de apreciar. Feliz aniversário, e tomara que ele possa seguir fazendo nosso mundo mais belo.”


 


Zaha Hadid (Iraque-Reino Unido)


 


“Oscar Niemeyer teve uma influência profunda e duradoura em minha obra. Visitei muitas de suas obras no Brasil, e tive também o privilégio de ter me reunido com ele em várias ocasiões.


 


Acho que sua originalidade, sua sensibilidade espacial e seu talento são absolutamente únicos e insuperáveis. Sua obra me inspirou e me encorajou a seguir meu próprio caminho na arquitetura e a acompanhá-lo na busca de uma fluência total em todas as etapas.”


 


Richard Meier (EUA)


 


“Acho que a relação de seu trabalho com o clima e a paisagem teve muita importância para a arquitetura no mundo todo. O uso dos materiais sempre foi muito importante em seus trabalhos, já que utilizou sempre aqueles que permitiam o aproveitamento máximo da luz, de modo que esta se refletisse em seus edifícios.


 


Eu diria que Niemeyer foi sempre muito limpo e claro em suas criações. Meu grande problema é que, infelizmente, não vi pessoalmente nenhuma de suas obras. Gostaria muito de tê-las visto. O conhecimento que tenho de suas criações se deve a fotografias e esboços.


 


Acho que (Niemeyer) é uma pessoa que inspira a todos aqueles que querem criar edifícios maravilhosos como os que ele fez ao longo de toda sua carreira, mas em particular não posso estabelecer uma relação de seu estilo com o meu. Eu não fiz nada que possa ser comparado à escala de seus trabalhos. Nossas obras são muito diferentes.


 


(Niemeyer) Trabalhou durante toda sua vida e ainda hoje não deixou de trabalhar, inclusive agora, prestes a completar cem anos.


 


Por ocasião de seu centésimo aniversário eu gostaria de dar os parabéns a ele, pois isso é um acontecimento. Obrigado por sua enorme contribuição ao mundo da arquitetura.”


 


Renzo Piano (Itália)


 


Piano considera que “Oscar Niemeyer é um homem apaixonado e com compromisso político”, duas das qualidades “com as quais se faz a arquitetura”.


 


“Além das doutrinas de Niemeyer sobre as formas”, o brasileiro sempre disse que o arquiteto é uma “pessoa comprometida politicamente”.


 


Piano comentou também que “não no sentido de esquerda ou de direita”, pois “todos sabem que ele sempre foi de esquerda”, mas sua forma de entender “o compromisso político, o papel cívico” de sua profissão deixou uma “marca profunda”.


 


O italiano lembrou que Niemeyer estava no júri do concurso que atribuiu a construção do emblemático Museu Georges Pompidou de Paris a ele e a Rogers.


 


Desde então, os dois mantiveram uma relação de amizade, pois, segundo Piano, “independentemente do quanto tenha mudado a história da arquitetura”, Niemeyer não mudou sua trajetória pessoal.


 


Para o italiano, a arquitetura de Niemeyer “canta, tem voz e as cidades necessitam de edifícios que cantem”.


 


Piano acrescentou que o brasileiro encontra “harmonia nas formas das curvas”, e o descreveu como um homem “cheio de ironia” que se inspira “na mulher, na biologia ou na natureza”.


 


O arquiteto europeu, prêmio Pritzker em 1998, assegurou que seu estilo e o de Niemeyer são diferentes, mas que quando pensa “na alegria da arquitetura”, o brasileiro é uma das pessoas que mais lhe vêm à cabeça, e “não porque tenha copiado sua linguagem”, pois “raramente” usou o cimento como o arquiteto de Brasília, mas porque a “magia” que Piano busca em seus edifícios é “um pouco a alegria” de Niemeyer.


 


Essa alegria “não é vazia”, reforçou, “porque por trás há um papel político, o de fazer arquitetura para que o povo a aproveite e para que a cidade seja um local de felicidade”.


 


Teodoro González de León (México)


 


“Niemeyer é um fora de série, porque quebrou o estigma dos arquitetos que necessitam de idade” para lançar projetos interessantes, ao começar sua carreira muito jovem.


 


“Não há um Mozart na arquitetura porque esta é uma arte da experiência, mas há pessoas que absorvem a experiência com uma rapidez bárbara, como Niemeyer.”


 


Segundo De León, que conhece bem a obra do brasileiro porque a estudou a fundo quando realizou o projeto da sede da embaixada mexicana em Brasília, as palavras que melhor definem seu colega de profissão são “liberdade”, “leveza” e “frescor”.


 


Entre as construções de Niemeyer que mais agradam ao profissional mexicano estão o Palácio da Alvorada e o Complexo Arquitetônico da Pampulha, em Belo Horizonte, além de outros edifícios em Paris e Milão.


 


De León lamentou que, apesar dessas conquistas, o homenageado deste sábado seja “o grande esquecido do modernismo” e que a obra do brasileiro tenha sido “pouco valorizada”.


 


Juan Herreros (Espanha)


 


“Oscar Niemeyer representa para os arquitetos a confiança na forma. Embora seu repertório leve a uma estética e a técnicas não vigentes hoje, seu trabalho transcenderá todas as épocas, pois ninguém pode evitar o fascínio produzido por uma obra projetada a partir da certeza de que imagem, silhueta e experiência espacial são elementos fundamentais da arquitetura.


 


De certo modo, Niemeyer transmite em sua obra uma mensagem singela, apesar da voluptuosidade de seu trabalho, pois a redução de materiais, organizações elementares e uma facilidade quase ingênua na compreensão e no uso de seus edifícios dão a ele uma aparência mitológica por sua relação entre idéia original, esboço e construção.


 


A valorização da beleza como ingrediente funcional é certamente seu legado mais fértil e útil para a arquitetura. A obra de Oscar Niemeyer é agora mais apreciada que nunca e o será em um futuro próximo, porque a crítica perdeu força.


 


Efetivamente, já não cabe o menosprezo de classificá-lo como pouco funcional ou esbanjador de espaço, pois é a fusão dos dois conceitos –beleza e funcionalidade– o que torna grande seu trabalho, não por atender à atividade programada com atitude minuciosa, mas por considerar o uso experimental do espaço e a percepção como funções tão importantes como qualquer outra.”


 


Gae Aulenti (Itália)


 


A arquiteta italiana, conhecida por projetar o Museu d'Orsay, de Paris, classificou Niemeyer como dono de um “espírito independente e livre”. Aulenti lembrou que encontrou pela primeira vez o arquiteto “pelo menos há 40 anos”, no estúdio dele no Rio.


 


Ao admirar o panorama “imenso e único” de Copacabana do estúdio, Aulenti pensou que essa paisagem era “uma analogia” à arquitetura de Niemeyer.


 


A italiana disse que em sua visita a Brasília voltou a encontrar esse “espírito livre de Niemeyer, fora de todo o esquema da arquitetura moderna desse período”.


 


Destacou a “grande liberdade” que teve Niemeyer em sua carreira, e que o levou a experimentar na escolha de seus materiais e nos componentes de sua arquitetura.


 


Também disse que “naquela época havia duas novas cidades a serem visitadas: a Brasília de Niemeyer e a Chandigarh de Le Corbusier, na Índia”.


 


Para Aulenti, Niemeyer é uma “grande testemunha”, que deixou sua marca “na passagem do século 20 para o 21”.


 


Ricardo Legorreta (México)


 


Legorreta disse que o brasileiro tem “uma criatividade e um talento natural impressionantes”, e lembrou que, em todas as vezes em que conseguiu ver pessoalmente suas obras, o conjunto pareceu “fácil e natural”.


 


“Ele sempre mostrou uma clara consistência em seus princípios humanos, políticos e sociais, o que gerou uma maturidade em seu pensamento”, acrescentou.


 


O mexicano também comentou que Niemeyer teve a virtude de criar “uma arquitetura universal enraizada ao mesmo tempo na cultura brasileira e em seus próprios princípios criativos”.


 


O melhor projeto do brasileiro, segundo Legorreta, é o do Palácio da Alvorada, “uma obra-prima”.


 


Fonte: Folha Online