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Der Spiegel: Italianos vivem desânimo coletivo

Em tradução publicada pelo jornal O Estado de S.Paulo, a revista alemã Der Spiegel (O Espelho) procura encontrar causas para o que chama de “mal-estar” vivido pelos italianos no país. Ela procura apontar as causas insistindo em “gastos excessivos

Todo o mundo ama a Itália porque é velha, mas continua glamourosa. Porque ali se come e se bebe muito bem, mas raramente alguém é gordo ou ébrio. Mas hoje, apesar de toda a adoração estrangeira, a Itália parece não se amar. O que persiste por aqui é o “malessere”, o mal-estar, que implica um desânimo coletivo — econômico, político e social. Resumido numa pesquisa recente, os italianos se consideram, hoje, as pessoas menos felizes da Europa Ocidental.



Por Ian Fisher, para a revista Der Spiegel



“É um país que perdeu um pouco da motivação para o futuro”, disse Walter Veltroni, prefeito de Roma e possível futuro primeiro-ministro. “O que há é mais temor do que esperança.” Na maior parte, os problemas são tão antigos que ninguém sabe como mudanças podem ocorrer, e se isso ainda é possível.



Há tempos a Itália mapeou seu caminho para pertencer à Europa, lutando com política fraturada, crescimento irregular, crime organizado e um sentido tênue de nação. A frustração aumentou, já que, em alguns casos, as fraquezas pioraram, enquanto o mundo externo supera o país. Em 1987, a Itália celebrou paridade econômica com o Reino Unido. E agora a Espanha, que aderiu à União Européia em 86, pode ultrapassar a Itália.



O modo de vida italiano pouco tecnológico pode fascinar os turistas, mas o uso da internet e o comércio estão entre os mais atrasados da Europa, como salários, investimentos estrangeiros e crescimento. Pensões, dívida pública, gastos do governo estão entre os mais altos do continente. Dados mais recentes mostram uma nação mais velha e mais pobre. As empresas de pequeno e médio portes, no geral familiares, que durante muito tempo foram a espinha dorsal do país, lutam numa economia globalizada, em particular com a concorrência dos salários baixos da China.



Ronald Spogli, embaixador dos EUA com 40 anos de experiência na Itália, alerta que o país corre o risco de ver diminuído o seu papel internacional e suas relações com Washington. Os melhores amigos dos americanos, observou, são os parceiros comerciais, o que a Itália está deixando cada vez mais de ser. Com a burocracia e regras comerciais confusas, em 2004 os EUA investiram no país US$ 16,9 bilhões. Na Espanha, US$ 49,3 bilhões.



Há ligação entre o sistema político errante do país e a sensação de retrocesso. Pesquisa da economista italiana Luisa Corrado concluiu que o italiano é o povo menos feliz entre as 15 nações da Europa Ocidental. Os pesquisadores detectaram conexão entre a felicidade e diversos fatores, incluindo a confiança no mundo ao redor e, sobretudo, no governo. Na Dinamarca, a nação mais feliz, 64% das pessoas confiam no Parlamento. Na Itália, o índice é de 36%.



Dois livros de sucesso mostram desconfiança em relação aos grandes poderes que não pode ser controlada. A Casta vendeu um milhão de exemplares expondo os pecados da classe política italiana. Nem a presidência escapou — o gasto anual do gabinete é de US$ 328 milhões, quatro vezes o do Palácio de Buckingham. Camorra, que vendeu 750 mil cópias, trata da máfia napolitana. Os políticos, diz, deixam que a Camorra floresça, mantendo pobre o sul da Itália e tornando o crime organizado o maior setor da economia, segundo estudo recente.



Segundo Alexander Stille, professor da Universidade de Columbia e especialista da Itália, enquanto a economia cresceu, entre os anos 50 e 80, os italianos toleraram o mau comportamento dos líderes. Mas há anos o crescimento é lento e a vida está declinando. As estatísticas, hoje, mostram que 11% das famílias italianas vivem abaixo da linha de pobreza e 15% têm problemas para passar o mês com o salário recebido.



Os italianos raramente associam esta safra de líderes idosos à capacidade de mudança. São as mesmas pessoas que há mais de década negociam condições no poder. Em 2007, votaram pela saída de Silvio Berlusconi por não ter cumprido promessas de crescimento similar ao dos EUA e de oportunidades com base no mérito. Quando ele deixou o cargo, o crescimento econômico era zero.



O governo do primeiro-ministro Romano Prodi desapontou ao montar gabinete com 102 ministros. Prodi conseguiu avançar com dois pacotes de reformas e a economia está crescendo novamente. Mas os eleitores estão fartos e a oposição sabe disso. “As pessoas começam a ficar furiosas porque têm um governo que não faz nada”, disse Gianfranco Fini, líder da Aliança Nacional, de oposição.