Pesquisa traça panorama do trabalho terceirizado mundial
Estudo do economista Márcio Pochamann analisa estratégia das transnacionais para reduzir custos e aumentar os lucros; países periféricos vivem a contradição da geração de empregos terceirizados, mas com baixos salários em relação aos países de origem d
Publicado 14/02/2008 15:16
A Nike domina atualmente 33% de toda a produção mundial de calçados desportistas. No ano de 2004, a produção mundial da empresa foi realizada por mais de 600 mil trabalhadores dispersos em 51 países, embora somente 24 mil empregos sejam diretamente contratados, em sua maioria radicada nos Estados Unidos, para funções como marketing, design, pesquisa, direção, e etc. A Nike terceiriza quase 95% dos trabalhadores envolvidos com a produção, utilizando-se do excedente global de mão-de-obra em condições de trabalho inferiores às verificadas no país da localização da matriz.
Essas informações constam do estudo “A transnacionalização da terceirização na contratação do trabalho”. Trata-se de uma pesquisa preliminar sobre as transformações do trabalho no Brasil e no mundo, divulgada nesta terça-feira (12), por Márcio Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ligado ao Ministério do Planejamento. O economista da Unicamp destacou que a terceirização não gera emprego, apenas substitui o emprego direto. “O que gera emprego é a demanda na produção”, explicou. Essa substituição do trabalho direto está tomando traços mais fortes nos últimos anos.
A pesquisa coordenada pelo economista analisou o perfil de 2,4 bilhões de postos de trabalho em 145 países (83% do emprego mundial), contabilizados no ano de 2006. Cerca de 15,5% equivalem a empregos terceirizados, sendo 42 milhões de pessoas estão empregados na lógica das terceirizações conduzidas pelas transnacionais. O estudo aponta que são gerados 45 milhões de ocupações por ano, sendo que 36% das vagas são terceirizadas e 15% provêm da terceirização transnacionacional.
Do segmento de 76 mil empresas transnacionais que terceirizam o trabalho, apenas 29 corporações respondem por dois terços do total do faturamento mundial em 2006. As três maiores da terceirização são a Adecco (Suíça), as estadunidenses Manpower e a Kelly Services. Presente em 70 países, a Adeco gera 98% de seu faturamento fora de seu país de origem.
Aumentando a taxa de lucro
A terceirização segue a tendência de ampliar os lucros das transnacionais a partir da maior exploração do trabalho global. “Um trabalhador terceirizado no Índia, do setor de call-center, recebe 14% do que recebe um empregado no mesmo setor na Inglaterra”, argumenta Pochmann. Para o economista, no entanto, o salário do indiano não é necessariamente ruim, pois é preciso relacioná-lo no contexto asiático. O estudo aponta que, hoje, dois terços dos trabalhadores asiáticos são terceirizados.
Mas a questão salarial não é a única desvantagem do trabalhador terceirizado em relação aos funcionários nos países de origem das transnacionais. Esse tipo de trabalho nos países periféricos do capitalismo tem se notabilizado pelos desrespeitos às normas internacionais dos direitos trabalhistas e mesmo às legislações nacionais. Com as chamadas maquiladoras, as empresas reduzem ao extremo o custo de produção e as regiões onde se instalam essas empresas terceirizadas ficam com uma pequena parcela da taxa lucro globalizada das transnacionais.
Não por acaso, a migração para as nações mais ricas cresce em todo o planeta. De acordo com o estudo de Márcio Pochmann, no ano de 2005, a Organização das Nações Unidas (ONU) estimou o fluxo migratório em 191 milhões de pessoas (7,6% da força de trabalho mundial), enquanto em 1990 eram 80 milhões de migrantes (4,2% da força de trabalho do planeta). De modo geral, trata-se de pessoas bem qualificadas que saem de seus países de origem para disputar postos de trabalho nas nações ricas, “gerando uma grande contradição entre os esforços pelo avanço na educação e qualificação profissional e o deslocamento da mão-de-obra qualificada para outros países”.