Artigo: “O ganho de Aécio” – por Vittorio Mediolli
VITTORIO MEDIOLI
Dizem que quando uma relação não consegue levantar labaredas de empolgação no começo, é destinada a se apagar em breve. Se a lua-de-mel não arrebatar os acasalados, dizia minha avó, pode-se imaginar que o casamento fracassará em br
Publicado 01/04/2008 00:08 | Editado 04/03/2020 16:52
Passou a época em que se usava arranjar uniões entre dinastias reais. Os monarcas recentemente se curvaram a reconhecer necessário a uma união um substrato de atração pessoal, de sentimento e de amor, assim como acontece entre plebeus. Até para revigorar o conceito um tanto desgastado de monarquia.
Os métodos que os reis, depois de séculos, entenderam como ''antipáticos'', nas Minas Gerais de hoje passaram a ser adotados alegremente pela aristocracia política local. E, em breve, se confirmarão com a união, goela abaixo, em Belo Horizonte, do socialista Márcio de Lacerda, secretário de Desenvolvimento e ''todo poderoso'' da Cemig de Aécio, a um petista que possa agradar à militância.
Quando Lacerda, nas décadas de 60 e 70, militava na guerrilha junto com Fernando Pimentel, uma escolha como a dele levaria o carimbo de ''biônica''. E biônicos na verdade eram os prefeitos de capitais, indicados pelos militares.
Sua candidatura saberá resistir aos debates e provações de campanha? À ''bionicidade''? Empolgará os cidadãos da capital? Ainda, que experiência de candidatura ele possui para um desafio dessa envergadura? Ter sido tesoureiro de Ciro Gomes será suficiente? Como articulador da Transposição do São Francisco ganhará simpatias na capital de Minas?
Lacerda é a certeza de um debate apimentado. Porém, se emplacar, dará um ganho extraordinário para as candidaturas em 2010 de Pimentel a governador e de Aécio a presidente. Mas agora tudo não passa de ser um número na roleta. O lançamento de Lacerda facilita o lançamento de outras candidaturas que, talvez, o governador não consiga barrar. E se houver debate, o mais provável, é que haverá desgaste significativo para ele, padrinho da candidatura.
Ademais suas pretensões à prefeitura deverão ser levadas à frente nos ombros do prefeito do PT. Uma vitória ou uma derrota não será bem de Lacerda, mas de seus padrinhos. E, seja como for, a candidatura, caso desande, tem o poder de arrasar diretamente Pimentel.
Aécio não corre esse risco. Lançado o foguete Lacerda, o primeiro estágio a se descolar, pode-se supor, será o do governador. Pimentel, ao contrário, estará grudado até emprestar a última gota de combustível, já que se trata da sua sucessão e de manter os companheiros na PBH.
Qualquer que seja o desfecho, Aécio ganhará simpatia entre petistas, abalará a supremacia de Serra dentro do PSDB e reforçará sua amizade com Lula. Apresentará ao mundo suas facetas de conciliador, generoso, suprapartidário, talvez de estadista desinteressado. Poderá recorrer ao camarote para assistir os demais se digladiarem na arena e se eliminarem reciprocamente.
Pimentel, como um acorrentado, botará todas suas capacidades numa jogada de altíssimo risco. Se acertar, tudo bem. Mas, se perder (o que é provável), interromperá abruptamente uma trajetória fulgurante que precisava apenas de mais paciência para decolar. Aécio, não. Como astronauta de projetos galácticos, já parte com a certeza de alcançar metas importantes dentro e fora do seu partido, no PT e no PMDB, no baixo e alto clero, em Brasília, em Minas, entre lulistas e antilulista. Ele sabe como pilotar entre planetas.
Publicado no jornal O Tempo, do dia 01-04-2008