'Falsa Loura' parte do proletariado para debater aparências
As aparências enganam, diz a sabedoria popular. E o cineasta Carlos Reichenbach (Bens Confiscados, Dois Córregos) explora a fundo essa idéia em seu novo filme, Falsa Loura, que estréia na sexta-feira (18) em São Paulo, Rio de
Publicado 18/04/2008 18:35
Silmara (Rosanne Mulholland, de A Concepção) é a loura tingida. Apesar de ser operária empenhada, sofre preconceito por parte das amigas. Isto acontece em parte porque é muito bonita – e algumas insinuam que ela é também garota de programa – e também por parecer se colocar num patamar acima das outras.
Isso fica claro numa das primeiras cenas do filme, quando a colega de trabalho Briducha (Djin Sganzerla, prêmio de melhor atriz coadjuvante no Festival de Brasília do ano passado) quer ir com ela a um show de sua banda preferida, Bruno e seus Andrés. Mas Silmara a rejeita, dizendo que a garota é feia demais para freqüentar o clube.
Essa primeira imagem de Silmara, esnobe e superior, é desmontada aos poucos. A moça trabalha para sustentar o pai, um ex-presidiário desempregado (João Bourbonnais). Além disso, ela tenta mediar as relações entre o pai e o irmão homossexual (Léo Áquila), que não se falam. E, finalmente, Silmara colabora para transformar Briducha numa garota mais elegante.
Mas o calvário da falsa loura está apenas começando. Como esse é um mundo de aparências, o conto de fadas em que a vida de Silmara se transforma é apenas uma desculpa para Reichenbach explorar as formas como a realidade bate a porta, mais cedo ou mais tarde.
Silmara vai ao show e acaba se envolvendo com seu ídolo, o cantor Bruno de André (Cauã Reymond). O que para ela é um relacionamento sério, para ele é só mais uma aventura com uma fã bonita e pobre.
Mais tarde, ela se envolve com outro ídolo popular, o cantor romântico Luís Ronaldo (Maurício Mattar). Parece literalmente outro conto de fadas. Reichenbach não mede esforços para tornar onírica a atmosfera onde se dá o breve romance entre os dois. Mais uma vez, nada é o que parece.
Nas mãos de outro cineasta, o calvário de Silmara poderia tornar-se um melodrama excessivo e pesado. No entanto, Reichenbach, que também assina o roteiro, conduz os altos e baixos da vida da personagem com habilidade e humor.
Não há uma cena sem propósito no filme. Até momentos que parecem deslocados, mais tarde fazem sentido, como o fim de semana com Luís Ronaldo, quando a Falsa Loura parece caminhar para outros rumos.
Rosanne Mulholland, por sua vez, mostra a que veio. Aqui, o talento esboçado em A Concepção prova ser verdadeiro. Ela interpreta Silmara com toda a dignidade que a personagem merece. O diretor confessou, inclusive, que mudou o final do filme, pois não condizia com a interpretação que ela havia criado.
O que Falsa Loura lembra em seu final é que a aparência enganadora dos fatos não é necessariamente negativo – um saldo positivo pode surgir no final.
Silmara cresce como personagem, deixando transparecer o que há de bom por trás daquilo que parecia frio e egoísta. Depois das decepções, ela emerge como uma pessoa melhor. Enfim, Reichenbach despeja um mar de esperança em meio à descrença.