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Para imigrantes, crise econômica espanhola atravessa fronteiras

Os números divulgados na sexta-feira (25) confirmam que o desaquecimento econômico espanhol, que começou com um colapso no mercado imobiliário, está atingindo fortemente o exército de trabalhadores, na maioria não especializados, que chegaram da Amér

 



De uma renda combinada mensal de 1.400 euros (cerca de R$ 4.200), Rosa Dominguez e seu parceiro enviam 200 euros (em torno de R$ 600) por mês às suas duas filhas na Bolívia, onde moram com a avó.



A remessa, que quase não variou desde que o casal chegou a Madri, há dois anos, permite que as meninas, de oito e 10 anos, comam bem e eventualmente comprem um vestido novo.



As meninas, entretanto, seriam as primeiras a sofrer se um dos pais entrasse para as fileiras crescentes de imigrantes desempregados na Espanha. ''Obviamente, teríamos que enviar menos dinheiro'', diz Rosa, que ganha 400 euros (aproximadamente R$ 1.200) por mês como babá por meio período.



Os números divulgados na sexta-feira (25) confirmam que o desaquecimento econômico espanhol, que começou com um colapso no mercado imobiliário, está atingindo fortemente o exército de trabalhadores, na maioria não especializados, que chegaram da América Latina e da África nos últimos oito anos.



O desemprego entre trabalhadores não espanhóis cresceu 24%, para 504.700, no primeiro trimestre deste ano. Oficialmente, cerca de 15% da população ativa da comunidade está sem trabalho, sendo que a média nacional é de 9,6%.



As associações de imigrantes dizem que o número provavelmente é de mais de 20%, após contabilizar os que estão na Espanha ilegalmente. Enquanto o setor de construção continua encolhendo, pelo menos 100.000 outros imigrantes perderão o emprego até o final do ano, de acordo com um sindicato de patrões.



O apertar de cintos dos espanhóis, provocado por dívidas pesadas e custos crescentes de alimento e energia, significa que pessoas que nasceram no exterior e são serventes, assistentes de vendedores e trabalhadores do setor hoteleiro também serão demitidos, dizem os economistas.



A crise na Espanha começou a afetar o fluxo de remessas para países como Equador e Bolívia, cujas economias dependem pesadamente das transferências de dinheiro dos EUA e da Europa.



Apesar de um recorde em 2007, durante o qual o número de remessas registradas da Espanha cresceu 30% para 8,14 bilhões de euros (cerca de R$ 24,42 bilhões), desde outubro do ano passado houve um declínio mês a mês. As transferências de novembro, por exemplo, caíram 6% do mês anterior, enquanto dezembro apresentou mais 4% de queda.



Em janeiro deste ano, o total de remessas foi de 667 milhões de euros, 4,5% a menos que o mês anterior. ''Há muitos lares hoje onde apenas um adulto tem trabalho'', diz Aida Quenatoa, presidente da organização nacional de equatorianos em Madri. ''Obviamente, as remessas são as primeiras a cair, particularmente se você está tentando pagar uma hipoteca ou alguma outra dívida.''



Apesar do mercado de trabalho em deterioração, os imigrantes de países pobres relutam em voltar para casa. ''Por pior que aqui fique, sempre será melhor que o Equador'', diz Quenatoa.



Essa resistência, de acordo com muitos, está colocando pressão no governo socialista da Espanha para que aperte sua postura liberal em relação à imigração.



As primeiras medidas podem ser cortes e modificações nos esquemas criados para reunir famílias separadas pela imigração, que só no ano passado permitiram que mais de 120.00 estrangeiros se unissem aos pais e cônjuges na Espanha.



Celestino Corbacho, ministro do trabalho e imigração recentemente nomeado, disse nesta semana que o governo teria que ''refletir e fazer mudanças'' no programa.



Alguns estão pedindo uma fiscalização mais dura, inclusive a repatriação de imigrantes desempregados. A maior parte dos economistas diz que os planos do governo de ampliar as obras públicas e estimular os patrões a darem treinamento aos trabalhadores de construção para que entrem em outros setores farão pouco para aliviar o problema.



''Os primeiros a perderem seus empregos são precisamente os que têm maior dificuldade para encontrar novas posições'', diz Rafael Pampillón, principal economista da escola de administração chamada Instituto de Empresa em Madri. Ele advoga a repatriação gradual de estrangeiros desempregados por meio de programas acordados com seus países de origem.



''A Espanha precisa de dois ou três anos para ajustar seu modelo econômico para longe das atividades de baixo valor agregado, como a construção civil'', diz ele. ''Ao mesmo tempo, tem que enviar uma mensagem clara ao mundo de que não há mais trabalho aqui para pessoas sem qualificações.''



Fonte: Financial Times
Tradução: Deborah Weinberg  / UOL Mídia Global