Fetos sem cérebro: Temporão vai ao STF em defesa do aborto

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, reafirmou, nesta quinta-feira (4), sua posição favorável à interrupção da gestação em casos de anencefalia (fetos sem cérebro). O ministro participou da terceira audiência pública realizada no Supremo Tribunal

O ministro do STF, Marco Aurélio Mello, que é o relator da ação, também reforçou seu posicionamento favorável à interrupção da gravidez de anencéfalo. Ele avaliou o encontro como produtivo e anunciou um novo debate no próximo dia 16. “As exposições de hoje só robustecem o que imaginei inicialmente”, afirmou.



Para o ministro do Supremo, “as divergências representam um somatório de forças distintas, e que irão colaborar para que se chegue uma conclusão segura sobre o assunto”, ao mesmo tempo em que manifestou perplexidade com as palavras do médico especialista em ginecologia e obstetrícia, Dernival da Silva Brandão, que afirmou acreditar que o sofrimento das mulheres e de seus familiares durante uma gestação diagnosticada com anencefalia purifica o espírito.



Nove pessoas, entre profissionais de saúde e especialistas, falaram na audiência, com destaque para a presença do Ministro da Saúde. Temporão citou o exemplo de outros países no mundo que já autorizou a antecipação do parto de fetos anencéfalos, destacando que apoia a tese de escolha de cada mulher para lidar com a condição descrita. “Condição que esse tribunal tem a oportunidade histórica de proteger”, afirmou o ministro.
 


Situação limite



Temporão assegurou que o diagnóstico da má-formação fetal em casos de anencefalia é absolutamente seguro, que a doença é fatal em 100% dos casos e que a continuidade da gestação após o diagnóstico aumenta os riscos para a saúde da mãe em um percentual maior quando comparado uma gravidez normal.



Para o ministro, as escolhas morais envolvidas na interrupção da gestação de um anencéfalo não são as mesmas envolvidas na interrupção da gestação de um feto viável e, portanto, a antecipação do parto quando diagnosticada a anencefalia não deve ser tratada como aborto.



“A anencefalia é uma situação limite, absolutamente singular, onde a mulher vive uma contradição brutal e cruel de saber que carrega em seu corpo uma vida que não terá continuidade, que inevitavelmente falecerá logo após o nascimento”, disse.



Direito da mulher, dever do Estado



A representante do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), Jacqueline Pitanguy, que também participou da audiência pública, leu nota do CNDM sobre o assunto, em que enfatiza que “é direito das mulheres interromper a gestação em casos de anencefalia. É dever do Estado garantir esse direito.”



Ela enfatizou as palavras do ministro que lembrou que a aprovação da matéria não significará a obrigatoriedade da antecipação do parto, mas possibilitará o exercício do direito de escolha.



“Reconhecemos o direito de escolha como um ato de proteção e solidariedade à dor e ao sofrimento das mulheres que vivenciam uma gravidez de feto anencéfalo, anomalia incompatível com a vida em 100% dos casos”, disse Jacqueline, acrescentando que “o direito de escolha é uma questão de ética privada, não cabendo ao Estado a interferência em questões relacionadas a decisões sobre a saúde, quando esta é colocada em risco, e à intimidade, devendo, no entanto, respeitar a diversidade e garantir princípios fundamentais da nossa Constituição”.



Mais discussão



Na ação ajuizada em 2004, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), alega que “além de gerar risco para a mulher, carregar um feto “anômalo”, que ela sabe que não sobreviverá depois do parto, ofende a dignidade humana da mãe, prevista no artigo 5º da Constituição Federal”.



Especialistas favoráveis e contrários à antecipação do parto de bebês sem cérebro já defenderam seus pontos de vista nos dois primeiros dias de audiência pública, ocorridos em 26 e 28 de agosto.



O relator da ação que discute o tema, ministro Marco Aurélio, disse que após a conclusão das audiências públicas, haverá um espaço para alegações finais e que tanto a Procuradoria Geral da União (PGR) como a Advocacia Geral da União (AGU) serão convidadas novamente para se manifestar sobre a matéria. Também adiantou que a matéria deverá ser votada pelo Plenário do STF em novembro.



Também participaram da audiência representantes da Associação de Desenvolvimento da Família (ADEF), Therezinha Verreschi; da Escola de Gente, Claudia Werneck; da Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, Lia Zanotta; e Da Conectas, Eleonora Oliveira, além de outros médicos como Cinthia Macedo (Pediatra) e Elizabeth Cerqueira (Ginecologistas).



De Brasília
Márcia Xavier
Com agências