Luiz Gonzaga Belluzzo: Nada de novo na crise financeira

Brady, Eugene A. Ludwig e Paul Volker, figuras de proa do establishment financeiro americano, soltaram a voz em uníssono para recomendar medidas drásticas e urgentes para brecar o avanço da mais devastadora crise financeira desde a Grande Depressão dos

Os três figurões da finança reconhecem que o sistema financeiro americano exige uma reestruturação profunda que o habilite a funcionar de forma mais adequada no futuro. Mas agora, já, imediatamente, é preciso livrar o mercado “do enorme volume de lixo tóxico hipotecário que não será honrado nos termos acordados”.



Esses papéis não estão habilitados a suportar as enormes quantidades de instrumentos financeiros estruturados, alavancados muito mais do que 30 vezes. Até que seja adotado um novo mecanismo para extirpar esse tecido apodrecido do sistema, a infecção vai se disseminar, a confiança vai se deteriorar ainda mais e nós teremos de conviver com a mãe de todas as contrações de crédito.”



Brady, Ludwig e Volker propõem a criação de um “corpo governamental” encarregado de comprar os ativos depreciados por um fair market value e, (vejam bem…) “enquanto possível, capacitado a manter as pessoas em suas casas”.



Essa instituição governamental deve ter existência limitada e ser administrada por profissionais não-partidários. “Plus ça change, plus c'est la même chose.” Franklin Delano Roosevelt assumiu o governo dos EUA quando a Depressão de 1929 andava braba. Cuidou de salvar as grandes corporações e os bancos de seus próprios desvarios e preconceitos. A derrocada financeira foi enfrentada com o Emergency Bank Bill, de 9 de março de 1933, e pelo Glass-Steagall Act, de junho do mesmo ano. Esses dois instrumentos legais permitiram um maior controle do Fed sobre o sistema bancário.



Roosevelt facilitou o refinanciamento dos débitos das empresas, sobretudo da imensa massa de dívidas dos agricultores, estrangulados pela queda de preços. O “New Deal” utilizou a “Reconstruction Finance Corporation”, criada por Hoover em janeiro de 1932, para promover a reestruturação do sistema bancário e financeiro. Roosevelt impôs a separação entre os bancos comerciais e de investimento; criou a garantia de depósitos bancários; proibiu o pagamento de juros sobre depósitos à vista e estabeleceu tetos no pagamento de juros para os depósitos e prazo (o Regulamento Q sobreviveu até 1965).



Nos anos 1990, as proezas do capitalismo destrambelhado foram cantadas em prosa e verso. Os tempos não podiam ser mais benfazejos para os vigaristas, encantadores de serpente, pitonisas e oráculos de todo gênero. Os últimos acontecimentos protagonizados pelos mercados mostram que é preciso conter a mula-sem-cabeça da finança desregulada. Sob pena de os cidadãos serem atormentados periodicamente pelas tropelias da mão invisível.



* Luiz Gonzaga Belluzzo é professor titular de Economia da Universidade Estadual de Campinas.



Artigo publicado na Folha de S.Paulo (22/9)