Marc Lazar: medo facilita crise da esquerda européia

A desaprovação ao primeiro-ministro trabalhista Gordon Brown na Inglaterra, a dificuldade Partido Socialista (PS) francês e do Partido Social-Democrata (SPD) alemão em encontrar líderes populares e o aumento cada vez mais expressivo dos eleitos de dire

De fato, na década de 90, dos 15 países que formavam a União Européia, 11 tinham líderes esquerdistas no poder. Hoje, na Europa dos 27, apenas oito não elegeram a direita.



Nesta semana, o tema – cuja conclusão parece ser unânime entre os estudiosos – foi debatido em todos os jornais e revistas nacionais franceses, em decorrência da eleição cada vez mais embaralhada do próximo número 1 do PS. A tradicional esquerda francesa pena para escolher aquele que poderá fazer face a Nicolas Sarkozy no próximo pleito nacional.



O Partido Socialista não vence as eleições presidenciais desde 1988, tendo chegado a perder vergonhosamente para o líder da extrema direita Jean-Marie Le Pen em 2002. Para reverter as sucessivas derrotas, agora o partido começa a discutir a abertura para as idéias liberais, em uma guerra de posições que recém se iniciou e não tem data para acabar.



Em maio, o principal candidato à presidência do partido, o atual prefeito de Paris, Bertrand Delanoë, lançou um polêmico livro em que abre o debate sobre a renovação das idéias socialistas em vista da globalização irreversível do capitalismo. As críticas no seio do PS foram tantas que, em meio à campanha, Delanoë preferiu colocar o assunto embaixo do tapete e voltar a valorizar o papel do Estado.



Na Inglaterra, o Partido Trabalhista experimenta crise semelhante ¿ como atesta a impopularidade do primeiro-ministro Gordon Brown, que herdou de Tony Blair uma imagem já desgastada depois de dez anos de gestão à frente do governo.



Na Itália, o Partido Democrata deu vexame nas últimas eleições, ganhas pelo conservador e ícone da direita no país Silvio Berlusconi. Na Alemanha, hoje a esquerda hesita entre o radicalismo e o centrismo – nas terras germânicas, a esquerda parece não estar mais encontrando o seu lugar, mesmo após os populares sete anos de Gerhard Schröder na chefia de governo, encerrados em 2005, quando o social-democrata foi sucedido por Ângela Merkel, representante da direita.



Além disso, Irlanda, Bélgica, Polônia, Dinamarca, Grécia, Estônia, Eslovênia e Finlândia também não deram voz à esquerda em suas últimas eleições, sejam executivas ou legislativas, realizadas ao longo do último ano. A Espanha é um dos poucos a caminhar na contramão, mantendo o socialista José Luis Zapatero desde 2004 no poder.



No coração da crise, dois pontos são cruciais: a crise de identidade da esquerda face à economia de mercado e o momento por que passa a Europa, envolta ao medo de uma recessão, mas também inquieta por problemas do cotidiano como a segurança e o excesso de imigração.



– Os europeus hoje estão preocupados, com medo. A inquietude e o medo facilitam sem dúvida mais a ascensão da direita do que da esquerda ao poder, explica Marc Lazar, o especialista italiano em História da Esquerda na Europa e professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po).



– Ela tem um grande trabalho a fazer de análise e compreensão das transformações da sociedade, especialmente nas categorias mais populares. A esquerda tem um potencial eleitoral na Europa, tem talentos, tem energia, tem muito bons eleitos locais e regionais. Ela está longe de estar em agonia, morrendo. Ela está em uma situação difícil, diz Lazar.



Outro fator importante é a desconexão das lideranças da esquerda às camadas populares. Em outras palavras, a esquerda se elitizou, e com isso acabou perdendo eleitorado. Ao mesmo tempo, este eleitorado não vivenciou as mudanças estruturais que a esquerda prometia em campanha e que não cumpriu ao assumir o poder nos anos 90, contribuindo para a decepção ainda maior com os partidos socialistas e sociais-democratas. O modelo da terceira via, desenvolvido por Tony Blair e difundido na Europa, parece não ter atingido suas metas aos olhos dos antigos militantes.



“Hoje, vemos os limites desta terceira via, que se mostra muito tímida face aos choques gerados pelas desregulamentações massivas”, analisa Mario Telo, presidente do Instituto de Estudos Europeus de Bruxelas.


 


“Apesar da sensibilização da população para as questões tradicionalmente de esquerda como a preocupação com o meio ambiente, a luta contra a pobreza e agora a aparente falha de um modelo econômico, com a crise dos mercados financeiros norte-americanos, a esquerda européia não parece capaz de formular novos modelos de governo e de projetos”.



Fonte: JBOnline/Terra