Audiovisual cearense – Um novo horizonte?

Cinema cearense promete continuar em 2009 a trajetória de sucesso, polêmica e mistura de tradição e modernidade que marcou 2008

Falar na existência de um cinema cearense ainda causa polêmicas e discussões. Afinal, o cinema produzido no Estado tem características próprias ou segue modelos estabelecidos nacionalmente? Pergunta difícil, resposta vaga. Talvez o mais importante nem seja o debate sobre a questão, mas sim o fato de que o cinema, ou melhor, o audiovisual cearense tem dado a cara a tapa e mostrado o seu valor. Em 2008, algumas produções se destacaram, seja em festivais, caso de “Siri-Ará”, de Rosemberg Cariry, e “A Ilha da Morte”, de Wolney Oliveira, seja nas bilheterias (o bem-sucedido “Bezerra de Menezes – Diário de um Médico”), ou mesmo no campo das produções independentes, caso de “Praia do Futuro” e a ficção científica “Centopéia”.


 


Além dos filmes e vídeos que marcaram a produção do Estado esse ano, um grande passo para o audiovisual cearense em 2008 foi o 1º Congresso Cearense de Audiovisual. O principal resultado do evento foi uma Carta Aberta com uma série de reivindicações, protocolada junto à Secretaria de Cultura do Estado. Entre os tópicos mais importantes do documento, a idéia de criação do Plano Diretor do Audiovisual Cearense, marco fundamental para a orientação de políticas públicas voltadas para o setor audiovisual no Estado; e solicitação da manutenção, ampliação e lançamento do VII Edital Ceará de Cinema e Vídeo, considerado uma ferramenta fundamental para o desenvolvimento do audiovisual cearense.


 


“A carta contém mais de 250 assinaturas do Brasil inteiro, com a presença de nomes de repercussão nacional como Eduardo Coutinho e Roberto Farias”, conta Duarte Dias, presidente da Associação Cearense de Cinema e Vídeo (ACCV), organizadora do Congresso. “Uma das reivindicações é a retomada do Edital de Cinema e Vídeo, que não é lançado há dois anos e paralisou a produção local”, lamenta.


 


“Outro desejo é a criação de um Fórum Audiovisual para discutir todas as etapas do fazer audiovisual, bem como de políticas mais consistentes para o setor, gerando produtos que tenham sustentabilidade e capacidade de atingir o público”, almeja Duarte. “Em 2008, foram lançados nada menos do que seis longas. As pessoas estão fazendo, mesmo sem recursos. Não faltam talentos, o que falta é recursos”, acredita. “O Ceará tem condições de se tornar um importante pólo do audiovisual nacional, o que falta é os governantes perceberem que a cultura também está ligada à economia”, finaliza Duarte.


 


Políticas públicas


 


Em resposta à Carta Aberta redigida pela Associação Cearense de Cinema e Vídeo, o secretário da Cultura, Auto Filho, disponibilizou suas considerações sobre o documento, apontando pontos positivos e negativos da iniciativa. “Nossa análise da Carta Aberta da ACCV toma como fundamento o republicanismo democrático, princípio segundo o qual as políticas públicas têm sua legitimação última no fato de que o seu destinatário final deve ser o próprio povo e não os produtores culturais, já que é o povo quem financia, pela via dos impostos, toda a atividade estatal”, afirma Auto Filho.


 


Entre os pontos positivos da Carta Aberta da ACCV elencados pelo secretário Auto Filho, estão a disposição à promoção de um congresso anual para discutir publicamente a política do audiovisual e suas relações com o Estado, a sociedade e o mercado; o reconhecimento da necessidade de se formular um Plano Diretor do Audiovisual Cearense, elaborado com a participação de todos os interessados; e a intenção de propugnar por uma política pública de audiovisual de caráter transversal, com a inclusão de novas parcerias públicas (prefeituras) e dando prioridade à interiorização das ações e cobrindo toda a cadeia produtiva do setor (formação, produção, exibição, distribuição e preservação de acervos).


 


Mas, ao mesmo tempo que celebra a iniciativa da Carta Aberta, o secretário Auto Filho critica “uma retrógrada visão política e um diagnóstico de viés corporativo, superficial e equivocado da real situação do audiovisual cearense”. “Em pleno século XXI, a ACCV ainda permanece presa ao paternalismo estatal. Isso fica evidenciado quando, após lamentar, sem fundamento nos fatos, a falta de apoio público (leia-se mais dinheiro para os produtores), declara que considera o edital ‘Ceará de Cinema e Vídeo’ o ‘principal mecanismo de fomento do setor em nosso Estado’”, aponta o secretário.


 


“O diagnóstico da Carta Aberta é prisioneiro do corporativismo ególatra. Limita-se a reclamar e reivindicar tudo ao poder público. Em tese, há legitimidade na reivindicação corporativa. No entanto, essa legitimidade cessa quando entra em conflito com o interesse público ou quando, se atendida, afeta diretamente aos interesses legítimos das outras corporações”, acredita Auto Filho.


 


“O setor audiovisual do Ceará registra, em suas relações com o poder público, um grave e recorrente contencioso que a Carta parece não ter coragem de enfrentar. Aliás, não há nela a mais leve autocrítica. No debate público temos, pois, o dever ético de cobrar o rompimento desse silêncio obsequioso entre pares”, finaliza.


 


Filmagens e lançamentos


 


Polêmicas à parte, com ou sem Edital de Cinema e Vídeo – ausente da pauta de debate proposta pela Secult através da resposta à Carta Aberta da ACCV -, o audiovisual cearense prossegue em 2009 sua luta por continuar produzindo, distribuindo e exibindo suas obras. Entre nomes já consolidados no cenário audiovisual local e outros ainda em processo de formação ou reconhecimento, o próximo ano já tem uma série de produções na ponta da agulha para serem filmadas ou mesmo lançadas no circuito comercial ou de festivais.


 


Logo no início do ano, em janeiro, os alunos do Curso de Extensão em Audiovisual da Escola Pública de Audiovisual, vinculado ao equipamento cultural da Vila das Artes, exibem as produções audiovisuais resultantes da finalização do curso. Ao todo, quatro filmes, entre ficções e documentários concluídos em película, serão exibidos e marcarão o surgimento de uma nova geração de realizadores no cenário audiovisual cearense.


 


Nomes já consagrados também estão na ativa produzindo novos projetos, com destaque para os novos trabalhos de Glauber Filho, Wolney de Oliveira e Rosemberg Cariry. Depois do sucesso de “Bezerra de Menezes”, Glauber Filho faz mais um projeto sob encomenda para a ONG Estação da Luz, o longa “As Mães de Chico Xavier” e o projeto autoral “Linhas de Organdie”. Wolney de Oliveira lança “A Ilha da Morte” no circuito comercial. Já Cariry lança “Patativa do Assaré -Ave Poesia” e inicia a produção do longa “O Auto de Lampião no Além”.


 


DESTAQUES


 


Exibição dos filmes de conclusão do Curso de Extensão em Audiovisual da Escola Pública de Audiovisual, no final de janeiro, na Vila das Artes


 


´Selos´ (curta de ficção), de Gracielly Dias e Ythallo Rodrigues
´Vista para o Mar´ (documentário), de Pedro Diógenes e Rúbia Mércia
´Diz-me com quem andas´ (experimental), de Gilles Weyne e Thiago Daniel
´Nós em Fortaleza´ (documentário), de Fred Benevides e Taís Campos


 


Entre os roteiros de Michelline Helena em desenvolvimento destaca-se o curta ´Por que as Coisas são assim´, em parceria com Ivo Albuquerque, que será filmado em janeiro. Michelline está envolvida na direção de dois outros projetos: ´Açacinaram a Gramatika´, em fase de finalização; e ´Morro do Infinito´, com as filmagens concluídas


 


Wolney de Oliveira tem seu premiado ´A Ilha da Morte´ lançado em circuito comercial a partir de abril e, em paralelo, produz o documentário ´Altar do Cangaço´, com filmagens agendadas em oito estados brasileiros e em Paris


 


Depois da repercussão com ´Siri-Ará´, Rosemberg Cariry finaliza ´Patativa do Assaré – Ave Poesia´, com previsão de lançamento para março, mês que marca o centenário de Patativa, entre outros projetos


 


Glauber Filho faz outro projeto sob encomenda para a ONG Estação da Luz em ´As Mães de Chico Xavier´ e realiza o projeto pessoal ´Linhas de Organdie´, documentário sobre rendeiras do Aracati