Governo pede, mas spread não deve cair, dizem analistas
Após o Banco Central (BC) promover o maior corte na taxa básica de juros do Brasil em sua última reunião, em janeiro, o governo federal passou a criticar a taxa cobrada pelos bancos ao consumidor e empresas. O alvo da queixa tem nome: spread bancário,
Publicado 07/02/2009 19:55
Um relatório do BC, divulgado no último dia 27, apontou que o spread bancário subiu em dezembro do ano passado para o patamar mais alto desde agosto de 2003, resultado de uma redução de 13,9% para 12,6% ao ano (1,3 ponto) nas taxas de captação e de 44% para 43,2% ao ano no empréstimo (0,8 ponto).
Para Paulo Francini, diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp, “o governo deve obrigar, constranger e direcionar” para que os bancos diminuam a cobrança de taxas bancárias e façam empréstimos menos onerosos.
Na avaliação de Francine, o instrumento para tal deve ser a liberação dos depósitos compulsórios. “Os bancos terão acesso a medida que forem capazes de promover a expansão do crédito”. O “toma lá da cá”, recomendado pelo diretor da Fiesp, só aconteceria, portanto, se os bancos reduzissem o spread e favorecessem o crédito. “Existem induções possíveis que são mais efetivas e eficientes do que meros pedidos clamando por generosidade”, disse.
O governo pode ter meios de forçar mais os bancos a reduzirem suas taxas. “O maior cliente dos bancos é o governo”, lembra Joe Yoshino, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP).
Carlos Alberto Cordeiro da Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro avaliou que já há condições para a redução. “Os bancos reclamavam de quatro coisas: compulsório e taxa selic elevados, inadimplência alta e uma nova Lei de Falências”, lembra as antigas explicações para manter o spread bancário oneroso.
“Hoje a Lei de Falência foi aprovada e os bancos passaram a ter prioridade. O recolhimento do compulsório que chegou a ser 60% e atualmente é menos 40%. A taxa selic, que chegou a ser 40%, está na casa dos 12%”, fatores que, segundo ele, os bancos deveriam considerar para baixar as taxas.
Segundo Alexandre Assaf Neto, professor de Economia da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), a conta feita pelos bancos para calcular o spread bancário do sistema financeiro brasileiro permite com que sua redução imediata só seja possível por meio de uma queda na margem de lucro das instituições. ''Para diminuir esse spread do dia para a noite, da forma como o (presidente) Lula quer, só diminuindo o lucro. (…) O spread é muito complexo, não se baixa por decreto'', afirma.
Assaf aponta que, no caso dos bancos públicos, chamados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a liderar a redução do spread no País, a redução da margem de lucro aparece como a opção mais factível. ''Acho difícil que eles consigam ter uma estrutura de custos mais eficiente que um (banco) privado'', diz o professor.
Marcio Cypriano, presidente do segundo maior banco privado do País, o Bradesco, comentou nesta semana a possibilidade de as instituições públicas liderarem o movimento de queda do spread e fez um alerta. ''Se fosse negócio simples de conseguir, os bancos oficiais há muito tempo já teriam promovido a redução dos spreads'', disse. ''O governo tem 50% do sistema financeiro, com a Caixa e o Banco do Brasil. Se fosse simples, baixaria por decreto e o sistema todo acompanharia. Mas não é o que acontece'', completou o executivo.
O professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB) Roberto Ellery não exclui a possibilidade de Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal praticarem juros menores que os concorrentes privados. Contudo, Ellery alerta que este processo deve ser feito de forma cautelosa. Ele aponta que, por se tratarem de estatais, um eventual prejuízo será bancado pelo contribuinte.
''Até onde o spread pode baixar é uma decisão técnica. (…) Se os bancos baixarem demais o spread, não conseguindo cobrir seus custos, incluindo o risco do crédito, como se trata de um banco público, essa conta a gente já sabe quem vai pagar'', alerta.
De fato, nesta semana, ambas as instituições estatais anunciaram redução em suas taxas praticadas. Mas esse movimento não deve ser seguido pelos bancos privados. Sem uma reforma tributária ou queda acentuada da Selic, estas empresas teriam que aceitar mexer em suas margens de lucro. ''Nas palavras do ministro da Fazenda, o Banco do Brasil não foi feito para dar lucro. Mas duvido que alguém vá comprar ações do Bradesco pensando em ajudar o crédito no País ao invés de obter lucros'', diz Assaf.
Medidas de longo prazo
Além de mexer na margem de lucro, os especialistas também apontaram outras medidas de médio e longo prazo que poderiam ajudar na redução do spread bancário no País. Uma delas é a queda acentuada da taxa básica de juros, hoje em 12,75% ao ano. Para o professor de Economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Antonio Corrêa de Lacerda, uma redução mais acentuada da Selic faria com que os bancos abandonassem o investimento seguro e rentável em títulos públicos para voltar a buscar ganhos e competir no mercado de crédito ao setor privado.
''Mas é necessário também reduzir os impostos vinculados ao crédito e também reduzir ainda mais o (depósito) compulsório'', afirmou o professor da PUC.
Segundo Ellery, da UnB, além da estrutura tributária brasileira, há uma parte ''razoável'' do spread bancário que cobre os riscos de inadimplência por parte do concessor do crédito. ''No Brasil nosso sistema legal facilita a vida do devedor'', explica. ''Existe uma questão legal (na questão da inadimplência). O banco não é uma agência para retomar automóveis e imóveis de pessoas que não pagam seus financiamentos, há um custo nisso'', diz Assaf Neto. ''Vai ter que haver uma mudança estrutural'', completa.
Fonte: Invertia