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Governador de SC pode ser o próximo a ser cassado pelo TSE

Desde que voltou do recesso forense, em fevereiro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o mandato de dois governadores por abuso de poder econômico e político e de um deputado federal por caixa 2. Se depender da vontade dos ministros em analisar

Na semana passada, o caso teve o que deve ser sua última tramitação no TSE antes de chegar à análise definitiva dos ministros em plenário. Após mais de seis horas de julgamento do processo do governador do Maranhão, Jackson Lago (PDT), os membros da corte eleitoral apreciaram rapidamente um embargo de declaração protocolado pelos advogados de Luiz Henrique. Eles pediam ao TSE a inclusão de novas provas no processo. Por unanimidade, o recurso apresentado pelo peemedebista foi rejeitado.


 


O acórdão dessa decisão está previsto para ser publicado na edição de hoje (11) nos diários oficiais da Justiça e da União. Antes mesmo da publicação, a defesa do governador de Santa Catarina promete entrar com um novo recurso, desta vez no Supremo Tribunal Federal (STF), para conseguir a inclusão das novas provas. Entretanto, outros dois pedidos feitos ao STF, um pelo próprio Luiz Henrique, outro pelo vice-governador Leonel Pavan (PSDB), foram negados pela corte suprema.


 


Entretanto, para o recurso chegar ao STF, deve antes passar pelo crivo do presidente do TSE, ministro Carlos Ayres Britto. Ele é quem decidirá se o processo subirá ou não para o Supremo. Isso porque o RCED é um instrumento jurídico característico da corte eleitoral, tendo toda sua tramitação na mesma instância. Se ele negar – o que não aconteceu nas outras duas oportunidades – a ação irá a julgamento em plenário.


 


Santa Catarina em ação


 


Assim como os outros dois governadores já cassados, o peemedebista é acusado de abuso de poder econômico e político nas eleições de 2006. A coligação derrotada na época, encabeçada pelo ex-governador Esperidião Amin (PP), argumenta que Luiz Henrique teria se beneficiado do uso indevido de meios de comunicação social, propaganda ilegal do governo em jornais de todo o estado e emissoras de rádio e televisão, com despesas pagas pelos cofres públicos, e objetivo de promoção pessoal.


 


Quando decidiu concorrer à reeleição, Luiz Henrique renunciou ao cargo de governador em março de 2006. Assumiu, em seu lugar, o vice Eduardo Pinho Moreira, também do PMDB. Na época, o peemedebista disse que saía do mandato para que a eleição fosse limpa e corresse em igualdade. O então governador buscava uma vitória inédita na política catarinense. De 1982, quando os brasileiros voltaram a eleger diretamente os governadores dos seus estados, fato que não acontecia desde a década de 1960, até 2002, o comandante do Executivo não era reconduzido ao cargo ou fazia seu sucessor.


 


Luiz Henrique começou a campanha em 2002 muito atrás nas pesquisas de opinião. Os levantamentos dos institutos apontavam para uma vitória fácil do então governador Esperidião Amin no primeiro turno. A eleição acabou indo para o segundo turno por um pequeno número de votos. Nas três semanas que dividiam os pleitos, o que se viu foi o peemedebista colando sua imagem em Lula, candidato pela quarta vez à Presidência da República, apesar de seu partido fazer parte da chapa de José Serra (PSDB). O tucano, por sua vez, teve Amin como aliado em Santa Catarina.


 


O diretório estadual do PT, que lançou o ex-ministro da Pesca José Fritsch como candidato no primeiro turno, entrou forte na campanha. Analistas políticos de Santa Catarina avaliaram, na época, que a aliança ocorreu mais pelo inimigo em comum – Amin – do que por semelhanças programáticas. O apoio de Lula foi tão forte que o petista chegou a fazer em Florianópolis o último comício de sua campanha. LHS, como é conhecido no estado, venceu por cerca de 40 mil votos de vantagem.


 


Na visão dos derrotados, as irregularidades começaram um ano depois de o peemedebista tomar posse. Seu grande projeto de governo era a descentralização das decisões. Prometia a criação de secretarias de desenvolvimento regionais, que teriam a função de controlar o orçamento e a execução de obras em cada região. Com o início das realizações de governo, coube à Secretaria de Informação a publicidade dos atos. O órgão criou, então, a propaganda “Santa Catarina em ação”, que começou a ser veiculada em 2004 e terminou em junho de 2006.


 


A secretaria formou um pacote para divulgar as ações do governo peemedebista. Programas de rádio, peças publicitárias impressas e inserções na televisão faziam parte da “Santa Catarina em ação”. “Diariamente as emissoras de televisão e de rádio transmitem aos catarinenses, em comerciais de 90 segundos, programetes na forma de noticiários, produzidos como se emissora comercial fosse, trazendo, além das notícias sobre as realizações do Governo, os apresentadores em animados diálogos enaltecedores da qualidade e os efeitos das obras e ações, em verdadeira apologia ao governante”, diz a denúncia, assinada pelo advogado Gley Fernando Sagaz.


 


“Para se ter uma idéia da gravidade da propaganda do governador – candidato à reeleição –, bem como sua vinculação à campanha eleitoral basta notar que o apresentador das ‘notícias’ através da televisão e do rádio, é o mesmo apresentador da campanha eleitoral de, com uma substancial diferença, agora às expensas do erário catarinense, desempenhando a mesma função à época desenvolvida”, escreveu o advogado.


 


A eleição de 2006 parecia uma refilmagem do pleito anterior. O governador no cargo disparado nas pesquisas de intenção de voto, enquanto o principal adversário vinha bem atrás. Assim como Amin em 2002, LHS esperava vencer no primeiro turno, o que acabou não acontecendo. Desta vez, foi o pepista que contou com apoio do PT, articulação feita pela senadora Ideli Salvatti (PT-SC). Apesar das diferenças históricas, ambos tinham um adversário em comum. Mas o peemedebista conseguiu tornar-se o primeiro político catarinense a se reeleger como governador do estado.


 


Jornais


 


As peças publicitárias “Santa Catarina em ação” não são as únicas irregularidades cometidas pelo peemedebista, na opinião da coligação encabeçada por Amin. Eles apontam que, seis dias antes do segundo turno, o governador Eduardo Pinho Moreira enviou projeto de lei à Assembléia Legislativa isentando do IPVA as motocicletas registradas no estado, o que beneficiaria mais de 300 mil contribuintes.


 


Outro caso são os encartes publicados em jornais do interior de Santa Catarina. De acordo com a denúncia, começou em 2005 a publicação de suplementos especiais “exaltando o governador”. Um desses periódicos, segundo a ação, trazia a seguinte chamada de capa: “Adorado pelos catarinenses, Luiz Henrique se projeta para o último ano de governo, mas promete voltar ano que vem com gás total se for reeleito pelo povo catarinense. (…) Um de seus projetos mais comentados de seu governo, a descentralização, mudou o Estado para melhor. (…) Muito já foi feito por esta terra e muito vai ser feito nas mãos de quem veio para mudar”.


 


De acordo com a ação proposta pelo PP, “não há como silenciar, muito menos aceitar passiva e alienadamente” que os cadernos continham apenas os registros noticiosos das ações do governo. A acusação aponta o envolvimento da Associação de Jornais do Interior (Adjori) no caso. A entidade tinha, na época, 143 jornais associados com uma tiragem média de 3 mil exemplares. Juntos, as publicações ultrapassam as 400 mil unidades, número muito superior à soma da circulação dos quatro maiores jornais catarinenses – hoje próximo aos 130 mil.


 


Nos autos, a defesa de Luiz Henrique refuta todas as acusações. Diz que o governador renunciou ao cargo justamente para participar do pleito em igualdade de condições, rejeitando a tese de que a “Santa Catarina em ação” tenha qualquer caráter eleitoreiro. Sobre o projeto do IPVA, jogam a culpa para cima de Eduardo Pinho Moreira. Por ele estar no governo, responsabilizar LHS sobre a isenção do tributo aos donos de motocicletas era descabida.


 


Sobre os encartes, os advogados da coligação do peemedebista afirmam que o material teria sido produzido “por iniciativa e sob a responsabilidade dos respectivos jornais, dentro do livre direito de manifestação de pensamento”. Luiz Henrique disse que, além de “inexistir qualquer prova de que houve aplicação indevida de dinheiro público nos jornais”, é normal que os ocupantes de cargos públicos estejam mais expostos à mídia, tanto para críticas como para elogios. O Congresso em Foco tentou o contato com os advogados de defesa nesta terça-feira, mas não obteve resposta.


 


Em entrevista ao jornal Diário Catarinense, publicada no último domingo, o governador de Santa Catarina disse que “é de estarrecer que eu possa estar sendo acusado de abuso de poder sendo que eu não estava exercendo o poder”. Segundo o peemedebista, o TRE por duas vezes rejeitou estas alegações e é incrível que ainda se mantenha um clima de que elas possam ter sucesso no TSE. “Eu não tenho dúvida nenhuma que os autos do processo vão confirmar a vitória acachapante que tive aqui no TRE duas vezes”, afirmou Luiz Henrique.


 


Histórico


 


Aos 69 anos, Luiz Henrique é um dos últimos peemedebistas históricos de Santa Catarina. Militante do antigo MDB durante a ditadura militar, fazia oposição aos generais que comandaram o país entre 1964 e 1985. apesar da sua atuação, foi acusado pelo adversário Amin nas disputas pelo governo em 2002 e 2006 de ser seguidor do regime. Isso porque um dos primeiros empregos de LHS foi no extinto Departamento de Ordem Política e Social (Dops), de onde acabou afastado, em 1961, por conta de sua postura política. 


 


Cinco anos depois, foi morar em Joinville, cidade no norte de Santa Catarina onde construiu sua carreira política. Foi presidente do diretório municipal do partido em 1971. Em 1974, elegeu-se para o primeiro mandato, como deputado estadual. LHS, então, emendou uma série de mandatos: cinco como deputado federal e três como prefeito de Joinville.


 


Na segunda vez que esteve na Câmara dos Deputados, Luiz Henrique teve a sorte de integrar a seleta “turma do poire”, grupo de políticos que se reunia em torno do então presidente do PMDB, Ulysses Guimarães, para tomar aguardente de pera no restaurante Piantella, em Brasília. Até hoje o governador catarinense explora em discursos a amizade que teve com o “senhor diretas”.


 


Os mandatos como deputado federal garantiram seu maior período de exposição nacional. Primeiro, ficou conhecido em todo o país como “rei da sucata” no período que foi ministro da Ciência e Tecnologia, entre 1987 e 1988 e defendia posições nacionalistas. O apelido era uma brincadeira com a novela Rainha da sucata, folhetim da Rede Globo estrelada por Regina Duarte. Depois, entre 1993 e 1996, foi presidente nacional do PMDB. Antes, liderou a bancada do partido na Câmara e no Congresso e ocupou a primeira secretaria da Mesa Diretora.


 


Virada de jurisprudência



 
A análise do RCED 703 não mexeu apenas com o futuro político de Santa Catarina. Ele foi responsável também pelo que Ayres Britto chama de “virada de jurisprudência”. Isso aconteceu por conta de uma sugestão de um dos membros da corte, ministro Marcelo Ribeiro, acatada pela maioria do plenário. A partir daquele momento, apesar de não existir referência na jurisprudência do TSE, o vice também deveria fazer parte do processo. A partir desse momento, Leonel Pavan teria direito a se manifestar, apresentar provas e pedir oitivas de testemunhas.


 


LHS estava na berlinda até então. Seu julgamento no TSE começou em 9 de agosto de 2007, com a apresentação do voto do ministro José Delgado, na época relator do caso. Delgado fundamentou seu voto nas provas constantes dos autos que, segundo ele, confirmam o entendimento manifestado pelo voto vencido do relator no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-SC).


 


Meses antes, por 4 votos a 2, os juízes do TRE de Santa Catarina consideraram que houve abuso no uso da comunicação, mas acabou não interferindo no resultado das eleições.


 


Após a manifestação de Delgado, o julgamento foi suspenso pelo pedido de vista do ministro Ari Pargendler. O processo ficou parado até 14 de fevereiro do ano passado. Pargendler considerou, na época, que a propaganda “foi maciça”. O ministro disse na oportunidade que “há prova farta nos autos que, à guisa de publicidade institucional, o governo de Santa Catarina favoreceu a candidatura de Luiz Henrique da Silveira, mediante promoção de seus feitos enquanto governador do Estado”.


 


Votou em seguida o ministro Gerardo Grossi, que também acompanhou o relator. Disse que os jornais têm toda a liberdade de aderir a uma ou a outra campanha. “É um caso de simpatia”, afirmou. Mas salientou que não poderia presumir que a propaganda da qual o governador foi acusado seja indiretamente custeada com recursos públicos. Por ser um caso polêmico, surgiu mais um pedido de vista. Desta vez, Marcelo Ribeiro pediu mais tempo para analisar o recurso.


 


Ao apresentar seu voto, uma semana depois, Ribeiro sugeriu a citação do vice Pavan no processo. Com a adesão de parte do plenário, ficou criada a figura do liticonsorte passivo na jurisprudência do TSE. Ayres Britto, que na época era somente membro da corte e foi voto vencido neste dia, comenta até hoje que “houve uma virada de jurisprudência” em um caso onde não havia a necessidade de ouvir o vice.


 


Moribundo



 
Os aliados de LHS comemoraram em Santa Catarina. A avaliação geral era de que a ação proposta pelo PP tinha acabado. O próprio governador, em entrevista à radio CBN Diário, de Florianópolis, afirmou que “esse processo vai se arrastar como um moribundo”. O termo entrou para o imaginário político catarinense, sendo usado até hoje por uma série de colunistas para se referir ao caso.


 


Porém, não foi isso que se viu. A composição da corte mudou quase que completamente. Dos sete ministros presentes ao julgamento inicial, somente dois permanecem no TSE: Ayres Britto e Ribeiro. A ação mudou de relator e ficou com o ministro Felix Fischer. Pavan foi citado, listou testemunhas e apresentou suas alegações. Mas, ao mesmo tempo, os advogados da coligação vencedora em 2006 entraram com uma série de recursos na Justiça Eleitoral e no STF.


 


Fischer já negou oito recursos do peemedebista e do vice tucano. Eles pediam desde a invalidação do processo até a produção de novas provas. Segundo funcionários do TSE, o ministro já está pronto para votar o caso. Ele só espera a entrada do embargo de declaração ao RCED para colocar o processo em pauta. Quando isso acontecer, avaliam adversários de LHS, será a prova que o “moribundo está bem vivo”.


 


Fonte: Congresso em Foco