Messias Pontes – Gilmar Mendes é uma ameaça à democracia

A parcialidade com que trata assuntos complexos e conflitantes, o posicionamento em defesa do indefensável, a arrogância e petulância com que se refere ao Chefe de outro Poder da República e, notadamente, a criminalização dos movimentos sociais, não tem d

A intransigente defesa de bandido de colarinho branco, como o banqueiro Daniel Dantas; a perseguição a delegados federais, juízes e procuradores federais que teimam em fazer cumprir o preceito constitucional de que todos são iguais perante a lei; a omissão diante de crimes cometidos por latifundiários e grileiros;  e – o que parecia inacreditável – a defesa dos crimes hediondos da ditadura militar no período de 1964 a 1985, chamando os democratas de terroristas, já diz bem quem é esse senhor e o perigo que ele representa para a nação brasileira, pois é o legítimo representante das elites econômicas conservadoras e da direita mais raivosa na mais alta Corte de Justiça do País.



Confesso que nada do que vem fazendo o ministro Gilmar Mendes me surpreende. Quando ele saiu, raivoso, condenando a prisão do dono banco Opportunity e demonizando o delegado da Polícia Federal, Protógenes Queiroz, e o juiz da 5ª Vara Federal de São Paulo, Fausto De Sanctis, por ter ordenado por duas vezes consecutivas a prisão do orelhudo Daniel Dantas, eu já esperava; quando ele condenou o uso de algemas em bandido de colarinho branco, eu já esperava; quando ele disse que chamaria o presidente Lula às falas, eu já esperava; quando ele criminaliza os movimentos sociais, eu já esperava; quando ele chamou de terrorista a mim e a centenas de milhares de brasileiros que lutaram contra a ditadura militar, eu já esperava.



Se eu não tenho bola de cristal, como já esperava toda a parcialidade e esse comportamento indigno do presidente do STF? Simplesmente porque eu li o artigo do grande jurista Dalmo de Abreu Dallari publicado na Folha de São Paulo em 8 de maio de 2002 e procurei conhecer melhor o seu passado e a acompanhar a sua atuação no STF, notadamente depois que foi guindado à condição de presidente.



Preocupado com o que poderia acontecer, pois conhecia muito bem essa figura, e mais ainda quem o indicaria, como realmente o indicou, no caso o Coisa Ruim, o professor, jurista e cidadão brasileiro Dalmo Dallari procurou chamar a atenção dos brasileiros para o iminente perigo que representaria Gilmar Mendes no Supremo Tribunal Federal.



Naquele artigo, Dalmo Dallari afirmava que “Se essa indicação vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional. Por isso é necessário chamar a atenção para alguns fatos graves, a fim de que o povo e a imprensa fiquem vigilantes e exijam das autoridades o cumprimento rigoroso e honesto de suas atribuições constitucionais, com a firmeza e transparência indispensáveis num sistema democrático”.



Disse naquela ocasião o grande jurista que “Além da estranha afoiteza do presidente – pois a indicação foi noticiada antes que se formalizasse a abertura da vaga -, o nome indicado está longe de preencher os requisitos necessários para que alguém seja membro da mais alta corte do país”. Frisou ainda que Gilmar Mendes, que foi assessor muito próximo do outro Fernando, o Collor de Mello, especializou-se em “inventar” soluções jurídicas no interesse do governo.



Quando era advogado-geral da União, no governo do Cosa Ruim, sofreu muitas derrotas no Judiciário, e, depois de mais uma derrota, recomendou aos órgãos da administração que não cumprissem decisões judiciais. “Medidas desse tipo, propostas e adotadas por sugestão do advogado-geral da União, muitas vezes eram claramente inconstitucionais e deram fundamento para concessão de liminares e decisões de juízes e tribunais, contra atos de autoridades federais”.



Diz ainda que, “indignado com essas derrotas judiciais, o dr. Gilmar Mendes fez inúmeros pronunciamentos pela imprensa, agredindo grosseiramente juízes e tribunais, o que culminou com sua afirmação textual de que o sistema judiciário brasileiro é um manicômio judiciário”…   “E não faltaram injúrias aos advogados, pois, na opinião do dr. Gilmar Mendes, toda liminar concedida contra ato do governo federal é produto de conluio corrupto entre advogados e juízes, sócios na ‘indústria de liminares’”.



O comportamento de Gilmar Mendes o impede de querer “arrotar” ética e desqualificar lideranças e movimentos sociais. A esse respeito, Dalmo Dallari foi contundente: “A par desse desrespeito pelas instituições jurídicas, existe mais um problema ético. Revelou a revista ‘Época’ (22/04/02, pág. 40) que a chefia da Advocacia Geral da União, isto é, o dr. Gilmar Mendes, pagou R$ 32.400,00 ao Instituto Brasiliense de Direito Público – do qual o mesmo dr. Gilmar Mendes é um dos proprietários – para que seus subordinados lá fizessem cursos. Isto é contrário à ética e à probidade administrativa, estando muito longe de se enquadrar na ‘reputação ilibada’, exigida pelo artigo 101 da Constituição, para que alguém integre o Supremo”.



Preocupado com o fato de que é o SFT quem dá a última palavra sobre a constitucionalidade das leis e dos atos das autoridades públicas, e terá papel fundamental na promoção da responsabilidade do presidente da República pela prática de ilegalidade e corrupção, o professor Dalmo Dallari concluiu enfaticamente o seu artigo afirmando:



“A comunidade jurídica sabe quem é o indicado e não pode assistir calada e submissa à consumação dessa escolha notoriamente inadequada, contribuindo, com sua omissão, para que a argüição pública do candidato pelo Senado, prevista no artigo 52 da Constituição, seja apenas uma simulação ou ‘ação entre amigos’. É assim que se degradam as instituições e se corrompem os fundamentos da ordem constitucional democrática”.  Apesar de nove senadores terem votado contra a indicação de Gilmar Mendes, fato inédito na história, o rolo compressor tucano-pefelista impôs a aprovação deste que nunca deveria ter passado sequer na calçada do Supremo.



Nos últimos meses é comum manifestações de repúdio ao ministro Gilmar Mendes. Delegados da Polícia Federal, juízes e procuradores federais e dezenas de entidades as mais diversas têm levado ao conhecimento público – apesar da omissão da grande mídia conservadora, venal e golpista – manifestações de desagravo contra o presidente do STF.



Na manhã de ontem (10.03.09), pelo menos 400 mulheres militantes da Via Campesina participaram de um protesto em frente ao STF, em Brasília para repudiar as últimas declarações do presidente do Supremo, que cobrou ação do Ministério Público para apurar o repasse de verbas federais ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).  “Estamos no Supremo fazendo essa denúncia pública e dizendo não à criminalização dos movimentos sociais parque é um direito do povo se organizar”, afirmou a líder camponesa Maria José da Costa.



É oportuno observar que o ministro Gilmar Mendes nunca veio a público condenar a institucionalização da corrupção no desgoverno tucano-pefelista comandado pelo Coisa Ruim, a quem serviu servilmente; tampouco condenou o trabalho escravo que se verifica principalmente nos estados do Norte; não se tem notícia de pedido de verificação  das denúncias de grilagem de terra em quase todo o País e em especial no Norte; o “paladino da ética” nunca condenou os vultosos recursos públicos destinados ao agronegócio; e por aí vai.



O que se pode afirmar sem medo de ser injusto ou leviano é que realmente o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro  Gilmar Mendes, é uma grande ameaça à democracia em nosso País.



Messias Pontes é jornalista e Colaborador do Vermelho/CE