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Argemiro Ferreira: equipe é o maior desafio a Obama

Parece bem claro a esta altura que o desafio maior à agenda econômica do presidente Obama não parte do conservadorismo republicano, que se entrega ao ridículo de identificar uma marcha do governo rumo ao regime comunista de estilo soviético. O desafio

Um veterano colunista do Washington Post, E. J. Dionne Jr, ajuda a entender o quadro. Foi didático e oportuno, há dias, ao expor os dois lados desse confronto: o de Tim Gheitner, secretário do Tesouro, com larga experiência em Wall Street; e o dos ganhadores do Nobel de economia Paul Krugman, colunista do New York Times, e Joseph Stiglitz, professor de Columbia e ex-economista-chefe do FMI.


 


Tento passar aqui a análise dele. O grande mistério da agenda do governo, para Dionne, é se o casamento simbólico da ousadia com a cautela será uma receita realmente maravilhosa, com as coisas em seus lugares perfeitos, ou se no final vai se revelar um produto comparável àqueles da imaginação do cartunista Rube Goldberg, que criava engenhos complicadíssimos para propósitos insólitos e incertos.



As contradições, ponto por ponto



Os propósitos fiscais e orçamentários de Obama, diz Dionne, são ousados. Seu compromisso firme de fazer este ano a reforma da assistência à saúde é digno e corajoso. Mas o plano de socorro aos bancos expõe reverência pelo sistema financeiro, temor de distúrbios adicionais num mercado já abalado e esperança devota de que a situação econômica não seja tão má como temem certos economistas (como Stiglitz e Krugman).



Agressivo frente à indústria automobilística, o governo assumiu o controle efetivo da GM, ao forçar a demissão do executivo-chefe Rick Wagoner. O ultimato à Chrysler foi para fundir-se com a Fiat ou morrer. Tudo no contexto da cautela em torno do propósito último do governo. Limites estritos foram impostos, sobre prazos e recursos disponíveis no socorro a empresas. Ficou claro o objetivo final de reconstruí-las para competir no mercado.



Autoridades tiveram medo de faltar apoio a tal enfoque duplo. Motivo: dava-se à indústria interna menos ajuda do que ela esperava – e a ação envolvia muito mais intervenção do que a maioria dos advogados do livre mercado pareciam capazes de digerir. As avaliações iniciais ficaram acima do esperado, sugerindo que a curto prazo o espetáculo da corda bamba do governo tinha funcionado.



Para Dionne, análises daquilo que Obama estaria pretendendo levam rapidamente a frases carregadas de contradições. Ele quer uma regulamentação mais rigorosa do mercado – a fim de salvá-lo. Acha que neste momento é necessário aumentar o tamanho do governo, caso se queira voltar mais tarde a um sistema econômico menos restrito. Pode-se dizer que usa meios coletivistas para fins capitalistas.



…E a combinação de idéias opostas



A análise de Dionne citou uma afirmação feita por Obama na quarta-feira, durante a entrevista coletiva (com Gordon Brown) em Londres: “Não podemos cair de novo nos debates estéreis e nas antigas divisões”. A alternativa para ele seria então uma combinação nova de idéias opostas. E o socorro aos bancos é a questão onde os desafios enfrentados por esse método aparecem mais dramaticamente.



O debate sobre o plano tem suas raízes em três desacordos. O mais importante é se os grandes bancos são solventes ou insolventes. Para Geithner, os ativos tóxicos nos potfólios deles estão temporariamente subvalorizados numa economia má. Ou seja, vão supostamente valer mais quando a economia melhorar – o que, por sua vez, significaria que os bancos, na verdade, não estão quebrados.



Krugman, que Dionne encara como o mais proeminente crítico de Geithner, julga os bancos insolventes. Acha que a economia vai melhorar mais lentamente do que imagina o secretário do Tesouro. Muitos dos ativos tóxicos, para ele, são apenas “lixo”. Além disso, Krugman considera inevitável a tomada temporária de alguns bancos pelo governo, o que fará a economia mover-se mais rapidamente.



Na visão de Geithner, a tomada do controle dos bancos será mais difícil do que acham os partidários da medida – e pode tornar a recuperação econômica mais lenta. Por isso ele prefere enfoque mais cauteloso: governo e investidores privados comprariam os ativos tóxicos antes de serem decididas medidas mais radicais.



Entre o coração e a cabeça



Quanto aos outros dois desacordos, os críticos do plano do governo, em especial Stiglitz, acreditam que ele envolve subsídios oficiais para investidores privados – e que serão muito mais elevados, deixando os contribuintes muito mais expostos. E há ainda uma divergência de sensibilidade. Geithner simplesmente demonstra muito mais confiança do que Krugman no trabalho do sistema financeiro.



Krugman criticou o governo recentemente por se deixar fascinar pela “mística do mercado”. E ainda por sobrevalorizar as supostas competência e know how dos “feiticeiros” duvidosos de Wall Street, que adoram “tirar coelhos de cartolas” e já acumularam no arsenal mais “truques” e “mágicas” do mercado. Krugman parece ter tanta razão de temer a proximidade do governo com a visão de Wall Street como Stiglitz de se preocupar com os subsídios no plano oficial.



A questão central, se os bancos estão insolventes, é enlouquecedoramente difícil de resolver, diz Dionne. “Se Geithner estiver certo, ele nos levará à recuperação com menos perturbações. Se estiver errado, vai gastar uma montanha de dinheiro do contribuinte antes de, afinal, voltar-se para a solução de Krugman. Meu coração está com os críticos, ganhadores do Nobel. Mas minha cabeça espera que Geithner esteja fazendo a opção certa”.



É o enigma de Obama, segundo o veterano analista político (e não econômico) do Washington Post: ousadia embrulhada na cautela enraizada na relação ambivalente com o status quo. É por isso, acredita ele, que Obama vai desafiar, um depois do outro, não apenas os seus adversários entricheirados mas também seus aliados naturais.


 


Título do Vermelho