Fundadora do Ballet Nacional de Cuba fala sobre apresentação em BH

No próximo fim de semana, o Ballet Nacional de Cuba, que a bailarina e coreógrafa Alicia Alonso fundou em companhia do marido, Fernando Alonso, há seis décadas, traz a Belo Horizonte o clássico Giselle no Grande Teatro do Palácio das Artes.

A turnê pelo Brasil, que inclui outras capitais –Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Salvador, faz parte das comemorações pelos 60 anos de atividades da mais importante escola e grupo de balé da América Latina, consagrado também na Europa e na Ásia. A montagem, dirigida por Alicia, é premiada internacionalmente. “Escolhemos uma das nossas grandes obras para as comemorações. Queremos que o público brasileiro desfrute do romantismo deste balé, que tem uma história linda e é famoso pelo bem que faz às pessoas”, comenta a bailarina.


 


A bailarina e coreógrafa cubana Alicia Alonso experimentou seus primeiros passos ainda criança. Mal tinha consciência das possibilidades do corpo, já sabia que o movimento seria algo essencial em sua vida. Para ela, espetáculos de balé são “um arco-íris de beleza”, antídotos para uma realidade mundial que necessita cada vez mais da cultura e do belo como contraponto aos sentimentos de morte e destruição. Aos 88 anos, orgulhosa das inúmeras conquistas, ela admite que a dança sempre foi seu alimento –algo vital, de que não se dissocia. E como já não pode se dedicar aos personagens que tantas vezes protagonizou, pela idade avançada, ela compensa esta falta se oferecendo em tempo integral a seus alunos, bailarinos de uma escola rigorosa, prestigiada e símbolo de excelência no mundo.


 


A voz firme ao telefone, de seu escritório em Havana, não deixa dúvidas: Alicia Alonso é uma mulher enérgica. Obstinada, não se deixou desanimar nem mesmo quando a visão se tornou vacilante. Testemunhas da genialidade da mestra, companheiros de trabalho revelam que ela acompanha os passos da companhia com preciosismo. Eles são cerca de 130 bailarinos, dos quais 60 participam desta montagem de Giselle. Na tarefa de ensinar a cada um deles os critérios para se alcançar o alto nível técnico que desenvolveu ao longo de sua trajetória, Alicia Alonso afirma que o mais difícil é fazê-los entender que a dança não é uma distração, algo a que se dedica por mero desejo.


 


Durante as aulas nos turnos da manhã e da tarde, de segunda-feira a sábado, os bailarinos precisam aprender passos, ritmo, habilidades do corpo. Para ser um bailarino de excelência, ensina Alicia, é necessário ter qualidades físicas, biotipo balanceado, porte bonito, disposição para treinamento dos saltos, mas, sobretudo, estar preparado para superar limites aparentemente insuperáveis. “É preciso gostar muito, sentir-se apaixonado pela carreira e mostrar-se disposto a oferecer tudo que tem, e um pouco do que ainda vai adquirir. Isso é ser artista”, diz


 


Sua história na dança continua sendo uma busca constante por superação. Nascida em família que não conhecia o balé, na Havana dos anos de 1920, ela precisou deixar o país para se dedicar à dança nos Estados Unidos, depois de casada. Os pais ficaram sabendo do talento da filha quando ela começou a se destacar e tornou-se capa de revistas internacionais. “Eles ficaram orgulhos porque eu era uma menina muito séria. Não entrei na dança para passar o tempo. Dancei para ser estrela, porque sempre adorei o balé e continuo adorando”.


 


No Brasil
Há três anos, o Ballet Nacional de Cuba realizou turnê no Brasil, por um mês, com o espetáculo A magia da dança, em que reuniu temas tradicionais do século 19. Alguns destes números serão incluídos na nova temporada no país, mas nem todas as capitais serão contempladas. Em Belo Horizonte, a íntegra de Giselle será a única atração. Adaptação da obra de Jean Coralli e Jules Perrot, o balé é inspirado em lenda popular da Alemanha, com música de Adolphe Adam. Como parte de sua assinatura, a coreógrafa propõe ao clássico balé de amigos, no segundo ato. A alteração decorre de anos de pesquisas sobre a obra. “Cada balé passa de um coreógrafo a outro, ao longo dos anos, e cada um aborda o original com liberdade para acrescentar um pouco de sua interpretação do texto, de sua personalidade. Essa é uma maneira de se chegar ao máximo que um balé pode permitir”, explica a eterna primeira bailarina do Ballet Nacional de Cuba.


 


Veterana que criou a primeira escola de balé de seu país antes da revolução socialista, Alicia Alonso prefere a dança à política, como tema, embora seja imperativa ao afirmar que a escola cubana de balé é produto das transformações da ilha depois da derrota de Fulgêncio Batista. O Balé de Cuba foi criado inicialmente com recursos próprios e tinha muitas dificuldades para se desenvolver, até que o Estado assumiu a responsabilidade econômica das atividades. “Essa mudança permitiu a profissionalização da dança. Com a Revolução, não se perde nenhum talento em Cuba e todos fazem parte de uma carreira de prestígio, porque podem se dedicar em tempo integral”, analisa Alicia Alonso.


 


SERVIÇO:
Ballet Nacional de Cuba – Giselle
Grande Teatro do Palácio das Artes, Av. Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3236-7400. Sexta-feira, 21h, e sábado, 18h. R$ 120 (plateia 1), R$ 100 (plateia 2) e R$ 80 (plateia superior). Classificação livre.


 


Por Janaina Cunha Melo, no jornal Estado de Minas de 04/05/2009