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 Aumentam pressões por solução à crise em Honduras

A cada dia que passa, o governo golpista de Honduras passa a mostrar mais a sua cara e, como consequência, aumentam as pressões para que o presidente-ditador Roberto Micheletti negocie uma saída para a crise política e flexibilize as medidas linha-dura que adotou. Parte dessa pressão agora vem até de grupos empresariais – alguns que chegaram a apoiar o golpe. Ontem (01), ganharam força os sinais de que essa solução negociada pode estar por vir.  

Ela incluiria a volta do presidente deposto Manuel Zelaya ao poder – ainda que com poderes limitados – e o seu julgamento, nos tribunais, por supostos delitos que Micheletti o acusa de ter cometido.

O presidente da Associação Nacional das Indústrias, Adolfo Facussé, afirmou que Micheletti aceitou a proposta dos empresários, de deixar o cargo se Zelaya se submeter à Justiça. "Se o senhor Zelaya disser que aceita (a proposta feita na terça-feira), terminou o problema", declarou Facussé à agência France Presse após se reunir com Micheletti.

De acordo com a proposta, que Micheletti rejeitara na quarta-feira, Zelaya seria restituído à presidência com poderes limitados, como prevê o Acordo de San José, e teria de responder a 18 processos na Justiça.



Em encontro com seis deputados brasileiros na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa, Zelaya se disse disposto a ser processado e julgado pelos crimes dos quais é acusado, embora tenha frisado que é inocente e que jamais buscou alterar a Constituição hondurenha para tentar a reeleição. 

Zelaya advertiu que, se uma saída não for encontrada dentro de duas semanas, não haverá mais condições para realizar as eleições em novembro. "A solução dessa crise passa pela minha restauração, pelo respeito à democracia. Estou disposto a ir aos tribunais e a responder às acusações contra mim, não tenho nenhum problema com isso. Por isso voltei, porque sou inocente", disse o presidente deposto, em entrevista por telefone ao jornal uruguaio El Observador, de Montevidéu.

Zelaya disse aos deputados brasileiros que se encontram em Honduras que alimenta expectativas em relação à missão da Organização dos Estados Americanos (OEA), que virá na próxima semana a Honduras. O presidente deposto afirmou que até agora não manteve nenhuma negociação direta com o governo de fato. 


Em entrevistas que concedeu ontem, no entanto, Micheletti afirmou que mantém um canal de comunicação aberto com Zelaya por meio de um amigo em comum. Segundo Micheletti, esse amigo teria conversado com ele depois de ter visitado Zelaya na embaixada brasileira na semana passada. Entretanto, o presidente de facto rejeitou qualquer solução que envolva um governo de coalizão com o presidente deposto.

A queda do PIB e a reação dos empresários

Vários empresários têm demonstrado preocupação com recentes revogações de visto pela Embaixada dos EUA em Tegucigalpa. Com isso, não podem viajar ao principal parceiro comercial de Honduras e destino de boa parte dos investimentos da elite do país .

Micheletti passou a sofrer maior pressão de empresários e políticos do seu entorno para que negocie uma saída à crise quando cresceu a percepção de que as eleições gerais de novembro não serão reconhecidas internacionalmente caso a situação siga como está. O decreto de estado de sítio desagradou a todos, incluindo candidatos, em plena campanha eleitoral, e até a população pró-golpe.

Além da questão política, o setor produtivo de Honduras teme que a arrastada crise em Honduras afete mais a economia do país, já abalada pela recessão mundial. O FMI estimou ontem (01) que o PIB vai cair 2% em 2009, 0,5 ponto a mais do que o previsto em abril. "As duas crises se mesclam", afirmou Benjamin Bográn, ministro da Indústria e Comércio de Micheletti.

Segundo estudo da ONG Grupo da Sociedade Civil (GSC), o golpe causou até agora um prejuízo de US$ 800 milhões para o país devido à paralisação da ajuda internacional e financiamento externo para programas governamentais e obras, ao fechamento temporário de fronteiras e aeroportos e à queda no turismo e investimento -6% da riqueza do país.


O GSC é consultor do governo e da Cooperação Internacional no gerenciamento do fundo de combate à pobreza nacional. "A crise mundial é uma ameaça clara para aprofundar a pobreza, mas a crise política, social e econômica provocada pelo golpe é mais sistêmica, rápida e invasiva", diz a ONG. Quase 17% do Orçamento vem da cooperação internacional, aplicada principalmente na área social.

O golpe congelou, segundo Bográn, mais de US$ 150 milhões do FMI para reforço das reservas e outros US$ 50 milhões em crédito no BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e no Banco Centro-Americano de Integração Econômica (BCIE).


Durante reunião com organizações do empresariado hondurenho, ontem, Micheletti disse que o governo golpista "está disposto a dialogar". Ele voltou a prometer que derrogará o estado de sítio. "Começamos a conversar entre nós. Houve avanço", disse Benjamin Bográn.


Sem a Igreja, o Congresso, o Tribunal…

Já a Igreja Católica tem defendido o estabelecimento de uma mesa de diálogo para que se chegue a um novo acordo após o fracasso do plano defendido pelo mediador da crise, o costa-riquenho Óscar Arias.

Micheletti também foi acuado no Congresso, onde o Partido Nacional, a segunda maior bancada, retirou o apoio ao decreto de estado de sítio. Também os juízes do Superior Tribunal Eleitoral (TSE) de Honduras pediram ao presidente de fato que anule a medida que suspendeu cinco garantias constitucionais no país.

"Solicitamos ao presidente da República e a seu gabinete que o decreto executivo, emitido pelo Conselho de Ministros, seja anulado para que não haja qualquer dúvida, qualquer questionamento sobre a legitimidade das eleições", declarou o magistrado do TSE David Matamoros, após se reunir com Micheletti.

Em sinal de que se sente pressionado, Micheletti disse ontem à agência Efe que, se houver consenso no país de que deve deixar o cargo, fará isso. Após a reunião com a Corte Suprema de Justiça de Honduras, Micheletti afirmou a jornalistas que foi até lá "ouvir a opinião de outros setores" sobre o Estado de Sítio, mas que a decisão final cabe ao "governo de República e ao conselho de ministros".

Mesmo assim, o presidente interino assinalou que pode tomar a decisão de revogar o ato ainda hoje, quando se reunirá com os ministros para analisar a situação política. Ele sustenta que pretende restituir os direitos "o mais rápido possível". Ontem, pelo segundo dia consecutivo, o toque de recolher, imposto com frequência desde que Zelaya voltou ao país, não foi imposto.

Com agências

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