Sem categoria

Fim da paradinha: goleiros estão na maior torcida

O pênalti é um momento decisivo do futebol. “Coisa tão séria que deveria ser batido pelo presidente do clube”, na frase atribuída ao lendário Neném Prancha, “filósofo da bola” e roupeiro do Botafogo.

Em meio segundo — tempo médio que a bola leva para percorrer os 11 metros que a separam da linha do gol —, pode-se definir o resultado de uma disputa de 90 minutos.

Para o cobrador do pênalti, as chances de gol são, em teoria, de 50%.

Ou ele acerta, ou o goleiro pega.

A tensão sobre o jogador é enorme.

Tudo pode influir: o cansaço, o nervosismo, o vento, as irregularidades do campo, o modo como o pé bate na bola. Se chutar para fora, o jogador pode sair do campo sob vaia.

“No momento de cobrar o pênalti, as pernas tremem, o gol diminui e o goleiro cresce”, disse Pelé em 1989, já na sua fase de comentarista esportivo.

Na prática, mostram as estatísticas, o goleiro está em nítida desvantagem.

O gol é grande demais para ser inteiramente defendido.

O goleiro deve permanecer na linha do gol, entre as traves, olhando para o batedor até que a bola seja chutada.

Ele só tem tempo para uma manobra.

Se pular para um lado e o atacante chutar do outro, não tem como impedir o gol.

O resultado: quatro de cada cinco cobranças de pênalti terminam sacudindo as redes (veja os estudos e estatísticas sobre pênaltis nos quadros destas páginas).

Por causa das chances escassas dadas ao goleiro, a regra da penalidade máxima pode ser revista.

Na semana que vem, o International Board, o colegiado responsável pelas regras do futebol, se reúne em Zurique, na Suíça.

Na pauta está o destino da paradinha, tática de cobrança cuja invenção é creditada a Pelé.

Em termos gerais, trata-se do seguinte: o jogador corre para a bola, mas não a chuta de imediato.

Espera o goleiro jogar-se para um lado e, só então, mira no lado oposto.

A chance de defesa é zero.

Por isso, Joseph Blatter, presidente da Fifa, quer que esse recurso seja banido.

Na opinião dele, “a paradinha é irregular”.

“É uma forma de o jogador ludibriar o goleiro. Isso tem de ter punição”.

O cartola suíço propõe que a paradinha seja punida com o cartão amarelo e, no caso de reincidência, com o vermelho.

Se depender de Blatter, a nova regra começará a vigorar nas competições do ano que vem.

A rejeição à paradinha é quase unânime entre goleiros e juízes.

Atacantes costumam ficar em cima do muro, mas até entre eles há insatisfeitos.

“A bola está parada. É só ficar tranquilo que a possibilidade de errar um pênalti é mínima”, disse o atacante Djalma Feitosa Dias, o Djalminha, que só errou dois pênaltis em quinze anos de carreira no Brasil, na Espanha e em outros países.

“Se, além de todas as vantagens, o batedor usar a paradinha, aí já é covardia”, completa.

Pelé não pode ser responsabilizado pela farra atual.

Em seu tempo de jogador, ao ouvir o apito do juiz autorizando a cobrança, o rei corria com velocidade, mas desacelerava ao se aproximar da bola, para só então chutá-la.

Um curto-circuito de confusão atingia a mente do goleiro, fazendo que pulasse com atraso.

O que se está vendo atualmente nos campos de futebol de todo o mundo é uma versão em que o jogador para inteiramente.

Um exemplo do excesso foi dado pelo atacante Maicosuel num jogo entre Botafogo e Fluminense, em março.

O pé do então botafoguense passou por cima da bola, voltou e chutou.

“A meta do jogador não deve ser eliminar qualquer chance do adversário, e sim superá-lo, assim como fazia Pelé”, diz o físico Ronald Ranvaud, do Laboratório de Fisiologia do Comportamento da Universidade de São Paulo (USP).

O trabalho árduo, caso a proibição vingue, será encontrar uma fórmula efetiva para distinguir a paradinha leal da desleal.

Os goleiros estão na maior torcida.

Osvaldo Bertolino
De São Paulo