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Belluzzo: Taxação é boa, mas poderia ser mais radical

O governo decidiu taxar com uma alíquota de 2% o capital estrangeiro que entrar no País para aplicações em renda fixa e ações. O intuito é evitar uma valorização exagerada do real e a criação de uma bolha decorrente do excesso de liquidez internacional. Para o conselheiro informal do presidente Lula para assuntos econômicos, Luiz Gonzaga Belluzzo, a medida poderia até ser mais radical. Ele defende, há muito tempo, maior intervenção do Banco Central no câmbio.


– Na verdade, quem está contra a taxação quer cuidar dos próprios investimentos, dos interesses próprios. O governo tomou uma medida que, na minha opinião, deveria ser mais radical. Deveria ter alterado a forma de atuação do Banco Central no mercado de câmbio – avalia Belluzzo, ex-secretário do Ministério da Fazenda.

O ministro Guido Mantega anunciou a medida informando a tributação, a partir de terça-feira, 20, por meio de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). "A valorização descontrolada vai afetar negativamente as exportações, afetar a participação do Brasil no mercado de manufaturados e a rentabilidade dos produtores do agronegócio", comenta Belluzzo.

– Na verdade os investimentos produtivos são altamente prejudicados com a valorização. Só um demente pode acreditar que a valorização do real seja favorável – critica.

O diretor do departamento da América do Fundo Monetário Internacional (FMI), Nicolás Eyzaguirre, alertou, nessa segunda-feira, 19, que os controles de capital anunciados pelo Brasil são pouco efetivos, uma vez que não conseguirão frear a entrada de capital e poderão ser burlados pelos investidores. Para Belluzzo, "taxando, coloca-se alguma dificuldade". E acrescenta: "Esse chileno disse besteiras a respeito da economia internacional. Agora, não pode se meter".

– Se o real valoriza, gera emprego na Coreia e não aqui. Vai dar emprego pra chinês, coreano e pra hindu. Aqui não tem emprego, porque o sujeito vem, vende muito mais barato e as empresas nacionais vão fechar, afeta o setor industrial – alerta.

Belluzzo é um dos idealizadores do Plano Cruzado (1986), foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (1985-1987), é, hoje, membro do Conselho de Administração da Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) e conselheiro informal do presidente Lula.

Leia abaixo a íntegra da entrevista:

Terra Magazine – O senhor é a favor de taxar capital estrangeiro? Há um bom tempo o senhor é a favor de maior controle…

Luiz Gonzaga Belluzzo – Eu e mais um grupo de uns 20 economistas. Acredito que o Banco Central e o Ministério da Fazenda tinham que tomar alguma medida para conter a valorização do real. A valorização descontrolada vai afetar negativamente as exportações, afetar a participação do Brasil no mercado de manufaturados e a rentabilidade dos produtores do agronegócio. Na verdade os investimentos produtivos são altamente prejudicados com a valorização. Só um demente pode acreditar que a valorização do real seja favorável. Os europeus estão preocupadíssimos com a valorização do euro, por exemplo. Basta ler um economista competente como o Willen Buiter.

Por que ainda se defende a valorização do real, então?

Na verdade, quem está contra a taxação quer cuidar dos próprios investimentos, dos interesses próprios. O governo tomou uma medida que, na minha opinião, deveria ser mais radical. Deveria ter alterado a forma de atuação do Banco Central no mercado de câmbio. O BC deveria fechar o câmbio lá e parar com a palhaçada que é a valorização do câmbio. A taxação é uma forma ainda imperfeita, mas necessária. A valorização é boa pra quem? Pra quem está fazendo arbitragem. Para o resto do Brasil, não é boa. Aí o sujeito tem coragem de dizer que não tem especulação com câmbio. Óbvio que tem especulação com o câmbio, como tem especulação com qualquer ativo. A palavra especulação não tem qualquer sentido moral, ela é constitutiva dos mercados financeiros e não tem qualquer sentido moral. Então, não me venham com histórias e moralismos de quinta categoria.

O ministro Guido Mantega disse que isto preserva o emprego. Como se chega nessa equação?

Se o real valoriza, gera emprego na Coreia e não aqui. Vai dar emprego pra chinês, coreano e pra hindu. Aqui não tem emprego, porque o sujeito vem, vende muito mais barato e as empresas nacionais vão fechar, afeta o setor industrial. Daqui a pouco começa de novo essa história de usar derivativo cambial para se proteger e vai gerar aquela confusão que já deu. Esses sabichões do mercado deveriam parar de aconselhar as pessoas a fazerem coisas que não devem, como por exemplo, aplicar no fundo do Bernard Madoff.

A grande preocupação é com que essa medida afaste investidores?

Sim, aí fica uma bolha na bolsa e vai deixar continuar? Não aprenderam nada. Parecem Bourbons, lembram-se de tudo e não aprendem nada.

Podemos dizer que se esta medida existisse nos EUA há um ano a crise teria sido evitada?

Nos EUA, o caso é outro. Lá, tinham também o problema de valorização do dólar, do excesso de liquidez promovido pelo abastecimento da China, fruto dos desequilíbrios globais do balanço de pagamentos. Diante do crédito fácil, o sistema financeiro, para variar, resolveu ingressar na zona dos riscos "explosivos". São problemas maiores que não poderiam ser resolvidos com isto.

Alguns economistas defendem que essa taxação é reflexo da perda de arrecadação do governo depois da crise?

Não, não. Na verdade, se a taxação afetar o fluxo, certamente e a receita não será tão grande. É preciso observar como será a reação do mercado à taxação. A única coisa que sei é que os efeitos a curto e longo prazo da valorização cambial são muito ruins para a indústria e para os investimentos no setor industrial.

Outros economistas defendem que ano passado, o IOF, que vigorou para fluxos de renda fixa, não impediu o real de se valorizar. Porque agora funcionaria? Qual a diferença?

Eu teria feito uma coisa muito mais drástica, eu deixaria para fechar toda a operação no Banco Central e acabou. É como se o BC se transformasse num leiloeiro. Se não fizer isso, os investidores tentarão contornar. Mas a taxação já é alguma coisa, espero que faça efeito. Dizem que intervenção não funciona, mas na China funciona, porque eles operam por dentro do sistema bancário. No fundo, isto tem muito a ver com a interferência dos bancos na formulação na política econômica e na captura do BC.

O Chile adotou essa medida, desta mesma forma?

O Chile fez uma quarentena e tem um fundo fiscal. O Brasil terá que fazer isso, vai chegar lá, vai usar o fundo soberano quando precisar para o pré-sal. É inacreditável o que estas pessoas estão falando nos jornais contra a taxação. Deveriam se esconder, disseram e fizeram um monte de asneiras.

O diretor do departamento da América do Fundo Monetário Internacional (FMI), Nicolás Eyzaguirre, alertou nessa segunda-feira que os controles de capital anunciados pelo Brasil são pouco efetivos, uma vez que não conseguirão frear a entrada de capital e poderão ser burlados pelos investidores.

Pode, mas taxando, coloca-se alguma dificuldade. Esse chileno disse besteiras a respeito da economia internacional. Agora, não pode se meter. Os países que conseguiram estabilizar o câmbio e acumular reservas se deram bem. Os que não conseguiram se deram mal. O problema é que a valorização do real é absurda, muito alta em relação às outras moedas.

Fonte: Terra Magazine