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Rodrigo Vianna: Juca Kfouri virou garoto de recados de Serra?

Até onde eu sei, Juca Kfouri é um jornalista sério. Caso raro na imprensa esportiva, não cultiva amizade com dirigentes de clubes e confederações. Pelo contrário: há anos, ele é uma pedra no sapato de Ricardo Teixeira (CBF). Ele também foi um dos que denunciaram as falcatruas da turma que tomou conta do Corinthians alguns anos atrás. Publicou material exclusivo sobre as investigações

Por Rodrigo Vianna, no blog Escrevinhador

Digo tudo isso porque estranhei muito a nota que ele publicou em seu blog, sobre Aécio Neves, durante o feriado. Para quem andava fora do ar nos últimos dias: Juca disse que Aécio teria batido na namorada durante evento no Rio. Informação publicada às 12h09 de 01 de novembro – http://blogdojuca.blog.uol.com.br/arch2009-11-01_2009-11-07.html.

Essa foto pôs os tucanos paulistas em pé de guerra contra Aécio: a nota de Juca foi um recado ao mineiro?

Se Aécio bateu, o público merece saber. É inaceitável uma agressão física contra a mulher. Não há dúvidas… Vale dizer: o governador de Minas nega a agressão.

Estranho porque Juca abriu o texto no blog da seguinte forma: "Aécio Neves, o governador tucano de Minas Gerais, que luta para ter o jogo inaugural da Copa do Mundo de 2014, em Belo Horizonte, deu um empurrão e um tapa em sua acompanhante no domingo passado, numa festa da Calvin Klein, no Hotel Fasano, no Rio."

Juca é um jornalista bem informado. Por que qualificar Aécio como "governador que luta para ter jogo inaugural da Copa em BH"?

Ora, a maneira correta seria definir Aécio como "o governador que disputa com Serra a indicação do PSDB para concorrer à presidência".

Muito mais importante do que a abertura da Copa é a eleição, não acham?

Por que, então, Juca preferiu essa fórmula de dar a noticia?

Ora, dirão alguns, o blog dele é sobre esportes. Então, qual sentido de dar uma nota que não tem nada a ver com esportes? O que a vida particular de Aécio tem a ver com a abertura da Copa de 2014, quando Aécio nem mais será governador de Minas?

A nota, certamente, serve aos interesses de Serra. Não quero dizer com isso que Juca esteja a serviço da candidatura Serra. Longe de mim levar o leitor a esse tipo de conclusão. Mas é estranho.

A nota de Juca, do jeito que foi redigida, cumpre (involuntariamente?) um papel importante. Manda a Aécio o recado: "você tem telhado de vidro, se botar as manguinhas de fora, virá pancada pra valer".

Prestem atenção ao último parágrafo do texto de Juca: "A imprensa brasileira não pode repetir com nenhum candidato a candidato a presidência da República a cortina de silêncio que cercou Fernando Collor, embora seus hábitos fossem conhecidos."

Uai, a preocupação não era com a Copa? Não. Parece que não.

Se Juca tivesse lembrado a qualidade de Aécio (pré-candidato tucano, contra Serra), o recado talvez ficasse muito explícito – também para o público externo. Do jeito que foi publicada, a nota serve ao jogo interno tucano. E como!

Lembremos que, alguns dias antes de Juca dar a notícia, Joyce Pascowitch havia publicado a informação, mas sem citar nomes. Talvez, tenha faltado coragem à Joyce. Talvez ela temesse retaliações… Até porque, dizem, o Aécio é truculento com os jornalistas em Minas. Quem ousou desafiá-lo, teve a cabeça cortada.

A nota da Joyce está aqui – http://glamurama.uol.com.br/Materia_nelson-rodrigues-34269.aspx.

Aécio não deve estar muito satisfeito com Juca. Mas Juca talvez tenha gente forte a seu lado, para equilibrar o jogo.

Juca teria alguma proximidade pessoal com Serra? Não sei. Mas achei na internet uma entrevista da Soninha (ex-petista, hoje é do PPS, e secretária do Kassab; ela conhece bem o Serra, dizem por aí), que dá uma pista.

Em entrevista à revista "Brasileiros", Soninha conta como se aproximou de Serra. Diz que foi através de José Luis Portela (tucano, amigo de Serra, e amigo também de … Juca Kfouri) – http://www.revistabrasileiros.com.br/edicoes/25/textos/670/.

Vejam o que mais Soninha conta:

"Engraçado que a aproximação com o Portela não era nem por ser palmeirense, porque foi a mesma aproximação que eu tive com o Juca Kfouri, que é corintiano; foi por causa da militância no futebol. O Portela foi o artífice do estatuto do torcedor quando foi secretário executivo. Eu até naquela época achava muito engraçado e falava: "Ai meu Deus, agora eu estou cheia de amigo tucano". E aí, o Portela já conhecia o Serra do governo Montoro, de muitos anos atrás, aí, por causa do Palmeiras, a gente várias vezes se encontrou pra ver jogo juntos, na casa do Juca, sempre por causa de futebol e acabou fazendo amizade assim."

Pela fala de Soninha, não fica claro se era Portela (ou se era o próprio Serra) quem assistia aos jogos na casa do Juca Kfouri.

Não haveria nada de errado em um jornalista assistir jogos com Serra, ou com um amigo de Serra (Portela). Nada de errado nisso (só lamento um corinthiano, como Juca, assistir jogo ao lado de palmeirense; isso dá um azar danado!!).

Como não vejo nada de errado em um jornalista redigir uma nota que caia como uma luva na luta interna dos tucanos. Por coincidência, uma nota que atende aos interesses de Serra.

O que sei é o seguinte: Serra está em campo, tenham certeza.

Não é coincidência que a nota contra Aécio tenha saído no mesmo fim-de-semana em que FHC lançou o manifesto do Dia dos Mortos, contra Lula.

Serra e FHC jogam juntos.

Os colunistas do Partido da Imprensa (Dora Kramer, Miriam Leitão, Elio Gaspari) passaram semanas pedindo aos tucanos "mais ação" contra Lula. E os demos cobraram de Serra uma decisão.

Aécio também foi à luta: compareceu ao canteiro de obras do São Francisco ao lado de Lula, mandou avisar que em dezembro sai ao Senado, e numa entrevista a CartaCapital deixou claro que não aceita a vice de Serra.

Em público, Serra deu a resposta: "é preciso ter nervos de aço". Passou a imagem de um homem frio e calculista, que decide só na hora certa, sem aceitar pressão.

Nos bastidores, também agiu de forma fria e calculista. Através de FHC, lançou um petardo contra Lula (como a dizer: tucanos e anti-lulistas, uni-vos, a guera está próxima, e logo seu general estará à frente da tropa). É uma forma de dizer aos colunistas afoitos: calma, na hora H a pancadaria contra o governo virá.

E, para o Aécio, Serra deu outro recado: o jogo será pesado, não pense que terá brincadeira pela frente.

Há precedentes. Em 2006, Serra disputava com Alckmin a indicação do PSDB para enfrentar Lula. Por coincidência, a "Epoca" publicou uma matéria especial sobre a Opus Dei, em que uma das informações era: Alckmin participava de reuniões da Opus Dei.

No fim, Serra desistiu e o Alckmin da Opus Dei desapareceu do noticiário.

O curioso é Juca Kfouri não se interessar pela vida privada de FHC ou do próprio Serra (e de Soninha). A preocupação da imprensa brasileira com a vida privada dos candidatos é sempre seletiva.

Se for tucano, e de São Paulo, não vale mexer com a família (seria uma "grosseria"), mas valem umas estocadinhas de leve.

Se for nordestino, pode bater à vontade (desde que não seja amigo do doutor Roberto Marinho, como Collor era).

Se for mineiro, mesmo que seja tucano, pode bater – mas com jeitinho, pra não magoar demais.

Serra manda recados através da imprensa. Conta com bons amigos para isso.

Alguns nem palmeirenses são. Juca Kfouri teria se prestado a esse papel? Não creio. Mas foi uma baita coincidência.