Lançamento de livro e documentário sobre movimento estudantil

Nesta segunda-feira, 19h, na ALESC, ocorre o lançamento do livro "Abaixo as ditaduras – história do movimento estudantil catarinense de 1974 a 1981", de autoria de Lédio Rosa de Andrade e da estréia do documentário "Abaixo as ditaduras", com roteiro e direção de Ana Maria Lima

Assembléia na Reitoria da UFSC - Celso Martins

A idéia de escrever este capítulo da luta estudantil surgiu em 2005 quando o desembargador Lédio Rosa palestrava na comemoração dos 25 anos do Centro Acadêmico XI de Fevereiro (CAXIF), da Faculdade de Direito, e do Centro Acadêmico Livre de Economia (CALE) ambos da Universidade Federal de Santa Catarina. As entidades foram fundadas em período de grande efervescência política, quando se lutava pelo fim da ditadura e pela reconstrução da democracia. Lédio participou ativamente do movimento estudantil catarinense, de 77 a 81, inclusive na reconstrução da maioria das entidades acadêmicas que existem até hoje como o Caxif e a União Catarinense de Estudantes. Foi neste reencontro com o passado que o autor foi tomado pelo desejo de escrever sobre os acontecimentos daquele período e pensar sobre os desdobramentos que tiveram na construção da democracia atual.

Foram quatro anos de pesquisa em acervos particulares, acervo dos jornais O Estado, Jornal de Santa Catarina e Jornal Universitário, arquivo público e arquivo da UFSC. Além de entrevistas e conversas com pessoas que viveram de perto as principais manifestações do final da década de 70 nas universidades catarinenses.

O projeto artístico do livro foi desenvolvido pela jornalista Ana Maria Lima, e foi pensado de forma a inserir o leitor no contexto da época. O livro conta com cerca de 300 imagens e é possível ler as notícias através das reproduções feitas das páginas dos jornais da época.

Já em fase de finalização do livro, após novas conversas sobre os fatos históricos estudados, Lédio precisou alterar vários trechos para incluir ou modificar informações e revelar segredos, desconhecidos até então. Eram, principalmente, dados sobre a identidade e estratégias de militantes do PCB e do PCdoB, que, por segurança, até dos amigos próximos, foram escondidos.

A partir do desenvolvimento do livro, surgiu a idéia de produzir um documentário sobre o tema. Sob direção da jornalista Ana Maria, os trabalhos tiveram início no começo do corrente ano, com novas pesquisas e análise de outras fontes históricas.

Diante da grandeza histórica registrada no livro ABAIXO AS DITADURAS-História do Movimento Estudantil Catarinense, de autoria do desembargador Lédio Rosa de Andrade, a obra tende a ser um marco editorial e será destaque não só em Santa Catarina, como também no mercado livreiro nacional.

Documentário

A idéia da produção do documentário surgiu já na fase de finalização do livro. O que seria a produção de um simples audiovisual para o lançamento e acervo pessoal, acabou crescendo e se tornando um documentário de curta-metragem.

Com o trabalho da produção artística do livro já produzido pela jornalista Ana Maria, ficou mais fácil se situar neste universo das imagens fotográficas e reproduções de jornal. Foi mais árdua a pesquisa de imagens de vídeo, visto que Santa Catarina é muito carente de acervos videográficos da época. "Muita coisa foi destruída pelos militares e as TV's não tiveram muito cuidado em organizar seus acervos. O acervo de O Estado também não é satisfatório", diz Ana Maria.

Os depoimentos contemplam as diversas forças políticas que participaram ativamente da militância política da época. Foram escolhidas figuras do atual cenário político que tiveram suas carreiras iniciadas na militância estudantil.

A temática dos movimentos sociais na derrubada da ditadura, abordada no livro Abaixo as Ditaduras, teve como foco principal o Estado de Santa Catarina. No documentário, foi ampliado para a questão nacional, abordando temas como a guerrilha, clandestinidade, a reorganização da UNE e dos partidos e, as principais ideologias existentes na juventude.

Período de grandes convulsões sociais

Os anos de 1974 a 1982 foram marcantes para a política brasileira. O país saía de uma ditadura violenta, os generais sabiam que o sistema não se sustentaria e planejavam a abertura. Os estudantes, por sua vez, desempenharam um papel fundamental de contestação e denúncia, escancarando para a população que o país ía mal. Na universidade, apesar dos esforços da ditadura, já havia formas de questionamento e organização estudantil, não sob pouca repressão.

Muitos dos que entraram na universidade na década de setenta viveram o medo e a desconfiança característicos dos duros anos de ditadura e, ao fim do curso, viram o Brasil explodir em manifestações populares. Essa geração carrega a sensação do possível, pois viu seus anseios atingirem o cerne da política nacional e sua luta transformada em conquistas.

A morte do jornalista Vladmir Herzog foi o acontecimento nacional que pôs dúvida na maioria da população e foi crucial para que o povo ficasse vigilante.

O movimento estudantil passou a se reorganizar; participaram o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), os seguidores do Trabalhismo, as diversas correntes comunistas e de esquerda, provenientes das leituras marxistas e das revoluções comunistas em diversas partes do mundo.

Ainda neste período, a repressão atuava monitorando as atividades estudantis, ameaçando a juventude, prendendo estudantes sob alegação de subversão e, muitas vezes, torturando e matando. Estes atos de barbárie faziam os estudantes lutarem cada vez mais contra o sistema repressivo.

A reconstrução da UNE, das entidades estaduais de estudantes, dos DCE's e dos CA's foi um processo rico de compromisso com a coisa pública, levado à sério pelos estudantes, que se sentiam responsáveis pelo futuro da nação. Nas eleições, congressos e seminários havia sempre calorosos debates sobre os rumos da universidade e dos movimentos sociais. Jovens repletos de utopias, porém com muita obstinação e trabalho.

Ocorreu neste período também um importante debate no mosaico político do Brasil. O mundo saía da guerra fria – o comunismo teve presença marcante nos movimentos sociais e o militarismo norte-americano foi base da ditadura brasileira. No movimento estudantil havia várias correntes políticas, como os defensores do comunismo totalitário, os defensores de um socialismo mais democrático, os anarquistas, os trabalhistas, social-democratas, entre outras. Os comunistas, sem dúvida, foram os mais penalizados pela ditadura, daí a necessidade da clandestinidade.

Naquele momento estava posta a missão de derrotar a ditadura, inimigo comum de todos. Todavia, teve início uma acirrada disputa política pela direção do movimento estudantil, ao mesmo tempo em que a participação política dos estudantes se intensificava.

Os estudantes assumidamente de direita foram se escasseando, com o passar dos semestres na universidade. Ser de “direita” passou a ser pecha usada por algumas correntes políticas para prejudicar a imagem dos adversários.

Surge, no seio do movimento estudantil catarinense, um grupo chamado, inicialmente, Sapiens Clube de Cultura e, posteriormente, Luta Democrática, cujos participantes não eram comunistas, mas também combatiam a ditadura militar. Eram estudantes independentes, lutando por espaço de expressão política no movimento estudantil, para propagar valores de liberdade e de democracia, organizando debates de idéias, inclusive divergentes, alterando a prática política estabelecida, tudo com o objetivo de construir uma universidade e uma sociedade melhor.

Dentre os estudantes que combateram a ditadura militar, muitos seguiram carreira pública, outros partidárias, alguns se dedicaram às lides acadêmicas, mas, em verdade, a maioria deles continuou lutando pelos ideais semeados naquele tempo de utopias.

Resgatando a história, muitos dos líderes estudantis de outrora, hoje profissionais, foram contactados, entrevistados e relacionados nas pesquisas para o livro e para o documentário. Dentre eles, destacamos os relatos de Ciro Gomes, Aldo Rebelo, José Genoíno, Décio Lima, Rosângela Koerich e Ronaldo Benedet contando fatos marcantes deste período, refletindo sobre os erros e os acertos desta geração que ajudou a construir a democracia brasileira.