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Cesar Maia usa politiquice americana para explicar crise do DEM

Cesar Maia convocou Dick Morris para ajudar o DEM, presidido por seu filho Rodrigo, na crise aberta com o 'Mensalão do DEM'. O politicólogo americano que apunhalou os Clinton (Bil e especialmente Hillary) na década passada pouco irá ajudar o conservadorismo brasileiro a se safar das dificuldades atuais. Seu O Novo Príncipe, Machiavel atualizado para o século 21, de 1999, não chega às solas dos sapatos do velho, injustiçado, grande Príncipe de 1513. O velho Maquiavel será sempre grande porque tinha projeto histórico. A nova direita brasileira será cada vez mesquinha porque perdeu o seu.

Por Bernardo Joffily

O ex-prefeito do ex-PFL no Rio de Janeiro, também 'ex-blogueiro' (embora seu Ex-blog continue muito vivo, apenas ainda não entendeu como funciona a internet) maravilha-se com os lugares comuns de Morris, Destaca em especial "como tratar um escândalo" – escrito assim mesmo, no formato de manual de autoajuda para políticos americanos em apuros. O próprio Dick Morris tem experiência no ramo. Foi defenestrado do governo Clinton em 1996 depois de estrelar um escândalo à americana, quando um tablóide sensacionalista o flagrou com uma prostituta.

"Não há como ganhar na cobertura de um escândalo. A única maneira de sair vivo é falar a verdade, aguentar o tranco e avançar", sentencia Morris, citado por seu fã tupiniquim na coluna que Maia ganhou este ano na Folha de S.Paulo.

No último parágrafo, recado ao jovem Maia

A coluna nem menciona o nome de José Roberto Arruda, o governador do DF que respira por aparelhos desde que estouraram, no dia 27 último, as revelações da Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal. Não cita sequer o nome de seu partido, condenado segundo os analistas a despencar na eleição daqui a menos de dez meses, por praticar o oposto do que pregava no seu discurso.

Mas todo o texto da coluna do velho Maia, Novo príncipe, deve ser decifrado à luz do escândalo do 'Mensalão do DEM'. O parágrafo final é um recado direto ao jovem Maia:

"Na medida em que o governante nada tenha a ver diretamente com o fato, que os responsáveis sejam de fato afastados por traição de confiança. Caso contrário, o próprio governo será contaminado e terá perdido precocemente a batalha de opinião pública e, assim, a batalha política."

O foco é a luta interna no DEM, e no bloco DEM-PSDB-PPS, atingido em cheio pelos vídeos da Caixa de Pandora. Rodrigo Maia colocou-se aqui em posição de risco. Já antes do escândalo, andou elogiando Aécio neves e criticando José Serra. Quando a Caixa foi aberta, bancou a decisão de dar um prazo para Arruda se explicar. Diante da posição tucana, de virar as costas para o aliado e falar em tirar-lhe a vice na chapa oposicionista, ameaça com um rompimento (veja aqui a reveladora entrevista Magoado, presidente do DEM cogita romper com tucanos em 2010).

A política como grande combate

É notável a que ponto o conservadorismo brasileiro vai abandonando toda ambição de um projeto político programático, e agachando-se mais e mais na busca dos interesses mais imediatos e rasteiros dos setores que representa. Para isso, só mesmo recorrendo a Dick Morris, que em sua fugaz passagem pela Casa Branca notabilizou-se por "republicanizar" a política do Partido Democrata.

Quem deve estar se revolvendo no seu túmulo em Florença é Nicolau Maquiavel [1469-1527], autor do verdadeiro Príncipe. Este tinha programa, a unificação da Itália, só alcançada quase quatro séculos mais tarde. Este tinha espessura, estudada no século passado por seu conterrâneo marxista Antonio Gramsci [1891-1937]. Caluniado pela reação italiana e europeia, reduzido a uma caricatura 'maquiavélica' que não guarda a menor semelhança consigo, ousou trazer a política do reino de Deus para o dos homens, enxergando-a como o grande combate entre humanos que ela é.

Os maias, para não falar dos morris, apequenam a política. Fazem dela uma coisa suja e abastardada como o esquema ao que tudo indica montado por Arruda no Distrito Federal. Quando pensam, pensam pequeno: como abafar o último escândalo, como arquitetar o próximo.

A política não pode e não precisa ser isso. É o que os brasilienses em especial e os brasileiros vão aprendendo, estimulados pelo pensamento do velho Príncipe, mas sobretudo por sua própria, penosa, indignada mas instrutiva experiência. O quanto aprenderam, 2010 dirá.

Para que o internauta tire suas próprias concluões, transcrevo abaixo a coluna de Cesar Maia na Folha deste sábado (5).

Novo príncipe

El Nuevo Príncipe (editora El Ateneo), de Dick Morris (coordenador de Clinton em 2006), é leitura básica para entender a complexidade da comunicação política dos governos, muito maior que a do marketing eleitoral, pois ocorre dia a dia. E se insere num universo diversificado, de imprensa, comunicação direta, boatos, opinião pública segmentada, contracomunicação da oposição e dos insatisfeitos e da internet.

Morris fala disso em Governar, na parte 2 de seu livro. Nele, trata de temas como popularidade cotidiana, exercício da liderança, agressividade ou conciliação, inércia burocrática, cuidar das costas (controlar seu partido), cortejar a oposição, grupos de pressão, buscar recursos e continuar sendo virtuoso, o mito da manipulação da mídia e como sobreviver a um escândalo.

A este último ponto Morris dedica atenção. "Não há como ganhar na cobertura de um escândalo. A única maneira de sair vivo é falar a verdade, aguentar o tranco e avançar". Com vasta experiência junto à imprensa dos EUA, lembra que, quando ela abre um escândalo, tem munição guardada para os próximos dias. Os editores fatiam a matéria, pedaço a pedaço, para a cada dia ter uma nova revelação.

De nada adianta querer suturar o escândalo com uma negação reativa, pois virão outras logo depois, desmoralizando a defesa. E outros veículos entram com fatos novos, para desmentir. Para Morris, a chave é não mentir. O dano de mentir é mortal. "Uma mentira leva a outra, e o que era uma incomodidade passa a ser obstrução criminal à Justiça".

A força de um escândalo é a sua importância política. As pessoas perdoam muito mais aqueles fatos sem relação com o ato de governar.

E ir acompanhando a reação do público. "Se os eleitores se mostram verdadeiramente escandalizados com o que se diz que ele fez, é melhor que não tenha feito. Roubar dinheiro quase sempre não se perdoa".

Em outros tipos de escândalo, como os de comportamento, os eleitores se mostram mais suaves e compreensíveis. Os mais velhos são sempre menos tolerantes. Os de idade intermediária tendem a ser mais flexíveis, especialmente com escândalos de comportamento. Os eleitores jovens se fixam mais no caráter do governante. Assim, além da complexidade de enfrentar um escândalo, a comunicação de governo deve ser, pelo menos, etariamente segmentada.

Na medida em que o governante nada tenha a ver diretamente com o fato, que os responsáveis sejam de fato afastados por traição de confiança. Caso contrário, o próprio governo será contaminado e terá perdido precocemente a batalha de opinião pública e, assim, a batalha política.