José Cícero – Visão da Seca

Por José Cícero
In Minhas Metáforas Cotidianas (Inédito)

Seca

Cacimba vazia
Na caatinga seca.
Catemba de coco
jogada,
no lixo do monturo
com a boca pra cima
esperando chuvas
no canto da cerca.

Cacão de fogo…
Três potes com sede.
Galo campina,
catando cascalho
no riacho esturricado
e nas veredas,
que vão dá pro cemitério;
lotado de covas rasas.
Crianças inocentes,
sementes
plantadas
que nunca irão nascer.

Bicho esquisito.
Pássaro noturno
agourento,
arranchado na cumeeira
da velha casa,
abandonada.
Sombra fresca da aroeira.
e do joazeiro verde,
desafiando a mata branca.
Seca.
Mijo das vacas,
raras goteiras.

Rasga mortalha
na torre da igreja.
Zombando dos homens
e das mulheres
rezadeiras
de barriga cheia.
sementes
prestes a nascer
sonhos de águas.
represadas.
pela vida inteira.

Aridez dos rios.
Riachos medonhos.
Antigos lagos,
chão batido.
Cachorros magros,
assim como os homens.
Resmungos
e latidos.
Barro rachado.
Veios morridos.
Levadas dos brejos .
piabas dos rios
em que nossas lembranças
Ainda hoje,
como crianças
Sem medo.
Pulam 'bunda canastra'
e tomam banho.