Sem categoria

José Luiz Del Roio: razões para apoiar o Fórum da Bahia

Como fui uma das pessoas que, desde o fórum mundial de Belém do Pará, fez a proposta para que se realizasse um fórum mundial temático na Bahia, desejo aqui reafirmar alguns dos conceitos que justificaram tal empenho.

por José Luiz Del Roio (*)

1) O próximo Fórum Social Mundial unificado se realizará em Dakar, provavelmente em janeiro de 2011. O Senegal é um pequeno país, muito pobre mas com um grande povo. Sem dúvida, os movimentos sociais locais vão necessitar de muita colaboração externa.

2) Ao lado de Dakar situa-se a ilha de Gore, santuário da dor negra. Era um entreposto onde os prisioneiros africanos eram recolhidos para serem enviados ao Brasil como escravos. Sei perfeitamente que não era o único existente na continente africano, mas é aquele que se transformou em um trágico símbolo.

3) Daqueles milhões de mulheres e homens africanos que foram arrancados de suas terras e trazidos para a América, algo como 40% tiveram como destino o Brasil. E Salvador recebeu 12% de todos os africanos – repito – de todo o espaço americano. Um número fabuloso, uma infâmia impressionante. Junto com o sofrimento nesta cidade se misturaram culturas e desabrocharam lutas.

4) Com tais premissas, nada mais natural que Salvador fosse a sede de um Fórum Social Mundial temático que fizesse parte de um percurso que nos levaria até o Fórum de Dakar.

5) Esta grande reunião não se faz em concorrência com ninguém. É preciso deixar claro que o Conselho Internacional do FSM havia recomendado que o Fórum Mundial unificado acontecesse em anos ímpares para que, nos pares, acontecessem a maior quantidade possível de fóruns descentralizados. Desejamos sucessos a todos eles – principalmente ao de Detroit, nos Estados Unidos, em julho próximo. Isto porque seria um bem para toda a humanidade que os movimentos pacifistas e sócias daquele país se movessem mais.

6) Havia problemas para realizar o Fórum em Salvador? Claro que sim. Em todos os lugares existem problemas. Aqui, a iniciativa se chocava com dois obstáculos quase insuperáveis: a óbvia falta de experiência para um evento desta natureza, onde é preciso um longo percurso entre as forças sociais para encontrar convergências, apurar o método de organização, recolher recursos, buscar um justo relacionamento com estruturas governamentais etc.

7) Mas não havia tempo. A primeira reunião de representantes de governos, centrais sindicais, grupos grandes e pequenos que exprimiam a rica e complexa sociedade baiana aconteceu apenas há 120 dias. Enfrentar a tarefa de realizar um fórum de grandes dimensões em tão pouco tempo beirava a loucura. Mas um milagre está acontecendo…

8) Depois de 10 anos de fóruns que se realizaram em dezenas de países, parece claro que todos deram uma contribuição para ajudar a combater e enfraquecer o neoliberalismo. Entretanto, isso não basta mais. O mundo caminha, novos desafios são colocados. O fórum tem que ser mais efetivo, tem que criar plataformas de combate mais concentradas. Estou de acordo com o companheiro João Pedro Stédile, que diz que “o fórum não pode ser apenas um fórum anti-neoliberal, precisa ser anti-imperialista”. Direi também que o fórum precisa ser um espaço onde se discuta, de forma teórica e concreta, as possíveis transições ao socialismo.

9) O fórum é um encontro de pessoas, organizações e uma festa. Mas o foco central é como avançar na luta política. Os fóruns ajudaram a construção de governos progressistas e revolucionários na América Latina. Centenas de milhões de pessoas readquiriram as esperanças em todo planeta em função deste processo. Mas contra-ofensiva imperialista e das oligarquias locais estão em pleno desenvolvimento. É preciso saber que os resultados das eleições no Panamá, no Chile, do golpe de Honduras e da nova invasão estadunidense no Haiti são graves e colocam em perigo todo o processo.

10) Saber discutir estes perigos é imperativo. Saber achar formas de luta para evitá-los também. Logo, a unidade entre os movimentos sociais, partidos políticos de esquerda com os governos progressistas é uma necessidade. Cada setor, cada área, cada organização lutando no seu específico, debatendo idéias, fazendo política, construindo o futuro a cada dia. O Brasil é, pelo seu tamanho físico, população e economia, uma peça chave neste conflito. Isso nos impõe preservar o que já conquistamos e avançar mais; sermos solidários com os irmãos latino-americanos e africanos, ainda em parte esmagados pelo neo-colonialismo. Não podemos fracassar. A História não nos dá este direito.

Parabéns a todos que possibilitaram este Fórum de Salvador. Certamente, este é apenas o primeiro. Os próximos serão ainda melhores.

(*) Membro do Fórum Mundial das Alternativas