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Paulo Nogueira Batista Jr.: Europa em declínio

Há poucos dias, uma notícia chocou os europeus: Barack Obama não comparecerá à cúpula anual Estados Unidos-União Europeia, programada para maio, na Espanha.

Por Paulo Nogueira Batista Jr., no jornal O Globo

Parece que o presidente dos EUA não está disposto a atravessar o Atlântico para participar de cúpulas EUA-UE com pouca substância, como a que ocorreu em Praga no ano passado.

A decisão de Obama é um sintoma de algo mais amplo: o persistente declínio relativo da Europa. O brasileiro nem sempre percebe esse fenômeno e deposita, às vezes, esperanças provavelmente infundadas no papel que a Europa poderia desempenhar como contrapeso aos EUA em um mundo crescentemente multipolar. Os europeus têm bom “marketing” e fazem belos discursos progressistas.

Eu mesmo sofria dessas ilusões quando morava no Brasil. Estou agora há quase três anos no exterior, em contato quase diário com representantes europeus no FMI.

Participei, também, de muitos encontros do G20, nos quais a presença europeia é expressiva. Depois disso, a minha avaliação da Europa — ou, pelo menos, da sua atuação internacional — se modificou totalmente.

Com algumas exceções, que se devem em geral a qualidades individuais de alguns representantes europeus, a Europa atua de maneira medíocre e conservadora.

A maioria das ideias infelizes, no FMI e no G20, tem origem na Europa.

Os britânicos têm se destacado nesse particular. Posso dizer sem medo de errar: a Europa é hoje a principal força retrógrada nas instituições financeiras internacionais.

Os sinais do declínio relativo da Europa estão em toda parte. Por exemplo: embora os EUA (especificamente o mercado financeiro americano) tenham sido o epicentro da crise internacional de 20072009, a Europa parece ter sofrido um impacto maior. A recessão foi mais profunda na Europa do que nos EUA em 2009. Segundo dados preliminares, o PIB americano caiu 2,5%. O da área do euro diminuiu 3,9%. Alemanha, Itália e Reino Unido registraram quedas de quase 5%. Só a França teve desempenho ligeiramente melhor, com queda estimada em 2,3%.

A recuperação europeia também está sendo mais lenta. Para 2010, as projeções do FMI indicam que a área do euro deve crescer apenas 1% e o Reino Unido, 1,3% — menos do que os EUA (crescimento esperado de 2,7%) e até abaixo do Japão (1,7%).

Na periferia europeia, o quadro é ainda pior. Muitos países entraram ou estão prestes a entrar em colapso financeiro. Vários tiveram que recorrer ao FMI no passado recente.

Foi o caso da Ucrânia, da Sérvia e da Islândia, por exemplo. Mas também de membros da União Europeia: Hungria, Letônia e Romênia.

Nas últimas semanas — suprema humilhação — especula-se que, pela primeira vez, um país integrante da área do euro teria que recorrer ao FMI: a Grécia. As autoridades europeias, temendo a perda de prestígio, procuram evitar esse desfecho.

O pior é que a crise grega já contamina outros países do Sul da Europa, que também fazem parte da área do euro, notadamente Portugal e Espanha. Os mercados financeiros já se referem com desprezo aos “PIGS” (Portugal, Italy, Greece and Spain)…

A grande realidade é que a Europa é um continente envelhecido, que vive das glórias do passado e procura se agarrar a privilégios e posições que já não refletem o seu peso atual no mundo. É o que ocorre aqui no FMI, onde a super-representação europeia é simplesmente escandalosa.

Tudo isso me fez pensarem Charles de Gaulle que, em 1969, pouco antes de morrer, comentou, com tristeza: “Eu tentei fortalecer a França em face do fim de um mundo. Fracassei? Outros o saberão, mais tarde. Sem dúvida, o fim da Europa está diante de nós.”