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Cotas: entidades têm destaque do último dia de audiência no STF

Teve início na manhã desta sexta-feira (5/3), no Supremo Tribunal Federal (STF), o último dia da audiência pública sobre políticas de ação afirmativa para reserva de vagas no ensino superior. A audiência teve início na quarta-feira (3/3). Hoje os debates ocorrerão pela manhã e à tarde, na Sala de Sessões da Primeira Turma do STF. Entidades aproveitam agenda para debater também com o Legislativo.

- Nelson Jr./SCO/STF

As audiências fazem parte da preparação do STF para o julgamento de duas ações que tramitam neste tribunal. A primeira delas é fruto da iniciativa de um estudante do Rio Grande do Sul que se sentiu prejudicado pela política de cotas da universidade federal daquele estado, ao não ter sido aprovado no vestibular. A outra, foi movida por uma advogada do Partido Democratas (DEM), contra a utilização de critérios raciais para admissão de alunos na Universidade de Brasília.

O representante da organização não governamental (ONG) Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), Fábio Konder Comparato, que participou da mesa da audiência nesta sexta, lembrou que a Constituição de 1988 tentou criar no Brasil um Estado social que pretendia não apenas fazer leis, mas dar um novo rumo ao país por meio da promoção do bem para todos, e defendeu que “Mais de um século depois da abolição da escravatura no país, ainda estamos a discutir uma política que certamente não é suficiente para dar a negros e pardos uma posição de relativa igualdade com os demais brasileiros, mas nada se diz sobre a necessidade ética e jurídica de se dar aos descendentes de escravos uma mínima compensação”, concluiu.

Articulação entre cotas sociais e raciais

Foto: Nelson Jr./SCO/STF
Público diversificado na audiência pública que debateu cotas raciais em universidades públicas, no STF

O presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Augusto Chagas, também participante da audiência, defende que o STF considere constitucional os projetos de lei que tratam das políticas de cota, caso contrário “seria um retrocesso”. Ao mencionar a questão racial, o estudante lembra que a universidade brasileira hoje é majoritariamente branca, e não há promoção de acesso à juventude negra. Para a entidade, as cotas sociais fazem parte da política de inclusão de estudantes da rede pública nas Instituições de Ensino Superior (IES), e consta na Reforma Universitária da UNE (transformado em Projeto de Lei que já tramita no Congresso Nacional). O PL defende a reserva de 50% das vagas nas universidades públicas, por curso e por turno, para estudantes de escolas públicas. E ainda a adoção das cotas raciais de acordo com os dados das populações medidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dentro da reserva de 50% das vagas.

A vereadora e militante do movimento negro Olívia Santana (PCdoB/Salvador), participou do primeiro dia de audiência, e comemorou a realização da audiência: "Esta é apenas a quinta vez, em toda a sua história, que este tribunal abre o debate para a sociedade. Sempre que isto é feito, o tema em questão é de relevância estrutural", explica. Para Olívia, a questão das cotas nas universidades públicas "é fundamental para o país que queremos construir", conclui.
Os dois últimos especialistas a se apresentarem na audiência pública sobre o sistema de cotas raciais nas universidades defenderam suas teses para justificar a reserva de vagas por critério racial.

Foto: Nelson Jr./SCO/STF
O professor da UFMG Leonardo Avritzer participou do segundo dia de audiência

O professor de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Leonardo Avritzer, fez o seu discurso em prol da diversidade nas universidades. Segundo ele, o objetivo principal de uma instituição universitária é a produção de um saber diversificado. Para isso, "é necessário tomar a questão da raça como um dos critérios, ainda que não único, para a introdução da ação afirmativa na instituição universitária". Em sua opinião, a ação afirmativa é importante para além da universidade, para constituir um mercado de trabalho também diversificado, considerando ainda que pesquisas mostram diferenças gritantes de salários no Brasil entre negros e brancos.

Foto: Nelson Jr./SCO/STF
A advogada Roberta Fragoso, Arguente do DEM, defendeu cotas sociais no lugar das cotas raciais

Segundo o professor José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares e presidente da Sociedade Afro-Brasileira de Desenvolvimento Sócio Cultural (Afrobras), "onde houver desigualdade, é obrigação e dever moral ético e constitucional do estado agir de modo próprio, ainda que de forma extraordinária e excepcional, para a equalização das oportunidades". Ele afirmou que a situação dos negros brasileiros "é um caso evidente, profundo e angular de desigualdade estrutural". Destacou que foram mais de 300 anos de escravidão sem qualquer tipo de reparação. Por quase quatro séculos homens, mulheres e crianças negras foram sequestrados, subjugados e torturadas com a complacência das instituições daquela época.

Pressão também no Legislativo

Na quarta-feira (3/3), o presidente da Câmara, deputado Michel Temer, recebeu representantes de entidades do Movimento Negro em defesa da manutenção da política de cotas raciais para a admissão em instituições públicas de ensino superior.
Acompanhados do deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), integrantes da União de Negros pela Igualdade (Unegro) e do Movimento Afirme-se: Cotas Raciais argumentaram que a adoção de cotas para afrodescendentes não compromete a qualidade do ensino. Segundo dados trazidos pelos ativistas, das 20 melhores universidades públicas do País, 14 adotam algum mecanismo de inclusão racial.

Durante o encontro, Temer ressaltou que a Câmara tem votado mecanismos de inclusão racial, como o Estatuto da Igualdade Racial, aprovado recentemente pelos deputados e que agora está em análise pelo Senado Federal.

De São Paulo Luana Bonone,
com Portal Câmara, Site da Olívia Santana, Direito do Estado, Correio Braziliense, STF e Estudantenet