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Eron Bezerra: esquerda é capaz de criticar e também de realizar

De volta ao parlamento, de onde esteve licenciado desde fevereiro de 2007 para ocupar a Secretaria de Produção Rural do Amazonas, o deputado estadual Eron Bezerra (PCdoB-AM), fala, nesta entrevista, sobre a experiência no Poder Executivo, suas principais ações à frente da Sepror e comenta sobre política e eleições 2010. “Eu quero sair da Sepror deixando claro que tem uma esquerda que é capaz de falar, de criticar e também de realizar”, disse.

Eron Bezerra

Partido Vivo: O secretário sempre foi conhecido pela vasta experiência no Poder Legislativo. São cinco mandatos na Assembleia e, de certa forma, foi uma surpresa a sua atuação no Poder Executivo, uma área em que não tinha experiência. A que o senhor atribui isso?
Eron Bezerra: Sou engenheiro agrônomo, professor de climatologia da UFAM, portanto eu sou da área. Claro que não é isso que explica o desempenho que nós tivemos no setor. Nem sempre gente tecnicamente qualificada apresenta resultados satisfatórios. Debito o sucesso da nossa gestão a quatro fatores: em primeiro lugar, ao nosso compromisso ideológico com os trabalhadores. Todo recurso que fomos buscar – e nós captamos mais de R$ 100 milhões em convênios – foram canalizados para melhorar a vida do trabalhador. Em segundo lugar à nossa equipe, que reuniu a experiência ali existente com novos quadros igualmente comprometidos com essa filosofia. A terceira foi ter assegurado uma interlocução permanente com o movimento social. E, por fim, a completa autonomia de gestão que o governador Eduardo Braga nos assegurou à frente da Sepror. Nós a abrimos para que fosse uma casa, de fato, dos trabalhadores. Entendo que foi isso que garantiu o nosso sucesso à frente da secretaria. Contamos ainda com o importante apoio de emendas parlamentares de autoria dos deputados Vanessa (Grazziotin, PCdoB), (Francisco) Praciano (PT), Silas Câmara (PTB), do senador João Pedro (PT) e de vários parceiros federais, como os ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), do Desenvolvimento Agrário (MDA), da Pesca, das Cidades e Integração; a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), o Incra e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Faço questão de registrar isso e partilhar os eventuais méritos que obtivemos com todos aqueles que de alguma forma nos ajudaram nessa empreitada.

Partido Vivo: A esquerda no Brasil, de um modo geral, não tem muita experiência no Poder Executivo. Isso não lhe preocupou? Temeu fracassar no Executivo e comprometer sua atuação no poder legislativo?
EB: Evidente. Pra mim isso também era uma questão de honra, porque a esquerda no Brasil nem sempre teve um bom desempenho ou boa avaliação à frente do Executivo. Felizmente, o presidente Lula quebrou esse estereótipo. Então eu tinha a determinação de não permitir que isso acontecesse na Sepror porque se nós fracassássemos ou deixássemos de executar um projeto eficiente, contribuiríamos para aprofundar esse preconceito. A receptividade que nós tivemos dos trabalhadores, dos empresários, de todos os atores do setor, nos deu a tranquilidade de executar esse projeto em beneficio dos trabalhadores rurais e dos consumidores do nosso querido Amazonas.

Partido Vivo: Que dificuldades teve ao assumir a Sepror?
EB: A Sepror é complicada. Foi extinta em 1995, juntamente com todos os órgãos do setor
primário, e só foi recriada em 2003 pelo governador Eduardo Braga. O Amazonas ficou sem secretaria de 1995 a 2002, sem rumo para o setor. Se você disser isso em qualquer lugar do mundo, as pessoas pensam que é piada. E reconstruir uma casa por cima de seus escombros é muito mais difícil do que construí-la pela primeira vez. Eu sabia o tamanho da encrenca. Portanto, a minha dedicação e de toda a nossa equipe era no sentido de quebrar esse estereótipo e, ao mesmo tempo, procurar melhorar a vida do trabalhador. Eu quero sair da Sepror deixando claro que tem uma esquerda que é capaz de falar, de criticar e também de realizar.

Partido Vivo: O que o destaca na área de infraestrutura, em projetos conduzidos pela Sepror?
EB: Cuidamos da recuperação de algo como mil quilômetros de vicinais para escoar a produção, adquirimos ônibus, barcaças, rabetões, barcos de pequeno e médio porte com a mesma finalidade. Mecanizamos centenas de hectares de áreas, com o que nós reduzimos a área utilizada e também o impacto ambiental. Estamos construindo parques de exposição agropecuária em Boca do Acre, Barreirinha e Careiro Castanho. Iniciamos a construção de vários matadouros em diversos municípios. Além de fábricas de gelo voltadas para os nossos milhares de pescadores.

Partido Vivo: E qual é a finalidade das agroindústrias, tema de outro programa?
EB: O objetivo é verticalizar a produção, agregar valor ao produto, aumentar a renda do trabalhador e evitar o desperdício. Para nós, a melhoria de vida do trabalhador é uma fixação. Se isso não for entendido, não será possível compreender como fizemos tanta coisa com tão pouco recurso. A construção da primeira indústria de “bacalhau da Amazônia”, frigoríficos em
Tabatinga e Santo Antonio do Içá, indústria de beneficiamento de frutas, destilaria em Humaitá, fecularia em Manaquiri e Careiro Castanho, pólo moveleiro no alto Solimões, dentre outros empreendimentos, obedecem a essa lógica. Quando nós começamos a falar de “bacalhau da Amazônia” muita gente achava que era uma loucura, uma piada. A planta de Maraã já está sendo inaugurada e vai mudar a história desses municípios e de todo o Amazonas.

Partido Vivo: O programa de expansão da produção busca o que?
EB: A autossuficiência não só de alimentos como também em culturas como juta/malva e borracha, e a revitalização de culturas como a do guaraná. Já somos autossuficientes em vários produtos. E medidas concretas como a produção de sementes, distribuição de mudas clonadas de guaraná, construção de 14 estações de alevinagem, o lançamento da máquina descorticadora que vai tirar homens e mulheres de dentro d’água na produção de juta/malva, distribuição de milhares de kit sangria para aumentar a produção de borracha, a estruturação de barreiras sanitárias e elevado padrão de vacinação para obter o status de área livre de febre aftosa são algumas das medidas adotadas e desenvolvidas para alcançar esse objetivo. Além disso, lançamos também as hortas coletivas e caseiras com a construção de mais 110 casas de vegetação e atender 2 mil famílias com hortas caseiras. Sem mencionar a inauguração da usina de compostagem (adubo orgânico) com foco na Copa do Mundo, já que vamos atender uma clientela extremamente exigente e que obviamente quer material produzido organicamente.

Partido Vivo: E o programa sócio-cultural, de que se trata?
EB: Visa, essencialmente, elevar o padrão social, cultural e econômico dos mais de 270 mil trabalhadores que vivem no campo do amazonas. Sintetiza todos os demais programas. Mais de quatro mil casas estão sendo construídas para trabalhadores rurais. Tenho muito orgulho e carinho por esse projeto porque sei o que representa uma casa para uma família que não morava de forma digna. Editamos o primeiro livro e cd escrito e gravado exclusivamente por homens e mulheres do campo. A peça teatral O Extensionista está em pleno funcionamento. Criamos o Feirão da Sepror para que o trabalhador possa trazer seu produto e comercializar diretamente para o consumidor. Criamos o Peixe Popular para combater o desperdício e assegurar peixe barato para a nossa população, que paga R$ 1,00 por quilo do produto. O projeto Horta Coletiva, em parceria com a antiga escola Agrotécnica, está instalando mais de 100 casas de vegetação e atendendo algo como duas mil famílias que desejem ter a sua própria horta.

Partido Vivo: Nesses três anos, conseguiu realizar tudo a que se propôs?
EB: Não. O Estado não é perfeito. O Poder Executivo não é perfeito. Todos nós temos falhas, erros e limitações. Fizemos muitas coisas e outras não. A receptividade, o carinho e o apoio que nós tivemos de todas as categorias do setor revelam que o rumo geral está certo. O que nós temos que perceber e analisar é a tendência. Qual é a tendência? O governo tem compromisso maior ou menor com o trabalhador? O governo tem políticas públicas mais ajustadas ou não? É isso que deve orientar o nosso comportamento. O governo Lula, por exemplo, começou com muitas falhas, muitos erros e evoluiu, pois foi sinalizado de maneira clara o seu compromisso com o trabalhador, com a integridade da nação e soberania nacional. Acredito que o governo do Amazonas tem o mesmo perfil. Tem falhas e erros, mas vem revelando paulatinamente compromisso acentuado com o trabalhador. Hoje, o trabalhador discute com o governo. Não conheço nenhum movimento grevista no Amazonas reprimido com pancadaria. Todas as categorias de trabalhadores estão tendo Plano de Cargos e Salários, inclusive a nossa.

Partido Vivo: Falando de eleições, qual vai ser a posição do PCdoB no pleito desse ano? Qual sua opinião sobre o palanque único?
EB: Apoiamos causas e não pessoas. Apoiamos o governador Eduardo Braga nas eleições de 2006 por defender causas parecidas com as nossas. Compartilhamos da opinião sobre a relação com os movimentos sociais, política ambiental, porto de Manaus, Zona Franca, gasoduto, Prosamim, ponte sobre o Rio Negro, etc. Essas obras são estruturantes. Isso não elimina erros nem falhas. Eu não partilho da teoria de alguns gestores públicos que se colocam acima do bem e do mal. Acredito que essas ações devem ter continuidade e avançar. Apoiamos a tese do palanque único e entendemos que o candidato a governo deve ser aquele escolhido pelos partidos que integram a base do presidente Lula e do governador Eduardo Braga. Sem esquecer que assim como o presidente Lula coordenou a escolha de seu sucessor (Dilma Rousseff, no caso) é mais do que natural que o governador Eduardo Braga coordene a escolha de seu sucessor.

Partido Vivo: E o projeto específico do PCdoB?
EB: No âmbito nacional, temos um ato marcado dia 8 de abril para oficializar o apoio a ministra Dilma, apontada pelo presidente Lula, como sua sucessora. A conferência estadual e o Comitê Central do partido aprovaram como objetivo específico manter a aliança com o governo Braga, lançar a Vanessa como Senadora – hoje ela conta com o apoio do presidente Lula, da ministra Dilma, do governador Eduardo Braga e de grande parte do povo do Amazonas, que é quem decide tudo isso. Os mesmo fóruns indicaram o meu nome para disputar uma vaga de deputado federal e preparar uma chapa própria de deputados estaduais. Essas deliberações estão sendo rigorosamente sendo  encaminhados e nós esperamos o necessário apoio popular para viabilizá-las.

De Manaus,
Mariane Cruz