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Chovem críticas ao STF em seminário sobre tortura

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de rejeitar o pedido de revisão da Lei de Anistia de 1979 foi criticada pelos participantes do Seminário Nacional sobre a Tortura, nesta terça-feira (4), na Universidade de Brasília (UnB). A posição foi unânime entre os três palestrantes na abertura do evento: o ministro e a coordenadora-geral de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi e Maria Auxiliadora Arantes, respectivamente, e o reitor da UnB José Geraldo de Sousa Junior.

O reitor e os representantes da Secretaria de Direitos Humanos enfatizaram a necessidade de levar adiante as discussões sobre os meios de se garantir a apuração da verdade e a punição dos culpados das torturas ocorridas na ditadura militar.

“Há um risco muito grande de que esse seminário se transforme numa análise da decisão do STF, em função da decisão ter sido tomada agora, mas nosso desafio aqui é justamente o de programar as ações de combate a tortura no ano de 2010”, afirmou o ministro Vannuchi.

Ele acredita que a decisão do STF pode influenciar o Congresso Nacional a aprovar o projeto de criação da Comissão Nacional da Verdade para esclarecer as violações aos direitos humanos ocorridos durante o período da ditadura militar, de 1964 a 1985.

“A repercussão internacional do julgamento do Supremo foi tão negativa que um projeto como esse, que dificilmente passaria no Legislativo, pode agora ser aprovado pelos parlamentares”, afirmou o ministro. A proposta será encaminhada ao Legislativo na próxima semana.

Verdade, justiça e resistência

O reitor da UnB, José Geraldo de Sousa Junior, criticou a dificuldade do Brasil em debater os crimes ocorridos durante o período militar. “A rejeição do Supremo mostra o sentido limitado do alcance que se atribuiu ao enfrentamento de formas degradantes como a tortura”, afirmou. “Uma comissão da verdade requer mais que a verdade, requer justiça e ainda temos uma resistência muito grande a avançar nesse sentido”, completou.

Para Maria Auxiliadora a decisão estimula a prática da tortura na atualidade. “A decisão, que vejo com indignação, favorece aqueles que hoje praticam a tortura como forma de obtenção de informações, como em muitas delegacias, por exemplo”, comenta. “Se a luta contra a tortura não for colocada como de propriedade da sociedade, o Brasil não conseguirá um passo além. O julgamento do STF demonstra isso”, acredita.

A Lei de Anistia perdoa crimes cometidos durante o período da ditadura militar tanto por agentes do Estado como opositores ao regime. A ação no Supremo, de autoria da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), defendia que a Lei não beneficiasse os autores dos crimes, como homicídio, abuso de autoridade, lesões corporais e estupro entre outros. O pedido foi derrubado por 7 votos a 2. Votaram a favor da revisão os ministros Ricardo Lewandowski e Ayres Britto.

Saiba o que é tortura

O seminário, que prossegue nesta quarta-feira (5), teve ainda uma mesa-redonda sobre a visão histórica e social da tortura. À tarde, o jurista Fábio Konder Comparato, que fez a defesa da ação da OAB no Supremo, falou sobre a visão jurídica e política do assunto.

Em seguida, houve o lançamento da campanha de informação Tortura é Crime. O folder, que será distribuído pela Secretaria de Direitos Humanos e pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça – parceiros da campanha – explica o que é tortura. E lembra que nos períodos ditatoriais a tortura foi amplamente praticada pelo Estado (com o uso de pau-de-arara, choques elétricos, afogamentos, espancamentos, insultos e ameaças, dentre tantos outros) com a intenção de conseguir informações, de castigar, de humilhar e reprimir a resistência ao regime.

A tortura no Brasil também foi praticada contra as comunidades indígenas e os negros trazidos da África.

Desde 1991 a Convenção das Nações Unidas Contra a Tortura entrou em vigor no Brasil. Apesar do avanço mundial na condenação moral e jurídica, a prática de tortura continua vigente como um recurso de Estado e de governos para arrancar informações e confissões, confirmar testemunhos, punir e eliminar.

A campanha procura mostrar à sociedade que a política de combate à tortura somente será eficaz se contar com a participação de setores representativos da sociedade civil, com a parceria do sistema de justiça criminal. E, para isso, enfatiza que “a tortura é crime inafiançável, crime contra a humanidade e crime que não pode ficar impune. Cabe a cada um de nós acreditar que é possível construir um Brasil sem tortura, mais humano e solidário.”

De Brasília
Márcia Xavier
Com Agência UnB

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